Enquanto a OMS lança uma campanha para incentivar o
debate sobre a depressão, preconceitos e desinformação desencorajam a busca por
tratamento no Brasil
O Brasil é o país com o maior porcentual de
indivíduos diagnosticados com depressão na América Latina, segundo os dados
mais recentes sobre o tema divulgados pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Estima-se que a doença afete 5,8% da população do País, o que corresponde a 11
milhões de pessoas, quase o total de habitantes de uma cidade como São Paulo,
por exemplo. Mas, ainda assim, a depressão permanece envolta em desconhecimento
e preconceito, dificultando a discussão sobre o tema e, consequentemente, a busca
por ajuda.
“Temos aspectos socioculturais e econômicos
peculiares em nossa população que nos lançam a proporções gigantescas de
pacientes com depressão não tratados. São aspectos atrelados ao não
entendimento da depressão como doença, bem como à não aceitação do quadro e,
por consequência, à negação de que o auxílio terapêutico pode ser necessário”,
explica o médico Roberto Miotto, diretor técnico do Hospital do Arsenal do Rio
de Janeiro e professor da pós-graduação em Psiquiatria na Pontifício Universidade
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
No Brasil, 53% dos indivíduos diagnosticados com
depressão não tratam a enfermidade, segundo dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), o que pode acarretar sequelas irreversíveis ao
paciente. Para ampliar o diálogo sobre essa temática e encorajar a busca por
auxílio médico, neste ano a OMS adotou a depressão como mote para o Dia Mundial
da Saúde, celebrado em 7 de abril, e lançou a campanha Let’s
Talk. Abaixo, o médico Roberto Miotto estimula esse debate listando
e esclarecendo os 10 principais mitos associados ao tratamento com
antidepressivos.
1) Depressão é uma herança genética?
Verdade. Existe, sim, um componente
genético já bastante conhecido no meio médico relacionado à depressão, embora
este não seja um fator determinante para o desenvolvimento da doença. “Costumo
dizer que genética não é destino. Percebemos que alguns indivíduos com alto
grau de depressão incidente na família evoluem de forma melhor quando começam a
ser tratados desde cedo”, afirma Miotto.
2) Antidepressivos causam dependência?
Mito. De acordo com o psiquiatra,
não existem evidências de que os antidepressivos causem dependência. Por outro
lado, como a depressão é uma doença crônica, o tratamento farmacológico é,
muitas vezes, mantido por toda a vida. “Na maioria dos casos, o uso dos
antidepressivos será necessário durante a vida toda, assim como se dá com a
diabete, a hipertensão ou qualquer outra doença crônica. A diferença é que não
existe um estigma associado ao uso contínuo de uma medicação para hipertensão
arterial, por exemplo”, esclarece Miotto. “Só sairemos desse julgamento
preconceituoso relacionado à depressão com informação e educação da nossa
sociedade”, completa.
3) Antidepressivos podem afetar o ciclo menstrual?
Parcialmente verdade. Durante o
ciclo menstrual, os níveis de hormônios como estrógeno e progesterona, por
exemplo, mudam constantemente. “Esse fato parece exercer um poderoso efeito
sobre os estados de humor das mulheres. Assim, considerando também a
terapêutica antidepressiva, algumas vezes podemos ter alterações na prolactina,
o que pode levar a mudanças no ciclo menstrual, atrasando e até bloqueando a
ovulação”, esclarece Miotto. De qualquer forma, de acordo com o psiquiatra,
apenas algumas classes de antidepressivos podem interferir na produção hormonal
e no ciclo menstrual. Por isso, é importante que a mulher discuta o assunto com
seu médico e, em casos de risco, é recomendável utilizar mais de um método
anticoncepcional.
4) O uso de antidepressivos é relacionado à
sonolência e à letargia, o que poderia interferir na concentração e no
trabalho. Isso é verdade?
Mito. De acordo com o médico, é
comum que o paciente relate esses efeitos apenas no início do tratamento, até
que o organismo se adapte à medicação. “Após esse período, essa sintomatologia
não é admissível, uma vez que buscamos o efeito contrário no tratamento, que é
a funcionalidade plena do paciente. Caso esses sintomas se mantenham, é
importante relatar ao médico para orientação e possível troca da medicação”,
afirma o psiquiatra.
5) Antidepressivos causam ganho de peso?
Parcialmente verdade. Existem
hoje no mercado três gerações de antidepressivos. Os mais antigos estão, de
fato, mais associados ao ganho de peso, entre outros efeitos, mas nem por isso
são menos eficazes. Já os mais modernos, que apresentam ação dual, como a
desvenlafaxina, possuem um perfil metabólico diferente, sem impactos
significativos sobre o peso. São medicamentos que conseguem equilibrar a
disponibilidade de dois neurotransmissores importantes e diretamente
relacionados aos quadros depressivos: a noradrenalina e a serotonina. Contudo,
essa escolha depende do perfil de cada paciente. “Se temos um paciente anoréxico,
por exemplo, ele pode se beneficiar, mesmo que por um curto período de tempo,
de um antidepressivo mais antigo, associado ao ganho de peso”, pondera Miotto.
“Não deixamos de prescrever os antidepressivos mais antigos. Muitas vezes, a
associação com os medicamentos mais modernos é uma combinação benéfica”,
completa.
6) Muitas pessoas deixam de procurar tratamento por
sentirem vergonha e acabamescondendo a doença o quanto podem de amigos e até
mesmo de seus familiares.
Verdade. Miotto observa que a depressão
ainda é, muitas vezes, percebida como um sinal de fraqueza pela sociedade,
especialmente entre os homens. “A vergonha e os aspectos sociais e educacionais
fazem com que os pacientes tardem muito na busca por ajuda, especialmente o
público masculino”, esclarece o médico, ressaltando que as taxas de suicídio
são mais elevadas justamente entre os homens, embora a depressão seja mais
frequente entre as mulheres. “Esse fato reforça a importância da educação e da
conscientização, evitando que o preconceito em torno da depressão e do uso de
antidepressivos continue a contribuir para o tratamento inadequado da doença no
Brasil e a dificultar os diálogos sobre o problema”, complementa.
7) Antidepressivos estão associados à perda da
libido?
Parcialmente verdade. Vale
ressaltar que a própria depressão pode levar ao desinteresse pelo sexo.
Contudo, em relação à medicação, é importante compreender que os
antidepressivos atuam de forma diferente em cada um dos pacientes. De qualquer
forma, os medicamentos de ação dual, já citados, não costumam exercer impacto
significativo sobre o desejo sexual, ao contrário de alguns antidepressivos
mais antigos. “Cabe, então, a avaliação diagnóstica criteriosa por parte do
médico, que saberá delimitar o perfil de cada paciente e ajustar o
antidepressivo adequado, de modo a minimizar os efeitos indesejados”, destaca
Miotto.
8) O diagnóstico é uma das principais dificuldades
no tratamento adequado da depressão?
Verdade. De fato, o diagnóstico
precoce ainda é um desafio no Brasil. “É o médico, por meio de uma análise
precisa e criteriosa, que poderá diferenciar uma tristeza, como um período de
luto, de um quadro com componentes orgânicos, cerebrais e comportamentais, que
traz prejuízos funcionais prolongados”, explica Miotto. Vale destacar que a
depressão, quando não tratada adequadamente, pode trazer sequelas importantes,
como a diminuição do número de células nervosas e, com o passar do tempo, do
volume de algumas regiões cerebrais de modo irreversível, levando a déficits
cognitivos significativos, ou até mesmo, a tentativas de tirar a própria vida.
De acordo com Miotto, o resgate da funcionalidade
plena do paciente deve ser um dos focos no tratamento da depressão. “Esse
processo passa por esferas que abrangem a completa integração emocional com o
meio, a família e o trabalho, levando o indivíduo a ‘sentir-se integrado’ à
sociedade. Para isso, em muitos casos, é fundamental o uso de antidepressivos
que busquem uma melhora completa, contemplando aspectos relacionados à vida
sexual, à qualidade do sono, ao apetite e à preservação das habilidades
cognitivas”, afirma. Entre esses medicamentos está Pristiq (desvenlafaxina), da
Pfizer, que se destaca por favorecer o resgate da funcionalidade do paciente,
restaurando sua capacidade plena de atuação e ampliando, assim, sua qualidade
de vida.
9) É verdade que antidepressivos podem ser
ingeridos juntamente com outros medicamentos sem prejudicar o mecanismo de ação
deles?
Parcialmente verdade. O perfil
de interação medicamentosa é variável entre as diferentes classes de
antidepressivos. Em geral, na comparação com indivíduos saudáveis, os pacientes
com quadros depressivos apresentam maior probabilidade de interações
medicamentosas, uma vez que os antidepressivos costumam ser prescritos por um
longo período de tempo, muitas vezes por anos¹. A literatura médica descreve
interações medicamentosas de significativa importância entre algumas classes de
antidepressivos e outros medicamentos comumente utilizados por idosos, como
analgésicos, anestésicos, anticoagulantes, anticonvulsivantes e
anti-hipertensivos². Por isso, é importante discutir
com o médico qual a medicação mais indicada para cada caso, considerando que há
opções no mercado mais compatíveis com o uso concomitante de outras medicações.
“Os antidepressivos mais novos apresentam melhor interação medicamentosa e
mecanismos metabólicos diferenciados, que permitem o tratamento com vários
outros medicamentos associados”, destaca Miotto.
10) Os antidepressivos mais modernos, que
apresentam menos efeitos colaterais, também são menos eficazes?
Mito. A evolução no entendimento
da depressão e o conhecimento cada vez mais aprofundado dos fatores
relacionados à doença têm possibilitado o desenvolvimento de tratamentos cada
vez mais modernos, eficazes e seguros, como os antidepressivos de terceira
geração. Com ação dual, esses medicamentos conseguem equilibrar a
disponibilidade de dois neurotransmissores importantes e diretamente
relacionados aos quadros depressivos: a noradrenalina e a serotonina. “Na
verdade, com essa nova classe de antidepressivos, conseguimos mais sucesso
terapêutico, até mesmo com alguns pacientes que não reagiam às medicações já
existentes até então. Foi uma grande evolução”, afirma o médico.
Referências:
- ERESHEFSKY, L. Drug-drug interactions with the use of psychotropic medications. Question & Answer Forum, v. 14(8), p. 1-8, 2009.
- Ciraulo DA, Shader RI, Greenblatt DJ, Creelman W. Drug interactions in psychiatry. 2nd ed. Baltimore (Maryland): Williams & Wilkins; 1995
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