A cada ano, 420 mil pessoas morrem no mundo devido ao consumo de alimentos contaminados, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O dado alarmante escancara um problema muitas vezes invisível: quem realmente garante que os alimentos que chegam ao nosso prato são seguros?
No Brasil, os surtos de intoxicação alimentar são mais frequentes do que se imagina – e 35% deles acontecem dentro das próprias casas, de acordo com a Vigilância Epidemiológica de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar (DTHA), do Ministério da Saúde. Falta de higiene, armazenamento inadequado e consumo de produtos fora da temperatura segura estão entre as principais causas.
Nos estabelecimentos comerciais, o problema também persiste. Especialistas alertam que o controle inadequado de tempo e temperatura na manipulação de alimentos pode transformar um prato aparentemente fresco em um verdadeiro risco para a saúde pública.
"O perigo nem
sempre é visível. Muitas pessoas acreditam que, se o alimento está com boa
aparência e cheiro, ele está seguro para consumo. Mas vírus, bactérias e fungos
podem estar presentes mesmo sem sinais de deterioração", explica Paula Eloize, especialista em Inspeção de
Alimentos e mestre em Segurança dos Alimentos pela Universidade
de Lisboa.
O perigo mora na cozinha
Muita gente acredita que intoxicação alimentar é um problema exclusivo de restaurantes e indústrias, mas a verdade é que a falta de cuidados na preparação e conservação dos alimentos dentro de casa também coloca a saúde em risco.
"A geladeira não é cofre. Um alimento que foi mal armazenado ou passou muito tempo na temperatura errada pode se tornar um terreno fértil para a multiplicação de bactérias", alerta Paula.
Entre os erros mais comuns que podem levar à contaminação alimentar dentro de casa, especialistas apontam:
·
Descongelar carnes em temperatura
ambiente: O correto é fazer isso na geladeira ou no micro-ondas,
nunca sobre a pia.
·
Armazenar alimentos crus junto com
cozidos: Isso aumenta o risco de contaminação cruzada.
·
Consumir ovos crus ou mal cozidos: Pode levar à
contaminação por Salmonella, uma das principais
causadoras de intoxicações graves.
·
Reaproveitar alimentos sem o devido
reaquecimento: Comida que ficou fora da geladeira por muito tempo precisa ser
descartada.
·
Beber água não filtrada ou sem tratamento
adequado: A água contaminada pode ser um dos
principais vetores de doenças.
Além dos cuidados
na manipulação e armazenamento, o controle da
temperatura dos alimentos também é essencial para evitar a
proliferação de microrganismos:
Acima
de 60°C: para manter alimentos quentes expostos
ao consumo.
Abaixo
de 5°C: para alimentos prontos frios ou
armazenados na geladeira.
Entre
2°C e 8°C: temperatura ideal para alimentos
perecíveis em preparo.
“O intervalo entre 5°C e 60°C é o mais perigoso para a proliferação de bactérias. Ou seja, quanto mais tempo um alimento permanece nessa faixa, maior o risco de contaminação”, explica a especialista.
Responsabilidade técnica: o que a indústria e os restaurantes precisam fazer?
Se dentro de casa
o risco já é alto, em cozinhas industriais e grandes redes de alimentação a
responsabilidade deve ser ainda maior. Estabelecimentos precisam seguir normas
rígidas para garantir que o consumidor não esteja ingerindo um alimento
contaminado.
"A
segurança dos alimentos não é apenas uma questão de boas práticas, mas de
compromisso com a vida do consumidor. Restaurantes e indústrias precisam
investir em controle de qualidade, treinamento e fiscalização para evitar
surtos de intoxicação alimentar",
reforça Paula.
Entre as medidas
obrigatórias estão a implementação do sistema APPCC (Análise de Perigos
e Pontos Críticos de Controle) para monitoramento dos
processos, o treinamento contínuo de funcionários sobre manipulação
segura de alimentos, o armazenamento adequado para evitar
contaminação cruzada, o controle rigoroso de fornecedores
para garantir a procedência dos insumos e, claro, o
monitoramento da temperatura dos alimentos ao longo de toda a
cadeia produtiva.
“Além disso, a transparência
com o consumidor é um fator cada vez mais valorizado no
mercado. Empresas que demonstram compromisso com a segurança alimentar e seguem
protocolos rigorosos tendem a conquistar mais confiança e
fidelidade do público”, conta.
O que o futuro reserva para a segurança alimentar?
Com o avanço das
tecnologias, a tendência é que o controle da qualidade dos alimentos seja cada vez
mais rigoroso. Métodos inovadores como rastreabilidade
digital, inspeção com apoio da inteligência artificial e sensores térmicos
já estão sendo implementados para garantir maior transparência e
segurança para os consumidores.
Ainda assim, a especialista reforça que a informação continua sendo a melhor ferramenta para evitar problemas. Quanto mais consumidores, empresas e profissionais da área estiverem atentos à segurança dos alimentos, menos casos de intoxicação alimentar serão registrados.
“Afinal, o que
está em jogo não é apenas a qualidade do alimento – é a saúde e
a vida de milhões de pessoas”, alerta Paula.
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