No mês dos namorados, o debate sobre relações
afetivas dentro das empresas entra em cena e analisa o terreno onde o flerte
pode aproximar pessoas ou comprometer reputações, lideranças e até a carreira
Seja nas discussões do escritório sobre a temperatura do
ar-condicionado, na pausa para o café ou nas conversas do Happy Hour,
relações afetivas podem surgir e se consolidar entre colegas de trabalho.
Afinal, por quase toda semana, o tempo no trabalho é a maior fonte de interação
da maioria dos brasileiros. Mas e quando o interesse vai além do profissional,
existem limites para as relações? Elas podem prejudicar sua carreira? Patrícia
Suzuki, CHRO da Redarbor Brasil — detentora do Infojobs, traz a visão das
empresas sobre esse tema pouco falado fora dos corredores.
Dados da Sociedade para Gestão de Recursos Humanos (SHRM), dos
EUA, apontam que quase 80% dos trabalhadores já se apaixonaram por colegas de
trabalho, sendo que 80% namoraram colegas, 10% se envolveram com subordinados e
18% com superiores. "Os efeitos desses relacionamentos podem ser
positivos, desde que ambas as partes saibam lidar com isso sem que haja
insubordinação ou favoritismo, principalmente quando há hierarquia envolvida.
Mas o que pode ou não pode ser feito quando o assunto é flerte no
ambiente corporativo? “É claro que um relacionamento pode se iniciar em
qualquer lugar, mas a linha entre o aceitável e o inadequado no trabalho é
bastante tênue”, alerta a CHRO.
Compreender esses limites e as políticas da empresa onde trabalha
é a melhor forma de evitar problemas e manter sua reputação profissional.
Sobre essa perspectiva, Patrícia pondera: “Para que as linhas
profissionais e pessoais não sejam cruzadas de forma indevida, é essencial
entender como a empresa lida com esse tema. É comum que as organizações tenham
um regulamento interno sobre essas situações e o RH pode ajudar com essas
informações”.
E continua: “De forma geral, a maioria das empresas costuma ter em
seu código de conduta o direcionamento para que sejam reportados os casos de
relacionamentos entre os colaboradores. Essa prática se
torna importante tanto quando os envolvidos possuem hierarquias diferentes
dentro da companhia, quanto entre as lideranças e cargos de gestão, por
exemplo, para garantir que nenhum privilégio está sendo concedido”.
É importante estabelecer os limites que devem ser respeitados nas interações. “O que acontece fora do contexto de trabalho pode, em muitas situações, influenciar a dinâmica profissional. Por isso, a empresa precisa estar ciente desses relacionamentos e definir regras claras para preservar um ambiente profissional saudável”, pontua a executiva.
Juridicamente, quais são os cuidados?
No campo jurídico, o flerte entre colegas não é, por si só, um ato
ilegal. No entanto, ele se torna um problema sério quando evolui para abuso
moral ou sexual. O assédio sexual no trabalho é crime previsto no Código Penal
(art. 216-A), definido como “constranger alguém com o objetivo de obter
vantagem ou favorecimento sexual, valendo-se da posição de superior hierárquico
ou ascendência inerente ao exercício de cargo ou função.” Mesmo sem diferença
hierárquica significativa, uma investida repetida após recusa pode ser
caracterizada como invasiva e ameaçadora.
Além disso, em 2018, a Lei nº 13.718 alterou o Código Penal para
tipificar o crime de importunação sexual, definido como qualquer ato de cunho
sexual praticado sem consentimento. Nesse cenário, relações entre pessoas em
níveis profissionais diferentes exigem ainda mais cuidado — quando parte da
liderança toma a iniciativa, a assimetria de hierarquia pode distorcer o que
seria uma escolha genuína. É necessário analisar não só a intenção, mas o
contexto e uso do poder.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) impõe responsabilidades
ao empregador no que diz respeito à integridade do ambiente de trabalho. O
artigo 14 do Código Civil também reforça esse dever: cabe à empresa proteger
seus colaboradores de situações de assédio e agir diante de qualquer denúncia.
“O vínculo afetivo não impacta o ambiente de trabalho. Se o clima
de trabalho é saudável, deve haver espaço para lidar com esses relacionamentos
de forma respeitosa. O papel das empresas é garantir esse ambiente através de
políticas internas claras e canais seguros de denúncia.”, afirma Patrícia.
Prever penalidades claras em caso de violação do código de conduta
também é um caminho para casos mais extremos e como prevenção às situações.
Reputação, desempenho e implicações legais
A paquera no trabalho não é só um assunto pessoal, ela pode
influenciar todo um ambiente e a estrutura da Organização, refletindo em uma
questão de reputação, tanto da equipe quanto do profissional, dependendo da
situação. Um romance mal resolvido pode afetar a produtividade, motivação e, em
casos extremos, a saúde emocional do profissional.
Conforme a Sociedade para Gestão de Recursos Humanos (SHRM) dos
Estados Unidos, quase 20% dos trabalhadores que tiveram romance no trabalho
relatam impacto negativo na carreira, e 13% dizem que questões do trabalho
contribuíram para o término do relacionamento.
“É preciso agir com inteligência emocional, respeito às partes
envolvidas e transparência quanto a esse tema. Por isso é fundamental conhecer
e entender as políticas da empresa, como, inclusive, uma proteção para si
mesmo. O ambiente de trabalho deve ser, acima de tudo, profissional e
transparente”, conclui a CHRO.
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