A crise sanitária instalada no nosso país por conta da COVID-19 deixou muitos trabalhadores em estado de vulnerabilidade. Seja por conta da doença causada pelo novo coronavírus ou pela perda de renda, amparar essa parcela da população é fundamental. Dessa forma, se faz necessária a discussão acerca do auxílio-doença parental – entendimento ainda não fixado de maneira ampla pelo RGPS (Regime Geral da Previdência Social).
O
auxílio-doença parental tem por escopo supre as necessidades daquele segurado
que esteja impedido de exercer suas funções laborais e é o único responsável
pelo cuidado com a saúde de algum parente próximo. A interpretação vale para
filho, cônjuge, pais, avós ou demais parentes que necessitem de cuidados
especiais.
Sem previsão
legal para os segurados do RGPS, o benefício é uma construção com base em
doutrinas e entendimentos jurisprudenciais. É uma junção entre o auxílio-doença
do regime da previdência (Lei 8.213/91, artigo 59), a licença para tratamento
de saúde e a licença por motivo de doença em pessoa da família. Sobre esse
último item, o artigo 81 da Lei 8.112/90 prevê o benefício concedido ao
servidor que tiver de se ausentar do trabalho para cuidar de ente familiar
acometido de alguma doença.
A
legislação previdenciária prevê apenas o benefício de auxílio-doença que é
concedido ao segurado que encontrar-se incapacitado de forma temporária para
exercer sua atividade laborativa. Ou seja, apenas garante o benefício ao
segurando do RGPS, não estendendo quando seus parentes são acometidos de alguma
doença.
Desta
forma, há uma latente necessidade de suprir lacuna legislativa existente para
os segurados do RGPS. O objetivo é o de prover os cuidados ao familiar
adoentado.
Os benefícios
encartados na Lei 8213/91 são muito além de mero auxílios. Estão relacionados
ao princípio da dignidade humana como uma das diretrizes do Estado Democrático
de Direito esculpido na Constituição Federal de 1998.
Dispositivos
legais
Sob o
prisma dos princípios constitucionais e direitos fundamentais, tem-se como
ponto de partida o direito à vida. O tema é previsto no caput
do artigo 5º da Constituição Federal.
O direito
ao respeito da estrutura familiar, é, segundo a própria Carta Política, a
"base da sociedade". De tal modo, nada mais justo do que
especial proteção à mencionada instituição. Consolida tal tese o art. 226, caput,
da Constituição Federal.
No âmbito
da legislação federal, a licença por motivo de doença em pessoa da família
encontra-se regulamentada no art. 83 da Lei 8.112/90. O dispositivo prevê ao
servidor a licença por motivo de doença do cônjuge ou companheiro, padrasto ou
madrasta, ascendente, descendente, enteado e colateral consanguíneo, ou afim
até o segundo grau civil, mediante comprovação por junta médica oficial. O
direito é aplicado caso a assistência direta do servidor for indispensável e
não puder ser prestada simultaneamente com o exercício do cargo.
A licença
remunerada por motivo de doença em pessoa da família não é nenhum privilégio,
mas um instrumento consentâneo com a política adequada em uma gestão de pessoas
no setor público, que deve ter como referência o dever do Estado em assegurar
de maneira integral a assistência à saúde e proteção especial à criança (artigo
227 caput e § 1º da constituição). E mais, não se pode afastar a obrigação de
amparo à criança prevista na Constituição da República e no Estatuto da Criança
e do Adolescente, que assegura a efetivação do direito à vida e à saúde da
criança, quando se tratar de licença para cuidar do filho.
Logo, tanto
a legislação federal como a estadual fornecem as ferramentas para que o Estado
possa oferecer saúde, educação, alimentação e outras prioridades previstas no
art.227 da constituição. Dessa forma, quando a Administração Pública nega um
direito, está ferindo diversos dispositivos legais, constitucionais e
entendimento dos Tribunais. A omissão ao não reconhecer a licença para
tratamento de saúde de pessoa da família, por entraves burocráticos de uma
norma regulamentadora infraconstitucional, está entre esses direitos.
A
Constituição Federal preconiza no artigo 37, que a Administração Pública está
submetida ao princípio da legalidade de seus atos administrativos. Assim, à
medida que o Estado ignora a existência do artigo 83, da Lei 8.112/90 e artigo
181, IV, da Lei 10.261/1968, indeferindo o direito dos servidores, afronta o
princípio da legalidade e o Estado Democrático de Direito.
Dra.
Jorgiana Paulo Lozano - faz parte da equipe técnica do escritório Aparecido
Inácio e Pereira Advogados Associados. A advogada é bacharela em Direito pela
Faculdade Anhanguera desde 2012, especialista em Direito do Constitucional e
Administrativo pela Escola Paulista de Direito, em 2014, especializanda em
Direito Previdenciário pela Faculdade Legale e inscrita na Ordem dos Advogados
do Brasil sob o nº 331.044.
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