No domingo (17 de agosto), circulou nos veículos de
comunicação a decisão da Justiça do Estado do Espírito Santo autorizando a
realização de aborto em menina de 10 anos de idade que engravidou após ter sido
estuprada pelo próprio tio, fatos que tiveram grande repercussão nacional.
A menina, que teve a gravidez de 3 meses detectada
após dar entrada em hospital com dores abdominais, relatou que vinha sendo
vítima de violência sexual há pelo menos 4 anos, e que não havia falado sobre o
assunto com os seus familiares porque sofria ameaças constantes do estuprador.
Trata-se de nítida hipótese de estupro de
vulnerável, previsto no artigo 217-A, do Código Penal, consistente na prática
de ato libidinoso ou relação sexual com menor de 14 anos.
A interrupção da gravidez foi autorizada pelo juiz
titular da Vara da Infância e da Juventude do município onde a criança reside,
o que repercutiu e desencadeou em uma série de protestos (a favor e contra o
procedimento) nas redes sociais.
Importante registrar que, em situações de gravidez
decorrente de estupro, ou não havendo outro meio de salvar a vida da gestante,
o Código Penal descriminaliza o aborto.
Apesar da permissão prevista em lei, o assunto
provoca discussões sobre a quem compete decidir pelo abortamento: à gestante,
ao médico, ou à Justiça? E ainda, se é possível que um médico venha a responder
criminalmente por realizar o procedimento nessas condições.
No que diz respeito à interrupção de gravidez
resultante de estupro, também chamado de aborto humanitário ou sentimental, a
realização do ato cirúrgico depende da vontade da gestante. Se tratando de
gestante menor de 18 anos, é necessária a autorização de um dos pais ou do
responsável legal.
No entanto, se a garota decide por dar continuidade
à gestação, contrariando a vontade da família, a vontade da gestante deve ser
respeitada. Por outro lado, se opta por interromper a gravidez e os
responsáveis se opõem, tal situação deverá ser resolvida pelo Judiciário.
A realização do aborto humanitário, portanto,
independe de decisão de profissional de saúde, nem é preciso apresentar boletim
de ocorrência, laudo do IML ou decisão judicial. A gestante assinará um termo
no hospital onde o procedimento será realizado, manifestando a sua opção pelo
aborto e se responsabilizando pelos fatos narrados à equipe médica.
O objetivo do serviço de saúde é garantir o
exercício do direito à saúde, de forma que não cabe ao profissional de saúde
duvidar da palavra da vítima, devendo ser recebida com presunção de veracidade.
Se, após o procedimento, descobrir-se que a
gestação não foi resultado de violência sexual, o Código Penal isenta o médico
de pena por considerar o erro plenamente justificado pelas circunstâncias
fáticas, de modo que somente a gestante responderá pelo crime de aborto.
De todo modo, a fim de se resguardar de qualquer responsabilização
penal, cumpre ao profissional de saúde assegurar a regularidade do procedimento
de interrupção de gravidez por violência sexual, garantindo, assim, o exercício
pleno dos direitos humanos das mulheres.
Guilherme
Gueiros e Luiz Guerra - são advogados e sócios da área Penal do Urbano Vitalino
Advogados.
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