A psicóloga Caroline Severo chama atenção para os
imperativos atuais de felicidade
Nesta semana começa uma das
maiores festas populares do Brasil, o Carnaval. A celebração é um momento que
mexe com o imaginário de muitas pessoas que vivenciam a sensação de liberdade,
na qual é permitida a desinibição das fantasias. Nesse sentido, a festa pode
ser um momento de muita alegria e de experimentar uma quebra com a realidade,
mas também pode trazer incômodos ou riscos mais sérios, quando a segurança
pessoal é colocada de lado em prol de momentos prazerosos.
A psicóloga da Holiste,
Caroline Severo, pontua que os imperativos atuais, ou seja, as cobranças
sociais e pessoais têm alterado o reconhecimento próprio da imagem e de como
cada indivíduo lida com sua realidade.
“Apesar de perseguirem os
imperativos de produtividade, sucesso e felicidade, muitas pessoas abdicam do
prazer em nome desses ideais. Como já diz o trecho da música de Vinicius de
Moraes, ‘a gente trabalha o ano inteiro por um momento de sonho, para fazer a
fantasia de rei, de pirata ou jardineira, pra tudo se acabar na quarta
feira’", comenta.
O Carnaval é um momento em
que as pessoas se permitem "desinibir" alguns desejos, quebrando e
desordenando papéis e valores. Nesse momento é possível dar espaço ao que está
recalcado, ou seja, aparece o que geralmente se oculta no dia a dia.
“Há uma mistura entre desejo
e realidade nessa época, que não passará pelos limites impostos pela sociedade.
Cada um se percebe como alguém que pode ser e gozar do que quer. Em Veneza, as
máscaras foram criadas, sendo estas o símbolo do Carnaval, com esta função,
como forma das pessoas poderem circular, poderem viver e gozar da vida sem que
se sintam invadidas”, ilustra Caroline.
A vivência desse momento
poderá ter repercussões positivas ou negativas na saúde mental dos indivíduos,
a depender da forma que ele lida com sua fantasia e também com a volta à
realidade, depois da festa acabada.
“As pessoas não serão
impactadas pelo Carnaval e sim por como esse momento repercute na sua história.
Amor, dor, fantasia, prazer e frustração são experiências que farão parte da
vida do sujeito e é fundamental vivenciá-las até para desenvolver formas de
lidar com o inevitável. O que se observa é que em alguns casos, pessoas podem
confundir esse momento de maior excitação com um transtorno de humor ou ao
contrário, a pessoa pode estar em uma crise de mania e não perceber por conta
da época. Vale ressaltar que o acompanhamento realizado de forma regular faz
com que os indivíduos possam se dar conta do seu processo”, completa.
Usos e abusos
Muitos problemas que surgem
nessa época se relacionam com excessos diversos e que podem levar risco ao
indivíduo. Muitas dessas consequências problemáticas ocorrem em função do uso
ou do abuso de substâncias psicoativas, legais ou ilegais.
“Muitas pessoas optam por
esse momento no qual se tem a sensação de libertação e de descompromisso em
fazer uso de substâncias pela primeira vez, sem conhecer os efeitos que elas
podem ter, ou fazer um uso abusivo de alguma droga, como o álcool. Considerando
que o Carnaval é uma festa de rua, com milhões de pessoas, com muitas pessoas
de fora, que não conhecem a cidade, isso tudo vai agregando riscos nessa
situação e esse indivíduo pode ter um problema de saúde e ficar sem socorro, ou
se perder, sofrer alguma violência, se expor em situações diversas e isso pode
ter um custo alto”, observa o psiquiatra da Holiste Luiz Guimarães.
Para o psicólogo Cláudio
Melo, a sociedade atual vivencia um imperativo da felicidade, no qual predomina
a ideia de um gozo quase permanente. Nesse sentido, no Carnaval as pessoas
podem colocar o corpo e a mente em situações limites ao se deixarem levar pela
ideia de que não se pode perder nenhum momento.
“O
corpo tem limites, a mente tem limites, o dinheiro tem limites. Quando chega
esse limite, a pessoa pode usar aditivos para conseguir se manter nessa
imposição e não perder um único momento, ou ultrapassarem esses limites e se
exporem a um adoecimento, ao endividamento e outros problemas. Quando a pessoa
não está dominada por esse imperativo da felicidade, ela vai aproveitar até o
momento em que o corpo e a mente estão confortáveis e terá um ótimo Carnaval”,
completa Cláudio.
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