A pandemia decorrente da Covid-19 tem afetado
negativamente diversos setores da vida social e econômica. Entre os setores
mais afetados está o da saúde, que já sofre com a falta de leitos em hospitais,
medicamentos e equipamentos de segurança para os médicos. Há carências não só
nos grandes centros, mas agora também no interior dos Estados.
Mesmo que algumas áreas da economia sigam em franca
atividade, sem grandes alterações, preocupam os impactos a longo prazo, o que
requer a atenção para o futuro que está à nossa porta. Tais impactos não
excluem o Judiciário, pois esse será um setor fortemente sobrecarregado
nos próximos meses, devido ao aumento no número de demissões, quebras ou
cancelamentos de contratos, constantes mudanças em medidas provisórias e uma
instabilidade legal em larga escala. A questão é: a Justiça está preparada para
uma avalanche de processos?
Já há, sem dúvida alguma, um aumento de demanda
pelas soluções de conflitos mediante a intervenção do Poder Judiciário. Há
notícias de um aumento de 177% de pedidos de divórcio. Há quebra de contrato em
escala surpreendente, sob o argumento da imprevisibilidade, que de fato atingiu
muitas relações, mas claro que não todas. Há também abusos e todos esses
conflitos, certos ou errados, desaguarão em litígios.
Dessa forma, precisaremos de um constante
esclarecimento sobre a utilização de todas as ferramentas legais disponíveis
para a solução desses conflitos, que permitam o atendimento da população –
chamados aqui, jurisdicionados - para que não haja um colapso nas atividades do
judiciário. As câmaras de conciliação, mediação e arbitragem deveriam ser
melhor explicadas e facilitadas para o grande público, e ainda necessário
seria, que houvesse mais habilitações nessas câmaras, de árbitros e de pessoal
especializado, de modo a otimizar as soluções, o que poderia ser feito em
consórcio ampliado com o Poder Judiciário de modo tornar factível o acesso a
esses meios. Além disso, promover rapidamente a homologação de sistemas
digitais que já existem, como meio de solução de conflitos de direitos
disponíveis, para serem instrumentos válidos e eficazes de solução.
A transformação digital precisa ser considerada
como fator decisivo para ganho de agilidade e produtividade no meio jurídico.
Entretanto, mesmo com a incorporação de novas ferramentas e de tecnologias, as
estruturas e o pessoal serão os mesmos. Por isso, antes de pensar na
modernização do setor, é preciso que magistrados, advogados, servidores do
judiciário e jurisdicionados, sejam motivados e instruídos para a aceitação da
chamada cultura digital. Sem conhecimento e planejamento, isso, sem dúvida,
gerará um colapso a médio prazo.
Esse tempo de pandemia tem nos ensinado muito como
profissionais da área, apesar de toda a tristeza e o sofrimento que esse quadro
gera. Há inovações e novas práticas que tem funcionado bem, por exemplo, os
agendamentos de despacho virtual com os magistrados, que têm sido bastante
produtivos. Porém, para que continue dando certo, isso requer um modelo eficaz,
mais organização, eficiência dos sistemas e uma revisão normativa.
A questão que mais me preocupa nesse momento é
massificação dos procedimentos judiciais. Se não houver ampliação dos recursos
disponíveis e uma eficiente revisão dos procedimentos, adaptando-os às novas
realidades, teremos grandes dificuldades em manter níveis satisfatórios de
eficiência no judiciário, para que a população possa encontre estabilidade
nesse poder.
Vivemos em meio a grandes mudanças de realidades,
de critérios de sobrevivência, de aflições e soluções criativas para seguirmos
a vida, de modo geral. Todos os sistemas de serviços e contratos precisarão ser
simplificados. Nesse passo, a ciência jurídica não pode ficar à margem do
processo: precisará se adaptar rapidamente, reagindo às novas realidades.
O grande volume de ações deve ser representado pela
área trabalhista, em razão dos ajustamentos dos novos critérios das relações
contratuais do emprego, e pela área cível, em vista do colapso econômico que
afetará o cumprimento dos contratos. Por isso, é importante que as empresas se
resguardem juridicamente para evitar processos. A recomendação é que as
companhias não adotem uma posição passiva, de forma a agir assim que
identificado algum problema. A manutençao de canais de comunicação com os
clientes, fornecedores e o público em geral é uma excelente ação de prevenção e
solução de futuros problemas. Claro, que contratar uma boa consultoria jurídica
será um caminho natural e eficiente, porque esses mecanismos de comunicação, de
preparação dos entendimentos e mitigação de riscos serão eficientes se
acompanhados de uma assessoria jurídica qualificada.
Vivemos, é certo, um momento de “divisão de águas”.
Precisamos assumir o compromisso com as tecnologias digitais. Como já observou
Albert Einstein, “é impossível obter resultados diferentes fazendo sempre a
mesma coisa”. Ou seja, não há como sobreviver no futuro se não pensarmos fora
da caixa!
Isso quer dizer que nós, operadores do direito,
precisamos abrir nossas mentes e nos prepararmos para mudanças. Se não
reagirmos e trabalharmos arduamente para o desenvolvimento de novas
tecnologias, de novos modelos de atuação jurisdicional, pouco evoluiremos,
especialmente no ramo das relações de trabalho. É preciso dar autonomia aos
contratos bilaterais e multilaterais, entendê-los com o olhar das novas
realidades. A lei material não precisará mudar, mas deverá se adaptar para
possibilitar o exercício dos meios tecnológicos. Assim, conseguiremos um
Judiciário mais fluido e eficiente, facilitando a vida de empresas, de
profissionais e toda a população.
Marcos
Martins - especialista em Direito Civil, Processual Civil
e Empresarial, além de sócio-fundador do escritório Marcos Martins Advogados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário