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sábado, 14 de junho de 2025

Por que a terapia assistida com psicodélicos pode ajudar os cuidadores a lidar com seus traumas com mais eficácia?

Médico pós-graduado em Neurologia, estuda os efeitos desse tipo de protocolo para o tratamento eficaz do TEPT, um dos transtornos mais comuns entre eles


No Brasil há cerca de 47,5 milhões de pessoas envolvidas em atividades de cuidados, sendo a maioria não remunerada, segundo dados da Pesquisa Nacional sobre Trabalho Doméstico e de Cuidados Remunerados, feita pelo Instituto de Pesquisas Aplicadas (IPEA). Elas desempenham funções de cuidado com idosos ou pessoas com alguma limitação física ou intelectual. Grande parte dessas pessoas — em sua maioria mulheres entre 40 e 60 anos — realiza esse trabalho sem qualquer remuneração, acumulando responsabilidades domésticas e, muitas vezes, profissionais — são familiares diretos, que enfrentam desafios como o esgotamento físico e emocional, dificuldades financeiras e a falta de suporte do sistema público de saúde.


De acordo com Lucas Cury, médico pós-graduado em Neurologia, os cuidadores lidam com uma rotina desgastante, o que acaba tornando-os negligentes com a própria saúde. “São longas horas dedicadas ao cuidado, sem descanso adequado, com uma forte concentração de responsabilidades, pressão constante de lidar com a doença e com as necessidades da pessoa cuidada, além da falta de contato social e negligência com a própria saúde. Tudo isso são gatilhos perigosos para o desenvolvimento de problemas como depressão, ansiedade e Transtornos de Estresse Pós-Traumático (TEPT)”.



Cuidar de quem cuida


Para o médico, os cuidadores representam uma população frequentemente invisibilizada, que também precisa ser amparada. “Ao colocarem as necessidades do outro sempre em primeiro plano, muitos acabam se esquecendo de si mesmos. Isso gera sentimentos de exaustão, tristeza e frustração. Há casos em que abriram mão da própria vida profissional, da rotina e dos vínculos sociais para se dedicarem integralmente a alguém — e fazem isso sozinhos, sem apoio familiar ou rede de suporte”, observa.


Cury relata que esse cenário é comum em sua prática clínica. “Atendo um paciente de 75 anos que costuma dizer que, desde os 30, não vive — apenas sobrevive. Ele cuida da filha com paralisia cerebral, já adulta, e agora lida com o diagnóstico recente de câncer dela. São pessoas que carregam o mundo nas costas e, muitas vezes, desmoronam silenciosamente. Precisam ser acolhidas antes de perderem as próprias forças.”


Na avaliação dele, o cuidado com quem cuida é também uma forma de garantir qualidade no atendimento prestado. “Se o cuidador adoece emocionalmente, isso afeta diretamente o bem-estar da pessoa assistida. Cuidar do cuidador é uma etapa essencial da cadeia de cuidado”, conclui.



Medicamentos e novas terapias: o alívio possível para quem cuida


Diante do desgaste emocional e psicológico extremo, muitos cuidadores que enfrentam transtornos como depressão ou TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) recorrem a medicamentos controlados para conseguir manter a rotina. São remédios que atenuam a dor emocional e ajudam a seguir em frente — ainda que, muitas vezes, não tratem a origem do sofrimento. “Eles anestesiam o sentir, mas não oferecem solução real para o trauma”, observa o médico e pesquisador que há anos estuda alternativas terapêuticas com uso de psicodélicos.


Segundo ele, substâncias como MDMA (3,4-metilenodioximetanfetamina) e psilocibina têm se mostrado eficazes, quando associadas à psicoterapia no tratamento de quadros graves e persistentes. “A depressão é como um labirinto com o chão cheio de espinhos. Os medicamentos tradicionais amenizam as dores, enquanto os psicodélicos possibilitam que o paciente encontre a saída. É uma abordagem diferente que traz importantes avanços no tratamento”, afirma.


Embora ainda cercadas de polêmicas, as terapias assistidas com psicodélicos vêm ganhando respaldo na comunidade científica. Estudos demonstram benefícios concretos, especialmente em casos resistentes aos tratamentos convencionais. Mas, como alerta Cury, essas substâncias não são “curas mágicas”. “O MDMA, por exemplo, atua quebrando padrões neurais repetitivos — verdadeiras amarras que mantêm o paciente preso a ciclos de dor emocional. Ele permite uma espécie de reciclagem da rede cerebral, criando espaço para um novo olhar sobre o trauma.”




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