À beira do Rio Tâmisa, em Oxford, o britânico Iain Chalmers
teve uma ideia que revolucionaria a Medicina Baseada em Evidências (BEM).
Inspirado em Archibald Cochrane, defensor do uso do método científico para
investigação da eficiência de tratamentos na saúde, Chalmers desenhou o projeto
do que hoje se configura como uma rede global de pesquisadores: a Cochrane
Collaboration.
De acordo com o professor Archibald, muitos dos
tratamentos utilizados pela medicina não tinham provas suficientes para
justificar seu uso e, por isso, a necessidade de um olhar mais aprofundado a
essas práticas. Utilizando o método de ensaios clínicos randomizados de estudos
médicos somados em metanálises, Chalmers escreveu a obra Effective
Care in Pregnancy and Childbirth (Assistência Eficaz na Gravidez e
no Parto, em tradução livre) e viu ali a oportunidade de expandir o
conhecimento a todas as áreas médicas. Criou, então, o primeiro centro
Cochrane, na Inglaterra.
Nesta época, Chalmers, Richard Peto e outros
colaboradores da Universidade de Oxford já faziam revisões sistemáticas e mega
ensaios clínicos junto ao professor Álvaro Atallah. Entusiasmado, este se
envolveu com a ideia. Hoje, o projeto que iniciou com pouquíssimas pessoas
conta com mais de 37 mil voluntários em 130 países. Sob o lema “Evidências
confiáveis, decisões bem informadas, melhor saúde”, a Cochrane busca reduzir as
incertezas, isto é, comparar tratamentos, aprimorar diagnósticos e contribuir
para a prevenção de doenças com base em pesquisas cientificamente consolidadas.
A Cochrane
A principal ferramenta da organização é a Cochrane
Library, a maior base de dados de ensaios clínicos publicados, sendo
fundamental para a organização de revisões sistemáticas. Cada revisão dura em
torno de dois a quatro anos e é composta por um grupo de seis profissionais,
sendo um deles, obrigatoriamente, um metodologista. Atualmente, a Cochrane
abrange 51 especialidades médicas.
“Nenhum de nós tem todas as respostas. Nosso
esforço é para mapear o conhecimento e analisar o quanto ele avançou para
solucionar cada questão de forma imparcial, eficiente e gratuita”, afirma dr.
Atallah, hoje diretor do Centro Cochrane do Brasil. “Nosso modo de conduzir as
revisões evita confusões e conflitos de interesses”, complementa.
Esta é, inclusive, uma das razões da existência da
Cochrane: buscar informações confiáveis, livres e independentes de ambições
comerciais.
No Brasil
Em 1996, o dr. Álvaro Atallah, professor titular e
chefe da disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências da
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), trouxe o Centro Cochrane para o
Brasil a pedido do dr. Chalmers, presente na inauguração. A unidade promove
workshops de revisão sistemática, metanálises em Medicina Baseada em
Evidências, avaliações de novas tecnologias em saúde e consultorias científicas
para estudiosos e gestores pós graduandos. São mais de 800 publicações
internacionais, além de funcionar como laboratório para pesquisa e ensino de
500 alunos de graduação e 200 de pós-graduação na UNIFESP, com 350 mestres e
doutores em MBE treinando centenas de residentes por ano.
“Temos ainda uma parceria com o Ministério da
Saúde, a fim de impulsionar a tomada de decisão em saúde no país. O governo
deixou de desperdiçar bilhões de reais por ano e os sistemas público e privado
ganharam eficiência e segurança. A maior beneficiária é a população”, destaca
dr. Atallah.
A Cochrane
e a pandemia
Com a crise mundial de saúde, os pesquisadores,
cuidadores, financiadores e gestores que integram a Cochrane correm para dar as
respostas mais assertivas e atualizadas à população. O isolamento funciona? O
uso de máscaras ajuda na prevenção? Quais medicamentos são realmente
eficientes? Essas são algumas das perguntas às quais os membros da organização
têm se dedicado nos últimos meses.
“Estamos fazendo revisões mais rápidas, tentando
colaborar com as demandas mais urgentes. À medida que são produzidas,
disponibilizamos um resumo voltado para a COVID-19 em nossas plataformas”,
afirma dr. Attalah. É uma corrida contra o tempo em busca das melhores
evidências para os pacientes.
Com ajuda da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Pan American Health Organization (PAHO)
e através dos esforços do dr. Atallah, a Cochrane Library tem acesso gratuito
no Brasil desde 2001.
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