Rosto derretido,
cabeça em desacordo com o restante do corpo e atrofia muscularFreepik
O Ozempic se tornou a celebridade do mercado
farmacêutico. As polêmicas sobre os efeitos referentes ao uso do medicamento
são renovadas a cada mês. Chorando e insatisfeita, a influenciadora Dayanne
Bezerra confidenciou aos seus seguidores que está se sentindo feia e que seu
bumbum ficou atrofiado pelo uso do medicamento.
Na busca desenfreada pelo corpo perfeito o
medicamento vem sendo utilizado simplesmente como a “caneta mágica” para perder
peso de maneira rápida. É possível encontrar tutorial de como utilizar e onde
encontrar o Ozempic sem a necessidade de receita médica nas redes sociais.
Algumas influenciadoras divulgam o antes e depois do uso do medicamento,
ressaltando a perda de peso e a melhora no percentual de gordura. Esse tipo de
atitude reforça o uso indiscriminado e pode causar efeitos colaterais mais
severos.
Para entender o que é real e o que é fake sobre o
tema, e o quanto a vaidade pode ser perversa, conversamos com três
especialistas: Eduardo Netto, Priscilla Martins e Rodrigo Bravim.
Para a médica, Priscilla Martins, a maioria dessas
polêmicas são sensacionalistas e tendenciosas. Boa parte das notícias que falam
sobre os efeitos colaterais de Ozempic relatam situações que podem ocorrer em
qualquer processo de emagrecimento independente do uso da medicação.
A especialista reforça que as polêmicas são
prejudiciais e contribuem para o preconceito contra o medicamento. Pessoas que
realmente precisam e se beneficiaram com o tratamento deixam de usar por medo.
“Entendo que, por ser um medicamento em alta, as notícias querem chamar a
atenção, dar audiência, e não se preocupam em buscar informações verdadeiras.
Por exemplo, não deixam claro que algumas consequências aconteceriam em
qualquer processo de perda de peso e não pelo uso do Ozempic”.
Ainda existe preconceito com o uso de medicamentos
para tratamento da obesidade, isso porque a maioria das pessoas não veem a
obesidade como uma doença e sim como um “desvio de conduta” e que basta a
pessoa querer para conseguir mudar o quadro, mas, hoje sabemos que não é uma
questão de “força de vontade” e ainda que a pessoa se dedique para perder peso
muitas vezes não conseguirá porque existem fatores metabólicos e genéticos que
dificultam o processo. O tratamento com medicamentos é uma excelente ferramenta
para ajudar essas pessoas a terem um estilo de vida mais saudável, com mais
qualidade de vida e menor risco de doenças.
“Não devemos ver a Semaglutida como um “remédio
para emagrecer”, e sim como um medicamento para tratar alterações metabólicas.
É necessário reforçar que obesidade é reconhecida pela OMS como uma doença
crônica e progressiva e, como toda doença crônica, o uso de medicamentos pode
ajudar a manter a doença sob controle. A medicina evoluiu e hoje temos
medicamentos seguros e eficazes que podem e devem ser utilizados para evitar
complicações relacionadas com o excesso de peso. O medicamento ajuda pessoas
com obesidade a terem uma vida melhor e mais saudável, mas o uso para fins
estéticos em pessoas com peso normal contribui para o preconceito contra a
medicação. Use medicamentos apenas com orientação médica”, esclarece Priscilla
Martins, Mestre em Endocrinologia e Metabologia pela UFRJ.
A Semaglutida é uma medicação potente para perda de
peso e quando uma pessoa emagrece muito há redução de gordura subcutânea que
pode causar flacidez e mudança da percepção corporal. Quando o
emagrecimento não é acompanhado de exercícios para fortalecimento muscular e de
bom aporte de proteínas também pode ocorrer perda de massa muscular,
especialmente se é feito sem acompanhamento médico e nutricional. Existe um
exagero nas notícias como se a culpa fosse do medicamento, mas na verdade esses
efeitos apontados podem ocorrem em qualquer processo de emagrecimento.
O medicamento é indicado para tratamento de
pacientes com obesidade (IMC acima de 30) ou sobrepeso (IMC maior de 27) com
complicações como hipertensão, diabetes e colesterol alto, geradas pelo aumento
de peso. O fármaco deve ser visto como um medicamento que trata uma
doença crônica como a obesidade e traz vários benefícios adicionais para o
paciente. Além de atuar sobre o apetite, ajuda no controle de alterações
metabólicas e na prevenção de doenças cardiovasculares. A droga não deve ser
utilizada em pessoas com história de carcinoma medular de tireoide ou neoplasia
endócrina múltipla do tipo 2 (NEM 2).
“No entanto, não há recomendação do uso de
Ozempic para emagrecimento apenas para fins estéticos em pessoas com o peso
normal. Semaglutida é uma medicação segura, mas, como qualquer outro
medicamento, pode ter efeitos colaterais como náuseas, dor no estômago, mal
estar, fadiga, diarreia, constipação e vômitos. O emagrecimento excessivo
também pode levar a perda de massa muscular e flacidez na pele, não pelo uso do
medicamento em si, mas pela perda de peso excessiva”, orienta Martins.
Usar a Semaglutida sem orientação médica aumenta o
risco de efeitos colaterais indesejáveis citados. O médico sabe como
orientar e a ajustar a dose para minimizar os efeitos colaterais e como
administrar cada um deles, caso ocorra. Além disso, quando não há
acompanhamento o risco de reganho de peso é maior por interrupção do tratamento
já que o especialista saberá orientar outras medidas de estilo de vida para ter
uma perda de peso sustentável a longo prazo. Fazer exercícios físicos de
fortalecimento muscular durante o emagrecimento ajuda a melhorar o tônus e
reduz o risco de flacidez. É importante também que a alimentação seja
balanceada com um bom aporte de proteínas e hidratação adequada.
Dica da especialista: a Semaglutida é uma medicação segura quando utilizada com
indicação correta e acompanhamento médico regular e pode trazer muitos
benefícios para a saúde. Busque um especialista confiável, esclareça suas
dúvidas e, se houver indicação, invista no tratamento sem medo.
O medicamento é aprovado pela Anvisa para
tratamento de diabetes e obesidade. Deve ser administrado através de uma
aplicação de injeção subcutânea uma vez na semana. É necessário iniciar o
tratamento com dose baixa e aumentar progressivamente a dose de acordo com a
tolerância individual. Esse ajuste progressivo é individualizado e ajuda a
minimizar o risco de efeitos colaterais. Estudos de uso em longo prazo não
mostram até o momento risco adversos graves e inclusive mostram benefícios com
o uso prolongado como a redução do risco de eventos cardiovasculares,
manutenção do peso perdido e menor risco de desenvolver diabetes.
As redes sociais exercem grande influência no uso
do medicamento sem acompanhamento médico e para fins estéticos. Influencers
usam o medicamento sem indicação e muitas vezes disseminam informações
equivocadas ou falam apenas do lado positivo do medicamento sem mencionar os
riscos e efeitos colaterais.
Atrofia muscular
Para entender qual é o problema que fez a
influenciadora Dayanne Bezerra chorar, conversamos com Eduardo Netto -
profissional de Educação Física há 40 anos. Atrofia muscular é o
enfraquecimento ou perda de tecido muscular e é caracterizada pela diminuição do
tamanho do músculo, o que resulta na perda de força.
Existem três tipos de atrofia muscular:
fisiológica, patológica e neurogênica.
A fisiológica é causada pelo uso insuficiente
dos músculos. Esse tipo de atrofia pode muitas vezes ser revertido com
exercícios e alimentação. As pessoas mais afetadas são aquelas que:
- Têm
trabalhos sedentários, problemas de saúde que limitam o movimento ou níveis
de atividades reduzidas;
- Pessoas
acamadas;
- As
que não podem mover seus membros devido a um AVC ou outra doença cerebral.
A patológica é observada com o envelhecimento,
inanição e doenças como a síndrome de Cushing (devido ao uso excessivo de
medicamentos chamados corticosteroides ou glândulas suprarrenais hiperativas).
A neurogênica é o tipo mais grave de atrofia
muscular. Pode ser causada por uma lesão ou doença de um nervo que se conecta
ao músculo. Este tipo de atrofia muscular tende a ocorrer de forma mais súbita
do que a atrofia fisiológica.
Exemplos de doenças que afetam os nervos que
controlam os músculos:
- Esclerose
lateral amiotrófica (ELA, ou doença de Lou Gehrig);
- Dano
a um único nervo, como a síndrome do túnel do carpo;
- Síndrome
de Guillain-Barré;
- Danos
nos nervos causados por lesões, diabetes, toxinas ou álcool;
- Poliomielite;
- Lesão
na medula espinhal.
Embora as pessoas possam se adaptar a essa
condição, até mesmo uma atrofia muscular menor causa alguma perda de movimento
ou força. Outras causas podem incluir: queimaduras, terapia de corticosteroides
a longo prazo, desnutrição, distrofia muscular e outras doenças musculares,
osteoartrite e artrite reumatoide.
Para detectar a atrofia muscular, é importante
observar sinais e realizar exames específicos. Os principais métodos utilizados
são: observação, avaliação médica, exames diagnósticos e monitoramento
contínuo. Esses métodos combinados ajudam a detectar e avaliar a gravidade da
atrofia muscular, permitindo intervenções e tratamentos adequados.
“Um programa de exercícios pode ajudar a tratar a
atrofia muscular. Os exercícios podem incluir atividades realizadas no meio
aquático para reduzir a carga de trabalho muscular e outros tipos de
reabilitação. Pessoas que não conseguem mover ativamente uma ou mais
articulações podem fazer exercícios usando órteses ou talas”, pondera Eduardo
Netto, diretor técnico da Bodytech Company.
A gravidade da atrofia muscular depende, portanto,
de vários fatores, incluindo a causa, a rapidez da progressão e as opções de
tratamento disponíveis. Consultar um profissional de saúde para um diagnóstico
e plano de tratamento personalizado é fundamental para manejar a condição de
forma eficaz.
Entenda a gravidade da atrofia muscular:
Causas subjacentes
- Fisiológica: devido ao desuso,
geralmente reversível com exercícios e nutrição adequada.
- Patológica: associada ao
envelhecimento, inanição ou doenças endócrinas (ex: síndrome de Cushing).
- Neurogênica: resultante de lesões
nervosas, é a forma mais grave e de progressão rápida (ex.: ELA, lesões na
medula espinhal).
Impacto na função
- Perda
de força:
significativa perda de força, afetando atividades diárias.
- Mobilidade
reduzida:
dificuldades de movimento, afetando a qualidade de vida.
- Desconforto: pode causar dor muscular e
incômodo.
Progressão da condição
- Gradual
ou rápida:
pode ser lenta (desuso) ou rápida (lesões nervosas).
- Recuperabilidade: a atrofia por desuso é
geralmente reversível; a neurogênica pode ser irreversível.
Complicações
- Lesões
adicionais:
aumento do risco de quedas e outras lesões.
- Condições
secundárias:
pode causar contraturas, dificuldades respiratórias e problemas
metabólicos.
Tratamento e manejo
- Reabilitação
e exercícios: terapias específicas ajudam a recuperar força e massa muscular.
- Intervenção
médica:
tratamento adequado para doenças subjacentes é crucial.
- Suporte
nutricional:
Dieta e suplementação adequadas são essenciais para a recuperação.
Redes Sociais X Pressão
estética
Nas redes sociais é possível encontrar conteúdos de
todos os tipos e para todos os gostos. Neste universo onde as pessoas são
felizes, gratos, perfeitos e alheios a qualquer tipo de problema, também é um
ambiente onde perigos, gatilhos e facilidades estão ao alcance das mãos. O
mundo virtual sempre disponibiliza a resposta a solução “perfeita” (sempre a
mais fácil) para qualquer tipo de dificuldade.
As pessoas estão sempre em busca de algo novo para
conquistar a beleza perfeita. Os principais atrativos são por protocolos mais
rápidos para soluções estéticas, medicamentos e até mesmo procedimento
cirúrgico.
Essa busca constante pode causar transtornos, entre
eles estão: ansiedade e depressão: pela falta de resultado imediato ou pela
constante frustração em ver pessoas alcançando o que deseja; bulimia: na tentativa
exagerada de poder satisfazer o corpo com satisfações rápidas por meio de
alimentos, mas sem causar qualquer tipo de impacto no seu peso ou na estrutura
corporal; anorexia e dismorfia corporal: onde a pessoa já não consegue se
ver/identificar como realmente é, e a cada tentativa de modificação estética
vai se deformando, já que não tem mais uma percepção real do próprio
corpo devido essas tentativas por soluções fáceis e rápidas, sem contar todo o
dano causado ao corpo em questões fisiológicas ao se colocar em risco com
dietas restritas, além de fazer uso de uma polifarmácia sem se quer saber de
que forma isso estará impactando em sua saúde física e mental.
Com o tempo essa insatisfação se transforma em
isolamento social, afinal, a busca interminável por algo que muitas vezes só
existe na cabeça da própria pessoa acaba transformando-a em alguém que foge de
ambientes públicos e de manter uma vida social, gerando problema em seus
relacionamentos pessoais, onde a pessoa começa a ter vergonha do próprio
parceiro.
“A falta de aceitação ou busca por uma melhoria
corporal de forma saudável tem cobrado um alto preço nas pessoas atualmente.
Precisamos entender que é um processo que leva tempo e trabalho, não existe
mágica. Cerca de 35% das pessoas que fazem cirurgia bariátrica sofrem com
reganho de peso, a mudança começa na mente, você pode tomar medicamento, fazer
alterações físicas e cirúrgicas, mas se não mudar o jeito de se relacionar com
a comida tudo isso será temporário. As redes sociais mal administradas se
tornam um problema na vida de qualquer um, afinal, lá é um lugar onde todos são
felizes, não existem contas atrasadas, estamos sempre comendo uma comida boa em
um local agradável. É um mundo à parte, onde as pessoas não vivem, apenas
visitam e deixam ali apenas um momento, “o melhor momento””, orienta Rodrigo
Bravim, psicólogo e professor no curso de pós-graduação em Medicina do Esporte
na Faculdade UNIGUAÇU.
O psicólogo ressalta que a vida registrada nas
redes sociais é totalmente diferente da real, do dia a dia. “Ninguém
compartilha contas, problemas, infelicidades, fotos onde não se sentem
confortáveis ou bonitas. Isso sem contar os filtros utilizados: olheiras,
cílios e maquiagens tudo virtual. E quando você tira os olhos da tela, com um
filtro e se olha no espelho o que restou de você? Assim fica cada dia mais
difícil que uma pessoa não busque a perfeição, e que não seja pecado acordar
descabelada, com olheiras, de pijamas e meia na cama bagunçada com forros
antigos, porque a influencer “fulana” postou seu bom dia, em uma cama com
lençóis de fios egípcios com seu cabelo impecável e sua pele de pêssego. É
difícil concorrer com isso e não se sentir feia, certo?”.
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