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sexta-feira, 7 de novembro de 2025

A seca de humanidade nos dados da crise climática


O que as decisões da COP 30 têm a ver com a história de uma senhora, colhedora de açaí na Amazônia, que precisou escolher alimentar somente os netos menores enquanto os outros ficam sem comer?

O açaí é fonte de renda para diversas famílias na região Amazônica, que garantem algum sustento com a colheita do fruto durante os seis meses de safra. Nos outros seis meses, porém, a realidade é de insegurança alimentar, já que, para muitos ribeirinhos, o açaí é a única fonte de renda.

Em uma reportagem à Record em 2021, essa avó revelou, em lágrimas, que só tinha um pouco de mingau de trigo com açaí verde, para dar de comer somente aos dois netos mais novos. A situação ocorreu fora de um cenário de crise climática extrema — era apenas o período de entressafra, realidade comum no Norte do Brasil.

Em 2024, porém, a Amazônia enfrentou a maior seca da história. Rios secaram por completo, faltou água potável, o peixe desapareceu e comunidades inteiras ficaram isoladas, sem ter como buscar ajuda ou fontes alternativas de alimento. O episódio mostrou o quanto a crise climática aprofunda vulnerabilidades já existentes. Agora imagine o impacto dessa seca histórica na produção de um fruto, como o açaí, que demanda abundância de água para o seu desenvolvimento?

Essa senhora provavelmente não estará na COP 30, mas histórias como a dela precisariam estar. Em vez de decisões baseadas apenas em números e gráficos — que frequentemente desumanizam os afetados — é urgente incluir as vozes das populações que já vivem uma vulnerabilidade social, que será agravada com os impactos da crise climática.

Se a COP 30 não gerar ações concretas, episódios como esse não ocorrerão, exclusivamente, na entressafra do açaí: eventos extremos deixarão de ser exceção e se tornarão rotina. Deixaremos de discutir justiça climática para falar em sobrevivência climática. E, como sempre, quem tem dinheiro e influência sobreviverá; quem não tem, virará estatística — vítima da fome, das doenças e de um planeta cada vez mais hostil, hostilidade essa causada pelo próprio homem.

 

Niara Su - autora do livro “Ouro da Floresta”, um romance ambientado na Amazônia com o objetivo de transmitir um chamado à preservação da vida e da floresta.


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