É
preciso combater as fake news, e isso não é novidade. São incalculáveis os
estragos que elas têm causado para a democracia e para a cidadania nos últimos
anos. Está mais que claro que a desinformação constante, a manipulação e os
volumosos recursos colocados na rede para pulverizar mentiras têm sido alguns
dos principais desafios para o cenário social. Mas como conter o
compartilhamento?
Em
meio a uma série de receitas prontas para se precaver contra as notícias falsas
na internet e nos aplicativos de mensagens, a pergunta está longe der ser
retórica e é mais que necessária. Analisar quem é o emissor, avaliar a forma
como o texto é escrito (se de forma séria ou não), se tem erros de digitação ou
de português e, ainda, conferir as datas de publicações são alguns dos passos
indicados por vários especialistas no assunto para tentar identificar as fake
news. Mas em todos esses casos, o sucesso é sempre resultante da intensidade de
um aspecto: o olhar atento de quem consome a informação.
Oras,
há décadas que dicas de segurança percorrem e-mails, sites e milhares de
materiais de alertas impressos de bancos e de instituições de segurança digital
sobre como não cair em armadilhas de ladrões e estelionatários. Sempre confira
quem envia as mensagens, analise o texto para verificar se há erros de
formatação ou de língua, e por aí vai. As regras de precaução são quase as
mesmas, mas no fim o efeito prático é pouco resultante. Veja, não significa que
não são válidas, mas a cultura de avaliação de risco e análise de segurança na
rede não está instalada de fato em nossa formação de base.
Isso
mesmo. É na formação educacional que podemos encontrar uma série de etapas que
colaboram para desembocar na cultura do aprendizado digital e da linguagem que
fortalecem as formas de encontrar informação de qualidade em meio a um mar de
dados. Ou seja, muito mais que culpar a tecnologia, é a forma de uso que
devemos responsabilizar. Dar subsídios para que as pessoas possam se orientar
na rede e conseguir sua autonomia na navegação é o que se propõe com uma
educação digital.
Um
primeiro ponto a se consolidar é o conhecimento dos aparatos tecnológicos. Aqui
escolas particulares e boa parte das escolas da rede pública municipal e
estadual — ao menos se colocarmos em evidências as capitais — cumprem os
requisitos, mesmo que superficialmente. A formação tecnológica é o alicerce
desse processo e introduz os estudantes a um universo sob orientação da própria
escola. Dá um significado didático formativo ao aparelho.
Um
segundo passo seria a linguagem de navegação. E aqui podemos tanto imaginar a
linguagem das pessoas que navegam, a forma do texto, da arquitetura da
informação, quanto a linguagem da máquina. Ultrapassar o design da página e ler
os códigos que sustentam cada base de dados e que liga os mares de informações
são os itens que restam para o futuro. A linguagem de programação logo será
básica e introdutória para conhecer a rede e os computadores. Conhecer a
linguagem é obter as ferramentas para entender o desvio de padrão e as
armadilhas contidas no código.
Uma
terceira etapa é a criação e o fortalecimento de dispositivos legais de
repressão, de responsabilização e de criminalização. Enquadrar e tipificar de
forma clara a criação e o compartilhamento de fake news fornece ferramentas
para os próximos passos, que são a fiscalização e a repressão ao boato e às
notícias falsas. Considerando o impacto negativo que elas podem ter para o
regime democrático e para a segurança de dados dos cidadãos, um rol de
penalidade e uma fiscalização efetiva são necessárias.
Por
fim, é de se esperar que a última etapa seja a da cultura da criminalização e
repreensão da criação e compartilhamento de notícias falsas. Uma vez instaurada
a cultura de reconhecimento e de combate logo na formação inicial, fica
insustentável manter práticas demagógicas como as encontradas em instâncias
superiores judiciais e políticas, em que figuras que ou se beneficiam das fake
news ou são compartilhadoras contumazes de notícias falsas colocam-se como
baluartes da moralidade no combate à desinformação. O hábito e a
institucionalização da cultura de investida podem resultar em ações individuais
responsáveis e diárias, quer seja pelo espírito cidadão, quer seja pelas penas
e pelos constrangimentos sociais e legais.
Trazendo
para a base educacional a preocupação com a informação de qualidade, é possível
dar subsídios para que cada indivíduo possa se orientar e avaliar os riscos da
sua navegação. Terceirizar essa educação, postergá-la para o começo da vida
adulta ou relegar seu aprendizado a um conhecimento técnico voltado para o
mercado são erros. Quanto antes o conhecimento se estabelecer e a familiaridade
com a linguagem se fizer presente, maior será a capacidade de perceber que
existe um ato de responsabilidade no compartilhamento da informação.
Alexsandro Ribeiro -
professor nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda do Centro
Universitário Internacional Uninter.
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