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segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Dívida pública e privatização


"Em época de campanha eleitoral, há sempre dois temas recorrentes: a dívida pública e a privatização de empresas estatais. Para começo de conversa, é preciso esclarecer a confusão das palavras. Aqui no Brasil fala-se muito em “setor público”, expressão que dá a ideia de um setor que vive para fazer o bem ao público, e “setor privado”, que sugere um setor que vive de forma egoísta atrás do lucro. Decorre daí outra confusão: a expressão “empresa pública”, que no Brasil são as empresas estatais, e “empresa privada”, as que pertencem aos capitalistas privados.

A expressão “setor público” povoa a mente da população como uma máquina voltada ao bem social e à generosidade. A expressão “setor privado” é vista como um ente insensível à dor dos outros. São visões impróprias. O economista paulista Rafael Vechiatti sugere chamar o setor público de “setor coercitivo” (que só executa algo com dinheiro de imposto e de impor regras sobre como devemos viver) e o setor privado de “setor voluntário” (no qual quem entra tem que se submeter à competição e às imposições governamentais).

Quanto à “empresa pública”, nos Estados Unidos e outros países avançados não é empresa estatal, mas aquela construída com recursos do público, basicamente por poupanças dos próprios donos e por meio da venda de ações. Lá fora, o Itaú, o Bradesco, a Vale e demais empresas cujo capital vem de acionistas são consideradas empresas públicas. Já as empresas pertencentes a algum ente estatal (município, Estado, União) são empresas estatais. As empresas possuídas por um grupo de pessoas, ou uma família apenas, são empresas privadas.

Debate sem conhecimento é um exercício de ignorância especializada, que não serve para resolver problemas complexos.

Por aqui, sempre que entre em cena a discussão sobre desestatização, ou privatização, várias confusões se estabelecem. Debate sem conhecimento é um exercício de ignorância especializada, que não serve para resolver problemas complexos. É lamentável quando o desconhecimento vem de políticos que pretendem dirigir o país. Nas discussões sobre privatização de empresas estatais faltam aspectos conceituais. Alguns candidatos simplesmente são contra a privatização, em geral com argumentos equivocados.

Muitos afirmam que não faz sentido vender empresas estatais para pagar dívidas do governo. Não raro, são esses que mais gritam contra os juros da dívida. Convém lembrar que só há juros a pagar porque o governo contraiu empréstimos para cobrir seus déficits públicos. O argumento deve ser o oposto: não faz sentido vender empresas estatais e estourar o dinheiro em aumentos salariais e outras despesas de custeio da máquina administrativa e dos serviços públicos. Fazendo sentido vender ativos para cancelar passivos. Vender patrimônio para gastar em consumo é que não faz sentido algum.

Quando Lula assumiu o governo, a dívida consolidada do setor estatal era de R$ 600 bilhões. Hoje, findo o clico do PT (que inclui o governo Temer, porquanto, ele nada mais era que o vice de Dilma), a dívida pública chegará a R$ 4,8 trilhões, simplesmente foi multiplicada por oito. Aliás, os benefícios sociais desde a Constituição de 1988 ou resultaram de endividamento do governo ou de ventos favoráveis vindos do comércio internacional, a exemplo da explosão de preços, entre 2001 e 2010, dos produtos agrícolas, minério de ferro e outras commodities que o Brasil exporta. Acreditar que há um governante capaz de fazer milagres é de uma ingenuidade desumana. Tanto que a ex-presidente Dilma, do mesmo partido de Lula, gritava o tempo todo que a reversão dos ventos externos foi a responsável pelo mau desempenho de seu governo.

Mas, além da utilidade da privatização para reduzir a dívida pública, há constatação mundial da falência econômica e moral do Estado-empresário. Mesmo nos países que adotaram regimes socialistas constataram-se problemas de rigidez, ineficiência e desperdício dos sistemas dirigistas estatais, em parte pela dificuldade de aferir eficiência de empresas sem competição. No caso das estatais brasileiras, a avaliação da eficiência sempre foi dificultada pelos privilégios de mercado e de suas vantagens fiscais, e que são inacessíveis às empresas privadas.

Só para citar dois casos, a Petrobras, a despeito de alguma abertura, ainda desfruta de um monopólio que impossibilita a aferição de eficiência. O Banco do Brasil, ainda que apresente áreas de eficiência, sempre recebeu aportes do Tesouro Nacional e depósitos compulsórios de entidades públicas sem o esforço e os altos custos de captação. Todos esses aspectos não esgotam o problema, mas, sem a compreensão deles, a discussão fica empobrecida.







José Pio Martins - economista, é reitor da Universidade Positivo.


Reforma tributária e as propostas dos candidatos à Presidência: confronto de ideologias econômicas

Faltam poucos dias para decidirmos os rumos dos próximos quatro anos do país. O Brasil vai às urnas para escolher o novo Presidente da República, além de governadores, senadores e deputados. Entre os temas de maior destaque na pauta dos candidatos está a questão tributária. Um ambiente fiscal atrativo sempre foi alardeado como o grande fator determinante à tomada de decisão do empresariado em investir em um dado município, estado, região ou país, representando, portanto, instrumento eficaz de fomento do crescimento econômico.

A experiência brasileira com a chamada “guerra fiscal”, travada por estados e municípios via a concessão de benefícios fiscais muitas vezes à margem da Constituição Federal, é a prova empírica da fé empregada pelos governantes em um ambiente fiscal atraente como o principal indutor de investimento privado.
Eventos e fatos recentes desmistificaram em parte essa ideia.

Como exemplo, podemos citar a denúncia, pela Alemanha, do tratado para evitar a bitributação firmado com o Brasil e a posterior estabilização ou até o aumento do nível de investimento privado alemão em nosso país.

Ou a atração de investimento privado pelo Estado de São Paulo, líder entre os entes federativos brasileiros, a despeito deste jamais conceder qualquer benefício fiscal envolvendo ICMS à revelia dos protocolos e convênios firmados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária.

Ocorre que, ainda que um sistema tributário adotado por um município, estado, região ou país não seja o principal elemento considerado pelo agente privado para decidir por um investimento, este não deixa de ser um dos fatores determinantes à atração desse investimento.

Da mesma forma, mesmo que a solidez e a capacidade de geração de riqueza de uma economia possivelmente dependam em maior medida de outros fundamentos e fatores, um ambiente fiscal racional e eficaz ainda é um elemento indispensável para tanto.

O problema é que, comparativamente, o Brasil não desfruta de ambiente fiscal atrativo, seja pela excessiva complexidade de seu sistema, seja por sua asfixiante carga tributária.

Daí porque, em ano de eleições presidenciais, um dos temas de maior atenção dos eleitores é justamente a proposta dos candidatos para a área. Em 2018 temos uma campanha presidencial extremamente estratificada, com uma multiplicidade de candidatos e programas.

De modo a facilitar a análise dessas propostas e sem qualquer anseio de polarização, consideraremos, em linhas gerais, os traços comuns de cada programa conforme a segregação dos candidatos em função de sua orientação político-ideológica, destacando, com maior detalhe, as propostas dos líderes nas pesquisas de intenção de voto até o presente momento.

Nesse sentido, dentre os candidatos que se identificam como à “esquerda” do espectro político, temos como traços comuns propostas de reforma tributária centradas no aumento relativo de carga tributária sobre as pessoas e entidades de maior renda, estabilização da carga tributária total e alguma simplificação do sistema.

Destaca-se, nesse grupo, as propostas do candidato Fernando Haddad. Após a confirmação de Haddad como cabeça da chapa encabeçada pelo PT, houve considerável simplificação das propostas nessa seara, agora restritas à criação de um imposto sobre valor agregado (IVA), em substituição gradual aos tributos em âmbito federal, estadual e municipal tidos como “indiretos”; tributação na distribuição de lucros e dividendos; e rearranjo da tabela progressiva do imposto de renda das pessoas físicas, com alargamento da base de renda isenta e majoração de alíquotas para os mais ricos.

Em suma, a proposta petista, alinhada com os programas de outros candidatos em mesmo espectro político, calca-se na ideia do sistema tributário como instrumento de justiça social; na manutenção da atual carga tributária brasileira, elemento essencial ao financiamento da política de estado “onipresente” defendida pela legenda; na relativa (e potencialmente restrita) simplificação gradual do sistema com a criação do IVA; e na manutenção da atual centralização das receitas tributárias no governo federal.

Em contraposição, dentre os candidatos que se identificam como à “direita” do espectro político, temos como traços comuns, ainda que em diferentes matizes, propostas de reforma tributária centradas na simplificação do sistema tributário e na redução da carga tributária total.

Destaca-se, as propostas do candidato Jair Bolsonaro, quem defende a radical simplificação do sistema tributário brasileiro com a uniformização das alíquotas do imposto de renda das pessoas físicas e jurídicas em 20%, inclusive com tributação dos lucros e dividendos distribuídos pelas últimas em mesma alíquota, bem como a criação de um tributo, chamado de contribuição previdenciária, tendo como fato gerador a movimentação financeira dos contribuintes, o qual financiaria o regime previdenciário oficial, com extinção das atuais contribuições previdenciárias patronais incidentes sobre a folha de salários.

Em suma, a proposta do candidato do PSL, de cunho absolutamente liberal, de certa forma também replicada nas propostas de outros candidatos em mesmo espectro político, centra-se na ideia de estado mínimo, com redução de carga tributária; radical simplificação do sistema, potencialmente caminhando para um único tributo de cunho federal; regime previdenciário baseado em sistema de capitalização (por exemplo como ocorre no Chile), em substituição ao atual sistema de contribuição, e equalizado entre servidores públicos e trabalhadores privados; bem como na transferência de receitas tributárias do governo central para os estados, distrito federal e municípios.

Digno de nota, o programa do candidato Jair Bolsonaro, elaborado pelo economista Paulo Guedes, Phd pela Universidade de Chicago, berço do liberalismo econômico, é comparável à recente reforma tributária promovida pela administração de Donald Trump nos EUA: fundamentalmente baseada na ideia do “dynamic scoring”, ou aumento de arrecadação via diminuição de carga tributária, ideias que estão na vanguarda do direito tributário comparado, uma vez que alinhadas com a atual conjuntura econômica e geopolítica mundial.

Na comparação específica dos programas dos dois atuais líderes das pesquisas de intenção de voto para a presidência vemos, em projeção, a confrontação de ideologias econômicas. De um lado estado forte, defendido por Fernando Haddad; de outro estado mínimo, bandeira de Paulo Guedes encampada por Jair Bolsonaro.

A primeira há muito representa nossa realidade e é taxada de anacrônica justamente pela elite do pensamento liberal mundial. A segunda vem sendo a cartilha do mundo tido como livre e uma das pontas de lança da guerra comercial atualmente travada pelas maiores potências econômicas do planeta.






Morvan Meirelles Costa Junior - especialista em Direito Tributário, LLM em Direito Tributário Internacional e sócio do escritório Meirelles Milaré Advogados



Falta de equidade de gênero no mercado de trabalho: por onde podemos começar a resolver essa questão?

Tenho visto que a discussão sobre equidade de gênero tem de fato ocupado espaço entre várias camadas da sociedade. Cada vez mais estudos, pesquisas e dados nos são fornecidos em um esforço de nos fazer compreender a questão com mais sabedoria e informação. Entender o que esta por trás do tema “gap de gênero” nos levará à discussões mais produtivas e de fato transformadoras sobre o assunto. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) apresentou em seu relatório mais recente um retrato da desigualdade no mercado de trabalho em 2018, mostrando que a distinção enfrentada pelas mulheres começa dentro de casa, na diferença entre cuidado e responsabilidade no lar, refletindo na vida profissional. Segundo o relatório, 48,5% das mulheres  participam do mercado de trabalho global. Entre os homens, 75% participam. O aumento do número de mulheres no mercado trabalho teria um impacto bastante positivo na economia mundial. 

Mas como transformar esses números para que possamos contar com mais mulheres em cargos de liderança, em melhores condições de trabalho e sem sofrer preconceito?

A educação é um ótimo primeiro passo para esse caminho, e não estamos falando de educação escolar somente, mas sim do que ensinamos para as crianças dentro de casa. Ainda criamos nossos filhos com diferenças sutis: brinquedos de meninos e meninas, cores de meninos e meninas, brincadeiras de meninos e meninas. A filha mulher deve ajudar nos afazeres domésticos desde cedo, já filhos homens muitas vezes são tratados como privilegiados e tem suas tarefas feitas pelas mães. Nada disso é feito partindo de uma conspiração para submeter as mulheres a um lugar desprivilegiado na sociedade. São questões culturais que devemos dedicar um pouco mais de atenção. É preciso mudar, evoluir para que a sociedade seja mais justa e as capacidades e habilidades sejam o norte para tomada de decisão.

Dentro de algumas organizações, já vemos praticas que visam estimular a presença e crescimento profissional de mulheres, mostrando uma tendência mais justa e reconhecendo o valor da diversidade no mercado de trabalho. Algumas organizações oferecem mentores e uma figura conhecida como “sponsor” – alguém que vai falar sobre uma mulher e patrocina-la quando uma oportunidade importante aparecer. Eventos de “networking” são mais comuns, estimulando a mulher a desenvolver essa prática que tanto auxilia no seu crescimento dentro das organizações. Várias dessas ações visam ampliar a liderança feminina nas organizações. 

Outra discussão de fundamental importância e que pode colaborar para que as mulheres possam exercer suas carreiras de forma mais integral é a discussão sobre a chegada da maternidade e a licença concedida às mulheres e aos homens. Inúmeras delas abandonam suas carreiras ou as interrompe quando os filhos chegam. Países como a Suécia estão adotando iniciativas para aumentar a participação dos homens na tarefa de cuidar do bebê, incentivando uma licença compartilhada ao invés do padrão atual de licença maternidade longa e licença paternidade curta. Isso é benéfico para a construção do afeto entre o pai e seus filhos e coloca o homem e a mulher com responsabilidades e direitos iguais na hora de se ausentar em seus empregos. 

Ainda há muito o que fazer. No entanto a discussão sobre o tema e alguns programas corporativos ajudam nessa caminhada. A pergunta que fica é sobre o ritmo dessa transformação em nossa sociedade. Quanto tempo queremos esperar para alcançar a equidade de gênero e o que mais devemos fazer para estimular essa mudança? 







Cristina Monteiro - se formou em Ciências Contábeis no Rio de Janeiro. Na década de 1990 se mudou para São Paulo, cidade onde se sentiu acolhida e que foi responsável por formar sua bem-sucedida carreira. Começou a vida profissional como recepcionista de um estaleiro, teve passagem por empresas de auditoria e em seguida ingressou no mercado financeiro no JP Morgan, maior banco de investimentos americano. Dentro do banco chegou a posição de diretora para América Latina e Canadá e hoje largou a carreira na vida privada para investir na vida pública, como candidata a Deputada Estadual pelo Partido Novo. 

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