Tragédias permeiam a existência humana, tão certo
quanto o fato de nascermos e morrermos. E atualmente, como nunca antes
experenciado, temos acesso de forma quase imediata e infinitamente
reproduzíveis às notícias sobre as tragédias, em diferentes fontes midiáticas,
além de as revivermos nas conversas (pessoalmente ou digitalmente), tomando
conta de nosso interesse.
Mas por que alimentamos este tipo de curiosidade
sobre o que demonstra violência, desastres, mortes? Parece que ficamos
inebriados por um impulso em buscar mais informações, até sobre os detalhes do
ocorrido, numa tendência mórbida, para se aproximar do tema morte. E esta seria
uma das possibilidades de vivenciar, sem necessariamente estar diretamente
envolvido. A finitude da vida é um tema para o qual somos pouco preparados,
muitas vezes enfrentando-o com a negação.
E a tragédia presentifica essa noção de fim de
vida, gerando uma identificação de que poderia ter acontecido conosco - e vamos
em busca de mais informações para nos sentirmos preparados, mantendo certo
controle sobre a situação. Esta ilusão nos causa até um conforto. O
noticiamento sobre as tragédias nos faz enfrentar a efemeridade de nossa
existência. Portanto, conhecer o máximo sobre o que pode acontecer dá a
sensação de preparo, até como forma de dessensibilização, no sentido de não
causar mais tanto temor, podendo ter um efeito de descarga emocional pela
comoção que a notícia possa ter causado.
Assim, ficar insistentemente revendo a cena, ou
lendo sobre ela, faz com que se possa compreender o que a vida é, tendo uma
função catártica. Ou seja, no caso, manter interesse, por meio de leituras,
vídeos, de forma insistente sobre as tragédias, pode ter um efeito de catarse,
uma espécie de etapa para elaboração sobre a ideia de morte, por exemplo.
Assim, essas pessoas se sentem aliviadas, até no sentido de buscar compreender,
emocionalmente, o que seja a finitude da vida. É como descarregar as emoções
que incomodam e não têm muita explicação através de uma curiosidade mórbida -
ouvir, falar, ler, informar-se sobre os detalhes da tragédia.
Também há que se considerar a descontextualização e
a impessoalidade aplicada a algumas notícias de tragédias, que dão uma sensação
de alívio ao espectador, gerando segurança ao polarizar os acontecimentos entre
heróis e vilões, até no sentido de procurar julgamentos justos para estes
(localizando os responsáveis, o que isenta o espectador também).
Desta forma, ao se interessar por notícias sobre
tragédias, algumas pessoas se satisfariam, no sentido de vivenciarem o
incompreensível, ou aquilo que causa terror, por meio do que acontece a outros,
em um processo de identificação (“e se fosse comigo?”), até empaticamente, ou
tomando distância (“ainda bem que não é comigo!”) e, depois, ficando até
anestesiadas ao que acontece ao outro.
Cláudia Cibele Bitdinger
Cobalchini - psicóloga e Mestre em Psicologia da Infância e Adolescência pela
UFPR. É professora do curso de Psicologia da Universidade Positivo (UP) e
supervisora em práticas profissionais em Psicologia Comunitária.
Nenhum comentário:
Postar um comentário