Em minha longa e variada carreira, cheguei a entender
algo que muitos que não compartilharam o mesmo caminho podem não entender:
especialistas em hospitalidade e profissionais de segurança são algumas das
pessoas mais trabalhadoras que já conheci. Para ambos os grupos, as horas são
insanamente longas, muito estressantes e há pouco tempo de inatividade para se
recuperar mentalmente da rotina diária.
Nos níveis mais altos dos restaurantes e da segurança, a
demanda por perfeição é incrivelmente intensa. Nas cozinhas profissionais, não
é incomum ver álcool ou drogas usadas como um bálsamo contra o estresse. Parece
que esse é também o caso dos Chief Information Security Officers (CISOs), como
um estudo citado mais adiante neste artigo demonstra – mas primeiro, por favor,
permita-me fazer algumas comparações entre os dois campos.
Em meados dos anos 90, eu trabalhava em uma pequena
vinícola no Vale de Santa Ynez, a cerca de uma hora ao norte de Santa Bárbara,
na Califórnia. Um dos nossos hóspedes e eu começamos a falar uma tarde e ele me
disse que estava se preparando para abrir um restaurante em Springfield,
Missouri. Depois de várias conversas, ele pediu que eu me mudasse para
Springfield para administrar aquele restaurante.
Dois meses depois, tive a minha primeira experiência no
negócio de restaurantes. Meu dia típico começava às 9 da manhã, quando eu abria
o restaurante e começava a examinar o estoque e as encomendas para os próximos
dias. Uma vez que a corrida do almoço começava, por volta das 11 horas,
seguíamos num ritmo alucinante até as 15 horas. Em seguida, duas horinhas para
respirar até o rush do jantar. Depois disso, o aperitivo e a multidão do happy
hour até cerca de 23 horas.
Depois que fechávamos as portas, à meia-noite,
colocávamos tudo de volta e contávamos o dinheiro para o depósito no banco do
dia seguinte, normalmente era 1 da manhã. Pelo menos uma vez por semana no meu
caminho de volta para o meu apartamento, eu parava no mercado e pegava uma
garrafa de vodca, pensando que seria a única maneira de conseguir dormir a
tempo de acordar e voltar para o restaurante dentro de 8 horas.
Algumas noites, metade da garrafa desapareceria antes que
a sensação elétrica de estresse no meu pescoço e nos ombros diminuísse o
suficiente para que eu conseguisse fechar os olhos e descansar um pouco. Eu
posso dizer a você, por experiência própria, que, quando seu dia se desdobra no
ritmo de um restaurante movimentado, às vezes parece que o álcool é a única
maneira de sentir que – parafraseando o grande Charles Bukowski – o mundo não
tem você pela garganta.
Semelhanças entre chefs e CISOs
Deixei o emprego depois de uns seis meses e voltei para a
Califórnia, onde comecei minha carreira em vendas. Mas a indústria de
restaurantes me chamou de volta e, em 2003, me formei no Le Cordon Bleu em
Pasadena, Califórnia. Pelos 10 anos seguintes, trabalhei dentro e em torno da
indústria culinária e, durante esse período, percebi que minha experiência
naquele restaurante em Springfield era, infelizmente, muito típica.
Na indústria da gastronomia, a taxa relatada de uso de álcool e drogas é de cerca de 12%. A duração média no setor de hospitalidade é de 21 meses. Conheço um chef que sofreu um derrame em tenra idade e conheço dois que tiraram a própria vida.
Na indústria da gastronomia, a taxa relatada de uso de álcool e drogas é de cerca de 12%. A duração média no setor de hospitalidade é de 21 meses. Conheço um chef que sofreu um derrame em tenra idade e conheço dois que tiraram a própria vida.
De acordo com um estudo
recente da Nominet.uk (em inglês), o número de CISOs abusando de drogas ou
álcool para gerenciar o estresse é de quase 17%, e seu tempo médio de
permanência em uma empresa é de aproximadamente 22 meses.
As semelhanças entre chefs e CISOs me impressionaram e,
quando comecei a considerar as duas carreiras, comecei a ver ainda mais
semelhanças. Por exemplo, como cozinheiro em um restaurante sofisticado (meu
último emprego em gastronomia foi em um restaurante 5 estrelas – agora com
estrela Michelin – na Costa Oeste), aqui está como você passa o dia:
Chef de cozinha
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CISO
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Certificar-se de que suas ferramentas estão afiadas e
são as melhores que você pode pagar.
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Construir e manter sua pilha de segurança.
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Fazer mise en place (preparação diária de alimentos).
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Garantir que a equipe seja treinada e capaz.
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Gerenciar tickets (pedidos de comida).
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Gerenciar alertas de segurança.
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Manter sua estação (e cozinha) limpa.
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Fazer remediação.
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Manter todos os cozinheiros na mesma página.
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Gerenciar a dinâmica dos times.
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Atualizar-se sobre as tendências alimentares/ novas
restrições alimentares (pergunte-me como alimentar veganos em uma
churrascaria!).
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Estar à frente de novas ameaças/novas dinâmicas de
segurança.
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Preparar alimentos a longo prazo (caldos etc.).
|
Fazer projetos relacionados à segurança e outros
trabalhos relativos à TI.
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Agora, acrescente um casamento, uma festa de
aposentadoria, um convidado problemático e muitas outras variantes à mistura,
mantendo o mesmo nível de serviço (para um CISO, isso incluiria projetos não
relacionados à segurança). E, apenas por diversão, jogue um congelador
quebrado, um encanamento estourado, uma falha elétrica ou algum outro problema
mecânico que venha completamente do nada – é “MALWARE” que chama?
À medida que as demandas e horas se acumulam, o estresse também aumenta. À proporção que o estresse aumenta, aumenta também a tendência de querer recorrer a soluções rápidas para ajudar a controlar esse estresse. Olá, garrafa de vodca. Olá, pílulas, bebidas energéticas com cafeína ou outras substâncias.
Eu imagino que muitos chefs adorariam ter uma ferramenta
que lhes permitisse identificar problemas antes que eles acontecessem, e
automaticamente consertar o problema antes que causasse confusão na cozinha.
Mas, como os profissionais de segurança, alguns chefs simplesmente adoram fazer
as coisas da maneira que sempre fizeram, como quando eu fiz um molho hollandaise
de 30 ovos com um batedor em vez de usar um mixer – valeu, chef!
Hora de mudar
É claro que precisamos fazer uma mudança no setor de
segurança cibernética. Algumas coisas são simples, como adotar novas
tecnologias que substituam as horas de trabalho por horas de máquina. Ou usar
tecnologias que minimizem as coisas que dão trabalho e nos distraem de nossas
ocupações reais (leia-se alertas). Ou abraçar a automação e a inteligência
artificial (IA) para gerenciar muitas das tarefas diárias nas quais nós
gastamos tantas horas de trabalho. E, é claro, usar ferramentas que possam
prever problemas e preveni-los antes que aconteçam, em vez de apenas nos
alertarem depois.
Certamente, algumas coisas são mais difíceis que outras.
Um estudo
da Nominet revela que muitos membros da Diretoria ou equipes de
gerenciamento sênior ainda não entendem o "cyber", muito menos a "segurança",
e não a aceitam como uma função estratégica de negócios. A maioria dos CISOs
entrevistados no estudo acima indicaram que, embora sua Diretoria compreendesse
a aparente inevitabilidade das violações, eles ainda acreditavam que seriam
demitidos como resultado de uma delas.
E, claro, você tem a natureza predatória dos muitos
fornecedores de segurança cujo lema parece ser “por que usar uma ferramenta
realmente boa, quando uma dúzia de nossas ferramentas medíocres dão pro gasto?”
Em suma, tornou-se uma despesa
em profundidade.
Para fechar: se você está nos 17%, ou se você tem um
colega que está lutando contra o vício, por favor, siga meu conselho e procure
ajuda. Ninguém deveria ter de lutar contra esses demônios sozinho. Sinto falta
dos meus amigos da indústria de serviços alimentícios que deixaram este mundo
cedo demais e não quero ver a mesma coisa acontecer com meus novos amigos em
segurança cibernética.
Jason Green - gerente de desenvolvimento de pipeline para
as Américas e Ásia-Pacífico na BlackBerry Cylance. Ele passou os últimos 3 anos
construindo, refinando e treinando uma equipe de representantes de
desenvolvimento de negócios cuja função é desenvolver oportunidades de vendas
para a equipe comercial em campo. Antes disso, Jason passou uma década dentro e
fora das cozinhas, como cozinheiro, instrutor de culinária e representante de
vendas. Quando ele não está trabalhando, você pode encontrá-lo
lendo um livro, jogando, fazendo caminhadas na América do Sul e,
ocasionalmente, preparando uma refeição para a família.
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