COVID-19 na Gravidez Aumenta Risco de Autismo e Outros Transtornos Neurodesenvolvimentais em Crianças, Aponta Estudo
Pesquisa com mais de 18 mil
nascimentos revela que filhos de mães infectadas durante a gestação têm 2,7% de
diagnóstico de autismo, comparado a 1,1% em crianças não expostas
Crianças
podem ter maior probabilidade de serem diagnosticadas com autismo e outros
transtornos neurodesenvolvimentais se suas mães tiveram COVID-19 durante a
gravidez, segundo estudo publicado em 30/10/2025 na
renomada revista científica Obstetrics & Gynecology.
A pesquisa,
conduzida por investigadores do Massachusetts General Hospital, analisou mais
de 18 mil nascimentos ocorridos no sistema de saúde Mass General Brigham entre
março de 2020 e maio de 2021.
Os
resultados são estatisticamente significativos: crianças nascidas de mães que
contraíram COVID-19 durante a gestação apresentaram mais de 16% de diagnósticos
neurodesenvolvimentais até os 3 anos de idade, comparado a menos de 10% entre
aquelas cujas mães não tiveram a infecção durante a gravidez – representando um
risco 1,3 vezes maior após ajustes para outros fatores de risco.
"Estes
achados destacam que a COVID-19, como muitas outras infecções na gravidez, pode
representar riscos não apenas para a mãe, mas para o desenvolvimento cerebral
fetal", afirma a Dra. Andrea Edlow, especialista em Medicina Materno-Fetal
do Mass General Brigham e autora sênior do estudo.
Completa:
"Eles também reforçam a importância de tentar prevenir a infecção por
COVID-19 na gravidez e são particularmente relevantes quando a confiança
pública nas vacinas – incluindo a vacina contra COVID-19 – está sendo
corroída".
Autismo em Foco: Números Dobram em Crianças
Expostas
Entre os
diagnósticos mais comuns identificados no estudo estão transtornos no
desenvolvimento da fala e função motora, além do autismo. Cerca de 2,7% das
crianças nascidas de mães que tiveram COVID-19 durante a gravidez foram
diagnosticadas com autismo, comparado a aproximadamente 1,1% das demais
crianças – mais que o dobro da taxa.
Segundo o
Dr. Matheus Trilico, neurologista referência em Transtorno do Espectro Autista
(TEA) e Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) em adultos,
estes dados são particularmente relevantes no contexto atual, onde observamos
um aumento global nas taxas de diagnóstico de autismo.
“Nos Estados
Unidos, 1 em cada 31 crianças foi diagnosticada com autismo aos 8 anos em 2022,
segundo o CDC, um aumento em relação a 1 em 36 crianças em 2020. Este estudo
nos ajuda a compreender um dos possíveis fatores contribuintes para essa
tendência", ressalta Dr Trilico.
Meninos e Terceiro Trimestre: Grupos de Maior
Vulnerabilidade
As
diferenças nos riscos foram mais pronunciadas entre meninos e nos casos em que
a mãe teve infecção por COVID-19 durante o terceiro trimestre da gestação.
Estudos anteriores já sugeriram que cérebros fetais masculinos são mais
suscetíveis às respostas imunes maternas, e o terceiro trimestre representa uma
"janela crítica para o desenvolvimento cerebral".
"Quando
analisamos especificamente as infecções ocorridas no terceiro trimestre, o
risco ajustado aumenta para 36%. E há um dado particularmente importante:
meninos expostos ao vírus no terceiro trimestre da gestação apresentaram risco
43% maior de desenvolver alterações neurodesenvolvimentais. Como neurologista
com foco nessa área, compreendo que tal vulnerabilidade diferenciada por sexo
tem implicações importantes para protocolos de triagem e acompanhamento",
explica o neurologista.
Plausibilidade Biológica e Mecanismos de Ação
As novas
descobertas são "particularmente notáveis à luz de sua plausibilidade
biológica", escreveram os pesquisadores. O estudo se baseia em pesquisas
anteriores que identificaram potenciais vias pelas quais uma infecção materna
por COVID-19 pode afetar o cérebro fetal em desenvolvimento, mesmo sem
transmissão direta do vírus.
Outras
infecções maternas durante a gravidez já foram associadas ao risco de uma série
de doenças neurodesenvolvimentais na infância, e estudos em animais
demonstraram que a ativação imune durante a gestação interrompe o
desenvolvimento cerebral fetal normal e o comportamento da prole.
"A
ciência nos mostra que não é necessariamente o vírus em si que afeta o bebê,
mas a resposta imunológica materna à infecção. Esse conhecimento é fundamental
porque nos permite desenvolver estratégias preventivas e terapêuticas mais
direcionadas", contextualiza Dr. Matheus Trilico.
População Não Vacinada: Uma Janela Única de
Pesquisa
O período do
estudo – no início da pandemia, antes das vacinas estarem amplamente disponíveis
– permitiu aos pesquisadores "isolar a associação entre a infecção por
SARS-CoV-2 e o neurodesenvolvimento da prole em uma população não
vacinada". Cerca de 93% das mães incluídas na avaliação não haviam
recebido nenhuma dose da vacina contra COVID-19.
Políticas
rigorosas de controle de infecção naquele período também ajudaram a reduzir o
potencial de casos de COVID-19 não relatados ou não detectados, destacaram os
pesquisadores.
A Visão de Quem Atende Adultos Neurodiversos
"Como
neurologista que trabalha diariamente com adultos autistas e com TDAH, eu vejo
as consequências do diagnóstico tardio. Muitos dos meus pacientes relatam que
suas vidas teriam sido significativamente diferentes se tivessem recebido
suporte adequado na infância. Este estudo nos dá uma oportunidade de estar mais
atentos ao desenvolvimento de crianças que foram expostas ao vírus durante a
gestação", reflete Dr. Matheus Trilico.
O Dr.
Trilico compartilha sua experiência clínica: "Tenho atendido mães
preocupadas com o desenvolvimento de filhos nascidos durante a pandemia, cujas
gestações foram marcadas pela infecção por COVID-19. Com este estudo, agora
temos fundamentação científica robusta para justificar avaliações mais
aprofundadas e intervenções precoces quando identificamos sinais de alerta. A
detecção precoce faz toda a diferença nos desfechos a longo prazo",
completa ele.
Conscientização e Advocacia: O Papel dos Pais
"A
conscientização dos pais sobre o potencial de desfechos neurodesenvolvimentais
adversos após COVID-19 na gravidez é fundamental", afirma a Dra. Lydia
Shook, especialista em Medicina Materno-Fetal do Massachusetts General Hospital
e autora principal do estudo. Completa: "Ao compreenderem os riscos, os
pais podem defender adequadamente que seus filhos tenham avaliação e suporte
apropriados".
O
neurologista, Dr. Matheus Trilico, traz uma ponderação importante: "Embora
a redução do risco seja importante, o risco geral de desfechos
neurodesenvolvimentais adversos em crianças expostas provavelmente permanece
baixo", reflete mais uma vez.
De acordo
com Dr. Matheus é fundamental que as gestantes e famílias compreendam que estes
dados estabelecem uma associação estatística importante, mas não significam
determinismo. Cada criança é única, e o acompanhamento individualizado é essencial.
O conhecimento gerado por esta pesquisa nos permite estar mais atentos e
preparados para oferecer suporte adequado quando necessário, sempre respeitando
a singularidade de cada desenvolvimento.
Relevância para o Contexto Brasileiro
Para o
neurologista, no Brasil, onde milhares de gestantes foram afetadas pela
COVID-19 durante a pandemia, este estudo ganha relevância particular.
“Precisamos fortalecer nossas redes de triagem e diagnóstico precoce. O acesso
a avaliações especializadas ainda é limitado em muitas regiões do país, e estes
dados reforçam a necessidade de políticas públicas que garantam acompanhamento
adequado para crianças que foram expostas ao vírus durante a gestação",
observa Dr. Trilico.
Implicações para Políticas de Saúde Pública
Os achados
ganham relevância adicional no contexto atual de debates sobre saúde pública e
vacinação. Como médico, que atende pacientes do Brasil e do exterior, Dr.
Trilico observa também: "Este estudo fornece evidências científicas que
reforçam a importância da prevenção de infecções durante a gravidez. Os dados
demonstram claramente que proteger gestantes da COVID-19 não é apenas uma
questão de saúde materna, mas também de saúde infantil a longo prazo".
Próximos Passos: Monitoramento e Intervenção
Precoce
Os
pesquisadores enfatizam que os achados destacam a importância do monitoramento
neurodesenvolvmental de longo prazo para crianças expostas ao SARS-CoV-2
durante a gestação, particularmente aquelas expostas no terceiro trimestre e do
sexo masculino.
"Como neurologista que trabalha diariamente com adultos neurodiversos, vejo a importância crítica da identificação e intervenção precoces. Este estudo nos fornece a base científica para implementar protocolos de acompanhamento mais estruturados e atentos para essa população específica de crianças. A detecção precoce de alterações neurodesenvolvimentais permite intervenções terapêuticas mais eficazes e melhores desfechos ao longo da vida", ", conclui Dr. Matheus Trilico.
Dr. Matheus Luis Castelan Trilico - CRM 35805PR, RQE 24818. Médico pela Faculdade Estadual de Medicina de Marília (FAMEMA); Neurologista com residência médica pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC-UFPR); Mestre em Medicina Interna e Ciências da Saúde pelo HC-UFPR; Pós-graduação em Transtorno do Espectro Autista.
Mais artigos sobre TEA e TDAH em adultos podem ser vistos no portal do neurologista: https://blog.matheustriliconeurologia.com.br/
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