Não há batatinha amarrada na fronte que resolva. Calmante que
acalme. Protetor de ouvido que dê conta. Se a pessoa anda armada é um perigo
sair dando tiros. Se achar uma granada o perigo será destravar a rolha e mandar
bem no alvo, virando um terrorista urbano. Morar em São Paulo está ficando a
cada dia mais impraticável. E não é só o barulho.
Você vai ficando louco, começa a pensar em
tomar as medidas mais drásticas, tem os pensamentos mais subversivos,
terríveis, punks. Os instintos mais primitivos. O barulho vai corroendo as
entranhas, tomando conta. Os obstáculos e situações estressantes se acumulam.
Os problemas da cidade e a falta de controle e fiscalização chegaram a um nível
insuportável e que afeta gravemente a nossa saúde. Que será preciso para que
providências reais sejam tomadas para melhorar nossa qualidade de vida?
No momento, me perdoem, tenho dúvidas, inclusive, se a cidade
está sendo habitada apenas por bananas; se ao meu redor só existem pessoas
bananas, medrosas, já tão acostumadas a ser massacradas que ficam sem reação,
não se defendem mais de nada, inertes, palermas. Não reclamam, esperam
que alguém o
faça. A vida real está passando ao largo nesses tempos digitais.
Escrevo nesse momento com uma dor de cabeça daquelas, daquelas
que irradiam, sabe? Se fosse uma sessão de tortura creio que entregaria até a
minha mãe, confessaria coisas inconfessáveis, os segredos mais recônditos,
desde que me prometessem o que venho considerando uma dádiva: o silêncio.
Estou, e claro não sou só eu, mas um monte de gente que mora
aqui por perto, submetida a – escutem, por favor, tenham pena de mim – horas a
fio, diárias, de uma britadeira em uma construção próxima. No meu prédio, mais
próximo ainda, soma-se uma obra que já dura quase um ano e que alterna serra
elétrica, bate-estacas e outros sons que vão se infiltrando na mente. Isso
junto às sirenes de ambulâncias, buzinadas frenéticas, rota de helicópteros e
aviões, latidos e ganidos de pobres cachorrinhos deixados sós o dia inteiro,
criancinhas birrentas, funkeiros motorizados, entre outros sons, até como
os vindos de revoadas de periquitos verdes chalreando.
Aí você sai de casa. Fora a vontade de usar colete à prova de
bala, carregar arco e flecha, gás de pimenta e/ou outros apetrechos básicos
para se defender, encontra a buraqueira nas ruas e calçadas. É tibum na certa.
A falta de educação das pessoas que avançam como se você não existisse. Os
motoqueiros que inventaram uma via imaginária entre os carros e querem que você
encolha seu veículo como o daquela cena famosa do Gordo e o Magro. O carro
fininho passando no cruzamento.
(Confesso: outro dia pensei seriamente em comprar uma máquina de
choque elétrico para usar nesses casos. A ideia seria colocar a mão pra fora
rapidinho no momento que um desses estivesse te apertando com aquela buzininha
infernal. Bzzz,
Bzzzz,
fritado igual faz aquela raquete de pegar mosquito.)
Mas quero ainda focar em mais um detalhe: notaram como está (ou
melhor, não está) a sinalização das vias? Quando há placas estão sujas, tortas,
viradas, ilegíveis, cobertas, erradas. Tenta procurar um endereço. Um número na
rua. Uma faixa pintada direito no chão. Não há Waze que resolva. Ao contrário, como
aconteceu comigo esses dias, essezinho aí me fez andar inacreditáveis 35
quilômetros errados até um endereço que só achei quando o desliguei – um dos
maiores alívios que senti nos últimos tempos. Até porque quem disse que ele
funciona direito direto? Você está lá, seguindo, por exemplo, na frente de um
viaduto que não sabe se é para pegar. E o que acontece? Zona morta, apagada,
cinzenta, sem GPS, sem sinal, sumiu aquela vozinha para te orientar. Já era.
Ah, vá! Já aconteceu com você também, tudo isso, não é?
Marli Gonçalves -
jornalista – Para que me entendam melhor, pelo menos uma
parte do problema, gravei. Ouça. Quem sobrevive a isso, durante dias, o dia inteiro?
https://soundcloud.com/marli-gon-alves/sets/barulhos-infernais
SP, insuportável, especialmente em fim de um ano como este aqui.
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