Estudo coordenado pelo Hospital Moinhos
de Vento aponta prevalência de infecções sexualmente transmissíveis e reforça
necessidade de ampliar testagem
Apesar dos avanços em diagnóstico e tratamento, infecções
sexualmente transmissíveis (ISTs) como HIV (vírus da imunodeficiência humana) e
sífilis seguem como importantes desafios de saúde pública no Brasil, pioneiro
no fornecimento gratuito de antirretrovirais pelo Sistema Único de Saúde (SUS),
o que ajudou a controlar a mortalidade causada por essas doenças por anos.
Dados recentes do Rio Grande do Sul mostram uma nova tendência de crescimento
dos casos, o que aponta para uma epidemia generalizada de HIV na região
metropolitana de Porto Alegre. O recorte de casos do Estado é um alerta não só
para os gaúchos, mas para todos os brasileiros.
Diferente dos dados baseados apenas em notificações obrigatórias,
o Estudo Atitude, conduzido pelo Hospital Moinhos de Vento em parceria
com o Ministério da Saúde e a Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do
Sul, buscou mapear a real prevalência de ISTs na população do estado, por meio
de um inquérito populacional. Foram testadas 8.006 pessoas, com confirmação de
81 casos de HIV, 558 de sífilis, 26 de hepatite B e 56 de hepatite C.
Os dados indicam uma epidemia generalizada de HIV na Região
Metropolitana de Porto Alegre, com prevalência estimada de 1,64%, superando o
limite de 1% que a Organização Mundial da Saúde define como critério para
considerar que a infecção deixou de ser restrita a grupos de risco e passou a
circular amplamente na população geral.
Em paralelo, dados da Divisão de Doenças de Condições Crônicas da
SES-RS apontam que, em 2023, a taxa de detecção de Aids no estado foi de 24,4
casos por 100 mil habitantes, uma redução de 43, 5% em relação a 2013. Desde
2014, a taxa vem caindo gradualmente, atingindo seu menor valor histórico. Apesar
disso, o RS subiu uma posição no ranking nacional, passando a ocupar o 5° lugar
entre os estados com maiores índices, em função de um leve aumento registrado
no último ano (+1,24%).
A sífilis apresenta um cenário ainda mais alarmante. A prevalência
estimada é de cerca de 7% da população brasileira, o que equivale a sete casos
em cada 100 pessoas. Apesar de curável com penicilina benzatina (Benzetacil),
em apenas três aplicações, muitos casos não são diagnosticados, nem tratados
adequadamente. Em gestantes, a sífilis é especialmente grave, podendo causar
sequelas irreversíveis e até a morte do bebê em decorrência da sífilis
congênita, uma das principais causas evitáveis de mortalidade neonatal no país.
Outro desafio é a fase silenciosa da doença, que pode se estender
por anos sem apresentar sintomas. “A primeira manifestação costuma ser uma
pequena ferida na genitália ou virilha, que desaparece sozinha e frequentemente
é confundida com lesões simples, como um pelo encravado. Sem tratamento, a
infecção evolui para estágios mais graves, como a sífilis terciária, com
potencial de afetar órgãos internos e o sistema nervoso”, comenta Eliana
Wendland, médica epidemiologista do Hospital Moinhos de Vento.
“Os achados do estudo Atitude reforçam que testar, tratar e
informar são os caminhos mais eficazes para conter a expansão das ISTs no
Brasil. Políticas públicas mais integradas e campanhas educativas contínuas
serão fundamentais para mudar esse cenário e proteger a saúde da população’,
complementa a Eliana.
Os dados oficiais do Ministério da Saúde também sinalizam a
gravidade do cenário. Segundo o Boletim Epidemiológico de Sífilis 2024,
entre 2010 e junho de 2024, foram registrados 1.538.525 casos de sífilis
adquirida no país. A taxa de detecção cresceu ao longo da série histórica,
exceto em 2020, quando caiu para 59,7 casos por 100 mil habitantes,
provavelmente devido à falta de testagem por causa da pandemia de Covid-19. A
partir de 2021, os números voltaram a subir, alcançando 113,8 casos por 100 mil
habitantes em 2023, a maior taxa já registrada.
Entre gestantes, a taxa de detecção também seguiu tendência de
alta. De 2005 a junho de 2024, foram 713.167 casos notificados, com taxa
nacional de 34 por mil nascidos vivos (NV) em 2023. A sífilis congênita, transmitida
da mãe para o bebê, teve 9,9 casos por mil NV em 2023, com um total de 3.554
óbitos acumulados desde 1998. O Rio Grande do Sul aparece entre os estados com
maior taxa de detecção da doença em gestantes, com 41,1 casos por 1.000 NV,
atrás apenas do Rio de Janeiro e Amapá.
O HIV também apresentou crescimento expressivo. De 2007 a junho de
2024, foram notificados 541.759 casos, com 70,7% dos registros entre homens. A
proporção entre os sexos aumentou de 14 homens para cada 10 mulheres infectadas
em 2007, para 27 em 2023. A taxa de detecção entre gestantes chegou a 3,3 casos
por mil nascidos vivos, com aumento de 33,2% na última década, conforme dados
do Boletim Epidemiológico HIV 2024, do Ministério da Saúde.
O HIV compromete progressivamente o sistema imunológico. Sem
tratamento, pode evoluir para a Aids, condição que torna o organismo vulnerável
a infecções oportunistas e tipos específicos de câncer. Muitas pessoas convivem
com o HIV sem apresentar sintomas por anos, o que reforça a necessidade de
testagem regular. Quando diagnosticado precocemente, o HIV pode ser controlado
com o uso contínuo de antirretrovirais, permitindo uma vida saudável e com
expectativa semelhante à da população em geral.
O principal desafio hoje é o diagnóstico. Muitas pessoas convivem com o vírus sem saber, o que mantém a cadeia de transmissão ativa. O estigma ainda é um obstáculo importante, dificultando o acesso à testagem e cuidados, especialmente entre os grupos mais vulneráveis.
Hospital Moinhos de Vento
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