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quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Privatização da telefonia: quem perdeu foi a viúva


Em um momento em que o debate sobre a privatização de grandes empresas estratégicas volta à tona, nada mais oportuno do que lembrar-se da privatização da Telebrás, que completou 20 anos no início de agosto. Executada em um momento de ajuste fiscal, semelhante à conjuntura de 2018, a proposta de privatização foi motivo de grande debate, com muitos segmentos contrários à estratégia, protestos, discursos, artigos de opinião... Só não tinha textão no Facebook. Naquele momento, não se tinha resultados concretos das privatizações realizadas em outros setores para demonstrar as vantagens da atuação do setor privado em serviços de infraestrutura. Muito mais do que o ajuste fiscal, o principal resultado da privatização da Telebrás foi a ampliação do acesso à comunicação.

A privatização foi uma ação de quebra de monopólio estatal de um serviço estratégico. Quando do surgimento da telefonia, tecnicamente era inviável ter mais de uma operadora do serviço em uma mesma região. Com a evolução da tecnologia para a comunicação via satélite, não havia razões técnicas para se manter o monopólio. No cenário mundial, os países abriam o mercado à concorrência com a premissa de melhorar a competitividade em qualidade - e obtinham redução de até 70% dos preços do serviço ao consumidor.

No Brasil, o monopólio estatal contava com um problema adicional: a limitação do Estado em realizar investimentos na modernização das empresas e ampliação do acesso à telecomunicação. Vale lembrar que, até a privatização, as linhas telefônicas eram vendidas a valores elevados, com disponibilidade restrita que gerava filas de anos de espera, mesmo para os poucos que tinham recurso para investir um valor atualizado de aproximadamente R$ 5.000,00.

E de fato era um investimento: o consumidor se tornava “acionista” da companhia telefônica total, com devolução do valor pago após determinado período. Além disso, havia um negócio bastante lucrativo: o aluguel de linhas telefônicas como uma opção de investimento para quem conseguia pagar por linhas novas, além da especulação com a venda de linhas “sorteadas”. Linha telefônica era patrimônio declarado em imposto de renda.

Tínhamos hábitos interessantes: o telefone para recado (que às vezes ressurge em algum formulário cadastral), a interação social na fila do orelhão, a amizade com vizinhos com linha telefônica em casa para fazer ou receber chamadas interurbanas de parentes... Ter uma linha telefônica significava mais status que ter um iPhone atualmente.

E os celulares? O valor de uma linha era de aproximadamente US$ 4.000. Quem conseguia comprar quase não recebia ou fazia ligações, pois as tarifas eram exorbitantes. Somente para emergências, em conversas rápidas, quase telegramadas. O resultado da privatização pode ser visto em números: se, em 1998, contávamos com aproximadamente 17 milhões de linhas fixas, em 2018 passamos para 40,5 milhões, já em um cenário de queda de assinaturas em função da substituição pela telefonia móvel. O acesso à telefonia celular apresentou maior avanço: de pouco mais de 4,5 milhões de linhas em 1998, atingiu 235,8 milhões de assinaturas em março de 2018, mais do que a população brasileira. Para se ter uma ideia, em 1998 havia 45 linhas de celular a cada 1.000 habitantes e, em 2018, aproximadamente 1.129 linhas para cada 1.000 habitantes.

Embora seja líder de reclamações nos órgãos de defesa do consumidor, é inegável a melhoria da qualidade e a redução do preço dos serviços. Sem o conflito de interesses de fiscalizar a si mesmo, o Estado pode estabelecer indicadores de resultado e monitorar seu cumprimento. A possibilidade de trocar de operadora de telefonia com facilidade também é um incentivo à melhoria da qualidade do serviço.

É evidente que os serviços podem melhorar, mas certamente estamos em situação muito melhor do que depender do vizinho para falar com o avô em outro estado. Se fôssemos lamentar algo com a privatização da telefonia, seria a perda de interação social com a vizinhança e a queda da renda das viúvas com a perda do aluguel de linhas telefônicas.







Leide Albergoni - economista, professora da Universidade Positivo (UP) e autora do livro Introdução à Economia – Aplicações no Cotidiano.


Assim como a CNH, documento de carro também terá versão digital


Depois da Carteira Nacional de Habilitação Eletrônica (CNH-e), chegou a vez do Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV), que até o final deste ano passará a ter versão digital em todos os Detrans. A medida é uma evolução do APP CNH Digital, que agora passa a trazer também o CRLV eletrônico. De posse obrigatória por parte do condutor do automóvel, o CRLV-e terá todas as informações do documento impresso, além de um QR Code, exatamente como a CNH-e, o que permitirá às autoridades confirmar as informações para saber se há alguma falsificação no documento.
A novidade está sendo implementada primeiro no Distrito Federal. A opção digital poderá substituir o documento impresso e ficará disponível para consulta por meio de aplicativo no celular. Por meio desse APP, a Carteira Digital de Trânsito proporciona maior praticidade e segurança ao motorista, por reunir todos os documentos de porte obrigatório. Assim como a CNH-e, existe a funcionalidade de exportação do CRLV Digital, em formato pdf, com uso do certificado digital, ou seja, de forma online.
“É muito importante esse tipo de comodidade. Se a pessoa possuir certificado digital, poderá usar o mesmo aplicativo da CNH-e a partir do portal do Denatran. Caso o celular com a CNH e CRLV digitais seja roubado ou perdido, basta ao usuário bloquear o documento, se tiver o certificado digital, poderá fazer isso no mesmo portal do Denatran e solicitar o bloqueio remoto”, explica Murilo Couto, Gerente Senior de Certificação Digital da Serasa Experian . Ou seja, o certificado digital facilita a vida dos motoristas na medida em que não é preciso o comparecimento físico ao Detran, tudo pode ser resolvido pela internet.
O anúncio do novo sistema foi feito pelo Ministério das Cidades, dez meses depois da CNH-e, e representa mais uma medida desburocratizante para os cidadãos.




Serasa Experian

Compliance nas contratações públicas: a exigência dos programas de integridade pela administração pública



A propagação de escândalos de corrupção nos últimos anos demonstrou que o vício corruptivo, para além de um problema moral, histórico e cultural, também deve ser analisado sob o viés político e institucional. Com efeito, a prática da corrupção extrapola o dano direto provocado à Administração Pública, causando – no mínimo indiretamente – danos a toda coletividade, comprometendo a livre concorrência, a democracia, o comércio, entre tantas outras searas.

Em resposta a uma série de protestos e a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim como compreendendo os múltiplos prejuízos decorrentes da atividade corruptiva e os problemas estruturais envolvidos, já em 2013, o legislador ordinário editou a Lei nº 12.846, conhecida como “Lei Anticorrupção” ou “Lei da Empresa Limpa”, que passou a coibir a prática de atos lesivos à Administração Pública com o estabelecimento da responsabilidade objetiva (isto é, independentemente de culpa) das pessoas jurídicas pela prática de corrupção, com a previsão de sanções que vão desde a aplicação de multa na esfera administrativa e a publicização da decisão condenatória à dissolução compulsória da pessoa jurídica. Ainda, a nova lei incentivou uma verdadeira mudança cultural, disposto que a existência de um programa de integridade e a cooperação da pessoa jurídica com a apuração das infrações seriam critérios para a dosimetria das penas (art. 7º, incisos VII e VIII).

Neste sentido, um programa de integridade pode ser compreendido como um programa de compliance anticorrupção. Em outros termos, trata-se da criação, pela pessoa jurídica, de um sistema interno, que envolva ferramentas, processos e pessoas, com vistas a evitar, identificar e remediar a prática de atos lesivos à Administração Pública tipificados na Lei nº 12.846/13.[1]

Tempos depois, em mais um louvável avanço no combate à corrupção e em sintonia com a legislação nacional anticorrupção, alguns entes federativos passaram a exigir a implementação de programas de integridade pelos seus contratados. Não se trata de apenas incentivo à adoção deste sistema de controle – como fez a legislação federal de 2013 – mas de verdadeira obrigação contratual.

Pioneiramente, a Lei estadual nº 7.753, de 17 de outubro de 2017, do estado do Rio de Janeiro, em seu art. 1º, passou a estabelecer a “exigência do Programa de Integridade às empresas que celebrarem contrato, consórcio, convênio, concessão ou parceria público-privado com a administração pública direta, indireta e fundacional do Estado do Rio de Janeiro, cujos limites em valor sejam superiores ao da modalidade de licitação por concorrência (...) e o prazo do contrato seja igual ou superior a 180 (cento e oitenta) dias”.

Segundo a legislação, a pessoa jurídica terá o prazo de 180 (cento e oitenta) dias corridos para efetivar a implementação de seu programa de integridade, sob pena de multa diária (art. 6º) e impossibilidade de contratação com o ente federativo até sua regularização (art. 8º).

Semelhantemente, o artigo 1º da Lei distrital nº 6.112, de 02 de fevereiro deste ano, passou a prever a “obrigatoriedade de implementação do Programa de Integridade em todas as empresas que celebrem contrato, consórcio, convênio, concessão ou parceria público-privada com a Administração Pública do Distrito Federal, em todas as esferas de Poder, cujos limites de valor sejam iguais ou superiores aos da licitação na modalidade tomada de preço (...) e o prazo do contrato seja igual ou superior a 180 dias”.

O diploma também determina a aplicação de multa diária pelo descumprimento da obrigação (art. 8º), sendo este também fundamento para a rescisão motivada do contrato administrativo (art. 10).

Esta nova exigência contratual não é um movimento isolado. Trata-se, em verdade, de tendência de mercado, sobretudo após a edição do Estatuto das Empresas Estatais (Lei nº 13.303/16), que traz diversas normativas de governança e compliance a serem observadas pelas empresas públicas e sociedades de economia mista de todos os entes federados, e após a publicação do Decreto nº 9.203/17 que, em seu artigo 19, obriga aos órgãos, autarquias e fundações públicas federais providenciarem a instituição de programas de integridade, em irrefutável fomento a uma cultura de compliance público.[2]
Nesta conjuntura, válido registrar que, a exemplo das leis fluminense e distrital, a Portaria nº 877/18 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, também passou a exigir a instituição de programas de integridade pelos seus contratados, sob pena de renúncia ao direito subjetivo à prorrogação contratual (arts. 1º e 7º).

As empresas que possuem relacionamento com o Poder Público devem estar preparadas para cumprir todas as exigências legais para assinatura dos contratos administrativos – dentre as quais agora se inserem os programas de integridade.

A nova obrigação revela-se muito acertada. Programas de compliance efetivos, por envolveram principalmente pessoas – além de processos e ferramentas, têm a capacidade de alterar a cultura dos stakeholders e, por via de consequência, suas condutas. Sendo a corrupção um problema estrutural e endêmico, a implementação de programas de compliance anticorrupção efetivos parece ser o antídoto adequado para alterar a realidade nacional.






Rafael Sgoda Tomazeti - Advogado associado à Amaral, Yazbek Advogados, responsável pelo núcleo de compliance. Graduado em Direito pelo UniBrasil - Centro Universitário Autônomo do Brasil, tendo sido laureado com o título de melhor aluno do Curso de Direito. Pós-graduando em Compliance e Integridade Corporativa pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Foi pesquisador pelo Mirante Constitucional/UniBrasil - Observatório de Direito Constitucional a partir da imprensa.



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