A presidente Dilma Rousseff sancionou nesta segunda-feira
(dia 9 de março) a Lei do Feminicídio – uma importante vitória pela causa
feminina. Isto porque a recém aprovada "Lei do Feminicídio" inclui
a morte da mulher por um homem (geralmente parceiros ou ex parceiros), em
um contexto de conflito de gênero, no rol dos crimes hediondos e como
qualificadora do homicídio.
Desde a tramitação do
projeto que deu origem à nova lei, levantam-se questionamentos a respeito da
necessidade de tal previsão, bem como de sua eficácia. Homicídios motivados pelo
gênero da vítima não seriam sempre torpes e, portanto, qualificados e
hediondos? Qual a função de mais uma previsão?
Conquanto tais
questionamentos sejam válidos, deve-se considerar que o feminicídio é um
fenômeno fruto de um machismo inerente, explícito ou implícito, que existe na
cultura brasileira, como pode ser visualizado em dados como o do “Relatório
Lilás”[1], no qual encontramos que mais da metade dos feminicídios ocorrem
motivadas pelo divórcio/separação – ou seja, por uma incapacidade do autor do
crime de conceber a vontade da mulher como autônoma e de respeitar sua decisão
de separação.
É importante, ainda,
verificar que o projeto teve por pano de fundo o fato de que, no Brasil, no
período de 2001 a 2011, estima-se que ocorreram mais de 50 mil feminicídios, o
que equivale a, aproximadamente, 5 mil mortes por ano[2].
Houve, ainda, estudo do IPEA[3],
que encontrou concordância de 82% dos entrevistados para a afirmação “em briga
de marido e mulher não se mete a colher” – informação alarmante, levando-se em
consideração o dado acima apontado de que mais da metade dos femicídios é
cometido pelo parceiro ou ex parceiro da mulher, bem como pela predominância da
violência no ambiente doméstico.
Se a realidade do
problema é indiscutível, existe mérito da lei como solução? A resposta parece
ser positiva, ainda que não deva ser vista como uma tábua de salvação para a
questão da violência de gênero no Brasil.
Esta nova previsão pode
cumprir alguns papéis importantes, posto que sua mera existência forçará o
julgador/jurado a pensar sobre o tema durante a análise do delito, a considerar
a hipótese, ou seja, fato que poderia passar desapercebido passa a ser objeto
de foco específico.
De forma não menos
importante, a previsão auxilia na formação da estatística criminal, o que é a
base para pesquisas que visam à criação de políticas públicas e análises
criminológicas.
Finalmente, a lei serve
a um caráter simbólico e pedagógico, faces dos princípios de prevenção geral
positiva e negativa, que não podem ser esquecidos, já que inerentes ao Direito
Penal. A existência da norma não inibe todos os crimes, mas passa importante
mensagem à sociedade de não aceitação de determinada conduta.
Se tais funções serão
alcançadas, só o tempo dirá. O momento presente é de comemoração – sem,
contudo, cessarem as lutas diárias contra a violência sistêmica a que a mulher
é submetida.
Maria Luiza Gorga - Mestranda em Direito Penal pela
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e advogada criminal do
escritório Costa, Coelho Araújo e Zaclis Advogados
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