Em atividades de risco elevado, o seguro
precisa ser entendido não como custo adicional, mas como instrumento de
responsabilidade e proteção à vida
A
ausência de regulação específica e de contratação de seguro tem exposto
turistas a riscos desnecessários em uma atividade notoriamente arriscada. Os
recentes acidentes fatais envolvendo balões de ar quente no Brasil escancararam
uma lacuna preocupante na normatização e fiscalização desse tipo de turismo de
aventura, que vem crescendo sem o devido respaldo jurídico e securitário.
Embora
a operação de balões esteja, em tese, subordinada às regras gerais da ANAC
(Agência Nacional de Aviação Civil) não há, até o momento, regulamentação clara
e rigorosa voltada à atividade comercial de passeios turísticos nem exigência
legal de contratação de seguros que protejam os passageiros transportados.
Trata-se de um vácuo normativo que desafia os princípios da proteção ao
consumidor e da responsabilidade objetiva nas atividades de risco.
Nesse
contexto, a contratação de seguros — especialmente os de responsabilidade civil
e de acidentes pessoais — pode exercer papel estruturante, funcionando como
instrumento indireto de indução a boas práticas de segurança. Isso porque a
própria lógica contratual do seguro impõe que o segurado adote medidas mínimas
de prevenção para evitar a perda do direito à cobertura, conforme previsto no
art. 768 do Código Civil.
Ao
assumir o risco, a seguradora passa a exigir comprovação de treinamento da equipe,
manutenção regular das aeronaves, cumprimento de protocolos operacionais e
medidas que atestem a diligência da empresa na condução da atividade. Com isso,
cria-se um círculo virtuoso: a apólice deixa de ser apenas um instrumento de
reparação e se transforma em ferramenta de governança e conformidade.
Nesse
cenário, é positiva a notícia de que projetos de lei em tramitação no Congresso
Nacional buscam regulamentar de forma específica a atividade de balonismo,
prevendo inclusive a obrigatoriedade de contratação de seguros. A iniciativa,
se concretizada, poderá contribuir para equalizar os riscos da atividade com a
proteção legal dos consumidores.
O
mercado segurador, por sua vez, já disponibiliza produtos voltados à atividade,
ainda que pouco disseminados. Dentre eles, destacam-se: (a) Seguro de
responsabilidade civil para balonismo, que cobre danos causados
a terceiros, incluindo os passageiros; (b) Seguro de acidentes pessoais,
com cobertura para morte acidental, invalidez permanente, despesas médicas e funerárias;
(c) Seguros coletivos para eventos e empresas de turismo de aventura,
com possibilidade de customização das coberturas; e (d) Seguro
aeronáutico (casco), voltado à proteção patrimonial do
equipamento.
O
desafio não é apenas jurídico, mas também cultural e operacional. O seguro
precisa ser entendido não como custo adicional, mas como instrumento de gestão
de risco, de responsabilidade e, sobretudo, de proteção à vida.
O
balonismo, como qualquer atividade de risco elevado, não pode continuar operando
à margem de parâmetros técnicos e jurídicos claros. Regras específicas,
exigências mínimas de segurança são medidas fundamentais para conferir
previsibilidade e segurança à atividade; a contratação de seguro pode ser parte
essencial dessa equação. Voar, sim — mas com responsabilidade.
Anne Wendler - sócia no escritório Rücker Curi – Advocacia e Consultoria Jurídica.
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