Especialista
explica como a internet pode ser propagadora de gatilhos e como diálogo pode
diminuir incidência de casos
O suicídio, hoje em dia, ainda é considerado tabu por muita gente. Mas não deveria. Afinal, faz uma média de uma vítima a cada quatro segundos no mundo, ou seja, 800 mil vítimas por ano, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). A psicóloga Ana Gabriela Andriani explica que, em muitos lugares, existe um empecilho extra para tentar diminuir esse número. “Existe a crença de que, ao falar sobre o assunto, estaríamos, na verdade, propagando ou divulgando o suicídio e suas tentativas”. Ela adverte, no entanto, que deveria ser o oposto, que falar disso poderia reduzir a incidência de casos.
Redes Sociais e suicídio
De acordo com a especialista, as redes sociais,
sim, têm sido um meio propagador de gatilhos para as tentativas de suicídio,
especialmente quando falamos de jovens e adolescentes. Isso principalmente em
um momento em que o consumo da internet aumentou tanto em função da necessidade
do isolamento físico social. O bullying e a constante necessidade de aprovação
virtual têm levado cada vez mais jovens a desenvolver quadros de depressão e
ansiedade. Um estudo realizado pela Escola de Medicina da Universidade de
Pittsburgh, nos Estados Unidos, mostrou que os “heavy users” (usuários que
passam grande parte do tempo na internet) possuem três vezes mais chances de
sofrer de depressão comparando com aqueles que conferem suas redes sociais com
menos frequência.
Já um estudo de 2017 da agência nova/sb analisou
mais de 1 milhão de menções ao suicídio nas redes sociais (Facebook, Instagram,
Twitter e Youtube): em 34,2% dos casos eram piadas ou memes, 24,4% eram
opiniões, 22,1% citações, 7,5% notícias, 6,3% relatos e 5,5% se tratavam de
depoimentos. OS dados também mostraram informações preocupantes: 18,3% das
postagens eram falas negativas ou preconceituosas, como por exemplo “conte a um
psicólogo, não ao Facebook”, “quem tem depressão não fica em rede social
tentando aparecer” ou “quem quer se matar não avisa”. Algumas, inclusive,
incentivavam os usuários a tirar a própria vida. “Esses resultados mostram a
necessidade de uma abordagem e de um espaço sem julgamentos para sensibilizar e
educar e, assim, contribuir com a prevenção”, afirma Ana Gabriela.
Diálogo como prevenção
Para a psicóloga, o diálogo é fundamental. “É
necessário falar sobre o assunto. Mas isso não significa apenas divulgar
números. É preciso entender o que leva ao suicídio, como é possível prevenir e
que o suicídio é uma questão de saúde pública. Precisamos abrir esse canal de
diálogo e trazer informações sobre o tema e tudo o que o cerca, como as doenças
mentais, saúde mental, o que é e quais são os sinais de comportamento suicida.”
Ela explica que o assunto é complexo e nem todas as
pessoas que cometem o suicídio apresentam algum tipo de sinal prévio, por isso
que é tão importante erradicar esse preconceito. Outro ponto fundamental para
se esclarecer é que muitas vezes não existe um planejamento para tal ato.
“Muitas vezes a pessoa busca uma maneira de acabar com algum sofrimento e vê na
tentativa do suicídio uma saída. Ela não pensa em morrer, ela pensa em uma
solução para aquele momento de dor. É importante esclarecer que nem toda pessoa
que comete suicídio planejou a ação, pretendia de fato acabar com a vida ou
tinha histórico de tentativas”, analisa.
Ana Gabriela ainda salienta que o preconceito de
achar que quem comete suicídio é fraco também não é válido. “Vemos pessoas
fortes que, em um momento de desespero, só enxergam isso como saída. Julgar o
próximo não vai ajudá-lo”. Desde 2014, ocorre no Brasil a campanha do Setembro
Amarelo, que é realizada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em
parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM). Uma tentativa de levar luz
ao assunto.
“Quando falamos sobre a prevenção do suicídio,
devemos prestar atenção à forma como abordamos o tema. Muitas vezes focamos na
morte apenas de pessoas famosas e colocamos uma certa dose de romance no ato,
ligando o suicídio ao estilo de vida dessa personalidade, como falta de sono,
vida agitada e conturbada, por exemplo. O que é deixado de fora nesses casos,
muitas vezes, são as reais causas do suicídio”, diz Ana Gabriela. Ela finaliza
alertando que estão no grupo de risco pessoas com esquizofrenia, bipolaridade,
borderline, uso excessivo de drogas e de álcool.
Gabriela Andriani - Graduada em
Psicologia pela PUC-SP, Ana Gabriela Andriani é Mestre e Doutora pela Unicamp.
Tem pós-graduação em Terapia de Casal e Família pelo The Family Institute, da
Northwestern University, em Illinois, Estados Unidos, e especialização em
Psicoterapia Dinâmica Breve pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das
Clínicas/USP. Possui, ainda, aprimoramento Clínico em Fenomenologia Existencial
na Clínica Psicológica da PUC-SP. Ana Gabriela acredita que o autoconhecimento
influencia diretamente no trabalho, nas relações afetivas e na qualidade de
vida.
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