Richard Louv, em seu livro ‘A Última Criança na
Natureza’, utiliza o termo "transtorno de déficit de natureza" para
definir um fenômeno que estamos cientes há um bom tempo: nosso distanciamento
da natureza. E não há motivos para discordar. Por um tempo pensei que fosse o
avanço da tecnologia, com toda a sedução e atrativos que fornece a baixo custo
e pouco esforço, o responsável por isso. Também pensei que a grande culpada
fosse a mídia, divulgando paraísos naturais de difícil acesso para a maior
parcela da população.
Porém, se pensarmos profundamente, os responsáveis somos
nós mesmos.
Como jornalista, Louv sabe a força que as palavras
bem colocadas têm. No início, muitas pessoas falaram do assunto nos Estados
Unidos, concordando ou criticando, de modo que se expandiu para outros países.
O objetivo de disseminar o termo “transtorno de déficit de natureza” foi
alcançado, pois ampliou-se uma discussão que antes estava restrita a
poucas pessoas.
Um dos primeiros fatores a serem analisados a
respeito dessa questão é se existe a possibilidade do contato com a natureza,
seja apreciando o céu em meio à cidade, fazendo uma trilha em um parque ou
mergulhando em uma cachoeira. Se isso tudo está disponível e a pessoa não busca
maior proximidade é porque ela tem desinteresse ou não aprendeu o quanto o
contato com o ambiente natural pode ser prazeroso para sua saúde física, mental
e espiritual.
Por outro lado, também há o medo – de ser picada e
mordida por animais ou de ser roubada, por falta de segurança em lugares mais
ermos. E, atualmente, pode-se dizer que o medo é o maior responsável pelo afastamento
das pessoas da natureza.
Além disso, no Brasil, o planejamento urbano carece
de espaços para a recreação familiar em contato com a natureza. Ainda há
poucas praças e parques disponíveis para o uso pela população, bem como hortas
e jardins comunitários. E o que pode ser feito para mudar isso? Os governos
deveriam dedicar um pouco mais de atenção e recursos financeiros para a criação
de espaços de uso comum onde a natureza esteja disponível.
Isso vai acontecer quando alguém mostrar a economia
que os governantes podem ter evitando ausências do trabalho, pagamento de
tratamentos, remédios e internações por falta de contato com o ambiente
natural. As escolas também podem, aos poucos, retornar algumas aulas com
atividades físicas nas quais as crianças possam ser expostas ao sol. Já há
escolas nas quais essas atividades ao ar livre são feitas todos os dias e
contribuem para o nível de vitamina D das crianças.
Outro caminho é usar com mais frequência os locais
públicos que são adequados para desenvolver atividades ao ar livre. Usando a
tecnologia a favor, é possível buscar áreas com vegetação próximas as nossas
residências ou trabalho para caminhar, por exemplo. Se o local não for seguro,
os vizinhos podem ajudar a exigir ações para melhorar a segurança. As próximas
férias também podem ser escolhidas não com base no hotel mais confortável, mas
sim onde a natureza esteja presente.
Pensando nisso, a Organização das Nações Unidas
(ONU) declarou 2017 como o Ano Internacional do Turismo Sustentável para o
Desenvolvimento. A intenção é contribuir com o avanço do setor do turismo,
baseado nos três pilares da sustentabilidade (econômica, social e ambiental), e
valorizar as riquezas naturais de cada país. É um incentivo para a aproximação
com a natureza durante o ano e de levar os benefícios para toda a vida.
Em nosso dia-a-dia, o principal é não sucumbir à
sedução da tecnologia que nos afasta cada vez mais de nossa essência humana.
Temos que descobrir um caminho mais tentador que nos tire do trecho confortável
que vai da poltrona até a porta da geladeira e isso só depende de nós.
Teresa Magro - professora da Universidade de São
Paulo (USP) no Departamento de Ciências Florestais e membro da Rede de
Especialistas em Conservação da Natureza.
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