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segunda-feira, 25 de setembro de 2017

A vida digital serve como prova jurídica?



Divórcio e pensão podem ser baseados nas redes sociais


Apagar a vida virtual do pai falecido para não haver provas da existência de um relacionamento pode mudar um testamento? “Não. A Lei é clara ao dizer que 50% do patrimônio devem ser repassados aos herdeiros necessários, ou seja, filhos. Mas os outros 50% podem ser repartidos como quiser”, explica Dra. Ivone Zeger, advogada especialista em Direito de Família, Herança (sucessão) e Direito LGBTI.

A senha de quem faleceu pode ser pleiteada aos provedores pelos herdeiros por meio de alvará judicial. Embora não haja legislação específica, de modo geral, os juízes entendem que os herdeiros têm legitimidade para pleitear esse acesso. “Mas isso não apaga uma história de união estável, por exemplo, que deve ser comprovada com documentos e testemunhas. Diálogos no WhatsApp também podem ser usados com este fim”, pontua a advogada.

E como os juízes entendem outros casos?

Pensão alimentícia: quando, por exemplo, um pai alega que não tem condições de pagar pensão ao filho ou esposa, certamente a parte reclamante apresentará ao juiz os dados obtidos nas redes sociais como provas contrárias. “Há casos em que o pai diz não ter condições, mas a rede social está repleta de fotos em viagens, passeios, ou seja, ele mesmo documenta na internet a vida que não condiz com a que ele alega ter” comenta a advogada.

Divórcio - Mensagens SMS e e-mails não configuram exatamente provas de adultério, mas podem levar à comprovação da infidelidade conjugal mediante perícia. “O Código Civil diz que o respeito e a consideração, mútuos, são parte das obrigações dos cônjuges durante o casamento. O juiz então pode, sim, considerar as provas digitais uma violação desse dever”, comenta Dra. Ivone Zeger, advogada especialista em Direito de Família, Herança (sucessão) e Direito LGBTI.




Dra. Ivone Zeger - Advogada, Graduada pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie/SP. É pós-graduada em Direito Constitucional na Universidade São Francisco/SP e em Administração de Empresas na Fundação Getúlio Vargas/SP. Foi juíza do TIT (Tribunal de Impostos e Taxas do Estado do Estado de São Paulo). É membro efetivo da Comissão de Direito de Família da OAB, da Comissão de Direito de Família e Sucessões do IASP (Instituto dos Advogados de São Paulo) e membro do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família). Especialista em Direito de Família e Sucessão (herança), há mais de 25 anos lida com questões relacionadas a essas áreas tendo publicado três importantes livros: “Família - Perguntas e Respostas”, “Herança - Perguntas e Respostas” e “Direito LGBTI - Perguntas e Respostas”, todos da Mescla Editorial.




Trabalho intermitente: novo conceito de vínculo de emprego




            A Lei nº 13.467/2017 tem sido objeto de análise em todos os impactos que poderá produzir nas relações trabalhistas, individuais e coletivas e no processo do trabalho. Dentre as inovações, destaca-se a regulamentação o modelo do trabalho intermitente no artigo 452-A, inserindo-o, com todas as peculiaridades que apresenta, na condição de trabalho sob vínculo de emprego, trazendo uma ampliação desse conceito e quebrando o exercício dos poderes disciplinar e diretivo do empregador.  A análise detida da lei pode surpreender e trazer novos enfrentamentos na discussão da relação de emprego.

            Quanto ao contrato de trabalho intermitente, dizem alguns que as empresas terão maior facilidade e flexibilidade na contratação de trabalhadores nesta modalidade e, outros dirão que o trabalho intermitente tenderá a reduzir o número de 14 milhões de desempregados. De fato, a lei incorporou a prática de trabalhos em “bicos” para dar a ela proteção trabalhista.

            Da forma como está, o contrato de trabalho intermitente é um contrato sem garantias e sem obrigações. Pela ausência de garantias ao trabalhador contratado, a lei permitirá o deslocamento de trabalhadores da estatística de desempregado para emprego intermitente, sem qualquer certeza de salário no mês porquanto condicionado à convocação pelo empregador. É o emprego sem compromisso de prover renda.

            Observe-se, também, que o contrato de trabalho intermitente se caracterizaria pela natureza do trabalho a ser executado e não porque os trabalhadores inseridos na relação de trabalho representem um grupo de trabalhadores intermitentes. É um trabalho que gera uma expectativa de ocorrência freqüente, mas não rotineira, muito embora ocorra nas atividades habituais do empregador.

            Deste modo, configurar-se-á no modelo da lei o trabalho que puder se submeter aos aspectos formais da lei: natureza de trabalho a ser prestado e convocação pelo empregador (“Art. 452-A § 1o  O empregador convocará, por qualquer meio de comunicação eficaz, para a prestação de serviços, informando qual será a jornada, com, pelo menos, três dias corridos de antecedência”.)

            A contratação de empregado para prestação de serviços de conteúdo intermitente também rompe com o paradigma de obrigações contratuais no âmbito do Direito do Trabalho.

            Em se tratando de contrato de trabalho, é usual que gere entre as partes obrigações e deveres recíprocos: do lado do empregador de dar trabalho e salário e, do outro lado, do empregado, de entregar um tempo para cumprir o trabalho e fazer jus ao salário. Portanto, o contrato de trabalho tem, dentre suas características, a obrigatoriedade de o empregador prover trabalho ao empregado contratado durante o período em que permanece à sua disposição. 

            No trabalho intermitente desaparecem as obrigações de prover o trabalho pelo empregador e, para o empregado, de permanecer à disposição.

            De verdade, o conceito de tempo à disposição desaparece como condição contratual obrigatória. A manifestação da vontade do empregado de que atenderá à convocação do empregador é que faz do compromisso contratual seu caráter obrigatório (Art. 452-A § 2o  Recebida a convocação, o empregado terá o prazo de um dia útil para responder ao chamado, presumindo-se, no silêncio, a recusa)

            É um contrato de trabalho condicionado ao interesse do empregado, exclusivamente. O empregado é dono do seu tempo e pode recusar a convocação do empregador (“Art. 452-A § 5o O período de inatividade não será considerado tempo à disposição do empregador, podendo o trabalhador prestar serviços a outros contratantes”).

            É um contrato de emprego sem salário. É um contrato que não gera obrigação ao empregador de prover trabalho. É um contrato em que o empregado pode recusar o trabalho oferecido sem gerar ato de insubordinação ou ato de indisciplina, conforme expressamente disposto no §3º, do art. 452-A (“A recusa da oferta não descaracteriza a subordinação para fins do contrato de trabalho intermitente”).

            A subordinação neste tipo de contrato somente ocorrerá se o empregado aceitar a convocação. A recusa é ato de exercício de liberdade do empregado.

            De novo a lei nos coloca diante de um rompimento de paradigma. O trabalho ocasional sempre levou como argumento de exclusão de vínculo de emprego, além da ausência do seu caráter habitual, a possibilidade de recusa pelo prestador de serviços. Todavia, a nova lei inaugura a inclusão da ausência de habitualidade e da manifestação contrária pelo prestador de serviços como elementos incapazes de excluir o vínculo de emprego.

            A subordinação jurídica sempre foi o aspecto mais relevante de sobrevivência do Direito do Trabalho na afirmação da proteção na relação de emprego e da relação de emprego. A subordinação permite ao empregador o exercício dos poderes disciplinar e diretivo, comandos típicos e decorrentes do próprio contrato de trabalho e valerá na relação de trabalho intermitente de forma condicionada à aceitação da convocatória do empregador.

            Há muito ainda que se estudar nesta relação de emprego sui generis em que há nítida inversão de controle do contrato e de sua vigência pelo empregado. Caberá às empresas a avaliação da conveniência de manter trabalhadores nesta condição e, quando se trata de organização empresarial, a possibilidade de recusa pelo empregado de executar o trabalho parece incompatível com a dinâmica das empresas.  Talvez este tipo de contrato, tão praticado em outros países, não atinja o desejo de redução na estatística dos desempregados.




Paulo Sergio João - advogado e professor de Direito Trabalhista da PUC-SP e FGV.





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