A educação em ciência precisa mudar, e os museus podem ajudar. Devemos focar no ensino do processo, não dos resultados
A mais recente pesquisa nacional sobre
Percepção Pública da Ciência mostra que, no ano passado, menos de 12% dos
brasileiros visitaram museus de Ciência e Tecnologia. O pouco aproveitamento
desses espaços pela população é uma enorme oportunidade perdida. Em maio, tive
o privilégio de ser a convidada de honra e palestrante principal do Jantar
Anual do Museu de Ciências de Londres. Pediram-me que falasse, em meu discurso,
sobre como museus podem ajudar a promover pensamento crítico e científico,
ajudando o público a entender o valor das evidências científicas para tomar
decisões informadas.
Quando as pessoas pensam em museus, o que geralmente imaginam é um lugar aonde vamos para aprender sobre o passado e o mundo natural. É como um repositório de conhecimento. E é claro que museus nos dão um vislumbre do passado, uma melhor compreensão da história e de nosso lugar no mundo, mas é só isso?
Museus de ciência são diferentes. Têm a missão de explicar que a ciência não está escrita em pedra. A ciência muda quando surgem novas evidências sobre como as coisas funcionam e, de repente, algo que se considerava verdade no passado pode ser contestado. Mas como encaixamos isso em uma exposição? Como podemos garantir que as pessoas tenham acesso não apenas ao melhor conhecimento de acordo com a ciência de hoje, mas também a informação de que a pesquisa científica é uma atividade de autocorreção, em que conclusões podem mudar?
Para responder a essa pergunta, gostaria de me concentrar em dois pontos: educação científica e a relatividade do erro.
A educação em ciência precisa mudar, e os museus podem ajudar muito nisso. Em quase todo o mundo, ensinamos ciência como um grande corpo de conhecimento, informações que os alunos devem memorizar, e que vão cair na prova: verdadeiro ou falso, certo ou errado.
Mas esta não é a maneira como fazemos ciência. Dificilmente temos respostas binárias. A ciência lida com incertezas. Ensinar como se houvesse certezas absolutas cria expectativas impossíveis. O público passa a exigir certezas absolutas e se sente traído quando não as encontra. E então, como cientistas, ficamos surpresos quando durante a pandemia, mudanças de rumo ditadas por novas evidências eram recebidas com desconfiança ou usadas para insuflar teorias de conspiração.
Precisamos nos concentrar no ensino do processo, não dos resultados. Ao ensinar como usamos o método científico e como estabelecemos consensos científicos, evitamos as expectativas impossíveis e construímos confiança.
O que me leva ao segundo ponto: a relatividade do erro. Como cientistas, estamos acostumados a mudar de ideia, cometer erros e falhar repetidas vezes em experimentos. Já o público está habituado a receber os resultados prontos. Precisamos mostrar o processo, mas com o cuidado de deixar claro que reconhecer erros passados não invalida todo o conhecimento anterior.
Isaac Asimov escreveu um ensaio em 1989 para a revista Skeptical Inquirer intitulado “A relatividade do erro”, após receber uma carta de um estudante de literatura, alegando que, como a ciência errou sobre tantas coisas no passado, não se pode confiar no que ela diz hoje. Asimov respondeu que esse sentimento provavelmente vem da noção de que o certo e o errado são polos opostos e absolutos, sem gradação. E dá um exemplo: acreditar que a Terra é plana é errado. Acreditar que é uma esfera também é errado. Mas acreditar que dizer “a Terra é plana” é tão errado quanto dizer que “a Terra é esférica” está ainda mais errado!
Acredito que os museus de ciência podem promover o pensamento crítico, ensinando sobre o método científico e o processo da ciência, e como, ao usar a ciência para desenvolver conhecimento e tecnologia, podemos, com o tempo, estar menos errados.
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