O
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) retomou, no último dia 9 de junho, o
julgamento de duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral que pedem a
cassação da chapa que elegeu o presidente Jair Bolsonaro e o seu vice, Hamilton
Mourão, (AIJEs nº 0601369-44 e 0601401-49), o qual teve início em 26 de
novembro de 2019. Estas ações têm por objeto os ataques cibernéticos a um grupo
de Facebook denominado “Mulheres contra Bolsonaro”, o qual teria favorecido
Bolsonaro, uma vez que a postagem referia que elas estavam aderindo à campanha
do atual presidente.
Na citada
sessão de 26/11/2019, o Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) iniciou o
julgamento dessas duas ações contra os então candidatos, respectivamente, aos
cargos de presidente e de vice-presidente da República nas Eleições 2018. Uma
das ações também foi apresentada em desfavor do deputado federal Eduardo
Bolsonaro.
Em seu
voto, o relator reconheceu que era estreme de dúvidas de que a referida página
do grupo virtual do Facebook foi alvo de ataques cibernéticos, fato comprovado
pelas provas constantes dos autos e por informações prestadas pelo Facebook
Serviços Online do Brasil Ltda., que atestou a invasão e a alteração da página,
ocorrida nos dias 15 e 16 de setembro de 2018. Todavia, segundo o Ministro Og
Fernandes, mesmo que tenha sido provada a materialidade do ilícito, as investigações
não foram conclusivas quanto à sua verdadeira autoria. Além disso, acrescentou
o relator, a invasão ao perfil em rede social perpetrada por menos de 24 horas
não teve gravidade capaz de causar ofensa à normalidade e à legitimidade do
pleito, conquanto possa repercutir em outras áreas do Direito, como a civil e a
penal.
Para o
relator, a rigorosa sanção de cassação do registro ou do diploma tem amparo em
situações excepcionais e somente deve ser aplicada quando houver provas
robustas, fortes e contundentes de autoria e participação.Dessa forma, os
pontos controvertidos são dois: a) aferir a responsabilidade do ato à chapa
Bolsonaro-Mourão; b) se a invasão do perfil resultou em favorecimento da
mencionada chapa.
Retomado
o julgamento o Ministro Edson Fachin divergiu do relator acolhendo preliminar
de cerceamento de defesa e autorizar produção de prova pericial, para apurar se
houve envolvimento efetivo do presidente Jair Bolsonaro, uma vez que este
replicou a fraude em seu twitter, que tem milhões de seguidores. Para Fachin, a
negativa do relator compromete o exercício do devido processo legal e inibe a
realização de perícia técnica para buscar identificar os autores do feito. “O
direito da parte à produção probatória é inerente às garantias constitucionais
e processuais e não antecipa qualquer juízo sobre o mérito da eventual prova
que será produzida”, salientou o ministro.
A
divergência aberta por Edson Fachin foi acompanhada pelos ministros Tarcisio
Vieira de Carvalho Neto e Carlos Mario Velloso Filho, que também votaram pelo
retorno dos processos à fase de instrução (investigação), para que as referidas
provas sejam colhidas. Segundo os ministros, o procedimento é fundamental para
garantir o direito ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal.
Tarcisio Vieira de Carvalho Neto propôs que a investigação técnica seja
conduzida pela Polícia Federal.
O
ministro Luis Felipe Salomão acompanhou Og Fernandes, mas destacou que, apesar
de os autores terem direito à produção de provas, conhecer a autoria do ataque
cibernético seria irrelevante, porque "é notória no caso em exame a
ausência de gravidade, por falta de prejuízo à lisura e à gravidade do
pleito". O Ministro Salomão asseverou que: "Penso ser de extrema
relevância – antecipadamente rogando escusas pela reiteração – deixar
sublinhada, uma vez mais, a conduta que se aprecia: a invasão de perfil de
página de rede social, por lapso temporal de cerca de 24 horas, sem nenhum
elemento capaz de revelar seu efetivo alcance perante o eleitorado (tais como o
número de acessos no período ou a repercussão do ato nos meios de comunicação e
na internet)".
O
julgamento foi novamente suspenso com o pedido de vista do ministro Alexandre
de Moraes. Ainda falta votar o presidente da Corte, ministro Luís Roberto
Barroso. Dessa forma, o placar está em 3 a 2 para retomada das investigações,
porém agora realizadas pela Polícia Federal.
Mas a
final das contas, o que vem a ser a ação de investigação judicial eleitoral
(AIJE)? Pode resultar na cassação do mandato da chapa Bolsonaro-Mourão?
O artigo 22 da Lei Complementar 64/90, estabelece: “Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito”.
O artigo 22 da Lei Complementar 64/90, estabelece: “Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito”.
O inciso
VI do artigo 22 permite ao relator proceder a todas as diligências que
determinar, ex officio ou a requerimento das partes. Na hipótese foi pedido a
realização da prova pericial, mas o relator a indeferiu, sob o fundamento de
que seria desnecessária, uma vez que teria ficado apenas 24 horas no ar. No
entanto, sua Excelência deixou de anotar que o Presidente a replicou no twitter
para milhões de pessoas.
Cumpre
ressaltar que o inciso XVI prevê que “para a configuração do ato abusivo, não
será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas
apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam”. Há que se apurar se
a utilização de uma empresa com objetivo de hackear a página do facebook “das
mulheres contra Bolsonaro”, alterando-a para “mulher com Bolsonaro” e a
reprodução pelo Presidente para dezenas de milhões de seguidores, é ou não
grave? Essa resposta teremos se os Ministros Alexandre de Moraes e Roberto
Barroso aderirem a tese divergente e reabrirem as investigações. Assim começa o
calvário de Bolsonaro perante a Justiça Eleitoral brasileira!
Marcelo Aith - advogado
especialista em Direito Eleitoral e Direito Penal e professor da Escola
Paulista de Direito.
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