Depois de anos em
que especialistas e empresas apontavam o home office e o modelo híbrido como o
futuro do trabalho, a realidade atual mostra sinais claros de que a tendência
pode estar se invertendo: cada vez mais companhias anunciam retorno integral ao
escritório e reduzem os dias de trabalho remoto. Casos de demissões por
resistência ao retorno presencial — como os ocorridos no Nubank — e de
desligamentos por baixa produtividade de funcionários remotos, como no Itaú,
alimentam o debate: será que o presencial está voltando a ser a regra?
Nos últimos meses,
essa mudança tem chamado atenção e gerado questionamentos sobre produtividade,
engajamento e cultura corporativa. Ao mesmo tempo, histórias de colaboradores
que tentam “burlar” sistemas de monitoramento ou equilibrar múltiplas tarefas
em casa mostram que o modelo híbrido ainda enfrenta desafios estruturais e
comportamentais significativos.
Para Tatiana Gonçalves,
CEO da Moema Medicina do Trabalho, a explicação vai além de simples preferência
do empregador ou do colaborador. “Por mais que os modelos híbrido e remoto
sejam atrativos, tanto empresas quanto trabalhadores não estavam preparados
para uma mudança tão abrupta. O que vemos hoje é a consequência de falta de
planejamento, orientação e adaptação. Não existe um único culpado — é uma falha
sistêmica de preparo”, afirma.
Monitoramento
e produtividade: a realidade por trás do home office
Uma das grandes
polêmicas envolvendo o trabalho remoto é a forma como a produtividade é
avaliada. Algumas empresas utilizam métricas digitais detalhadas: monitoramento
da memória e do uso do computador, quantidade de cliques, abertura de abas,
inclusão de tarefas em sistemas internos e registro de chamados. Para muitos
colaboradores, a amplitude desse acompanhamento é surpreendente. “Nem todos
percebem que existem ferramentas capazes de medir cada movimento, mesmo fora do
escritório. Isso gera desconforto e desconfiança”, explica Tatiana Gonçalves.
Esses episódios
reacendem um debate antigo: o home office e o trabalho híbrido estão realmente
em crise ou é apenas uma fase de ajuste?
Home office e híbrido: o desejo versus a prática
Mas, se é um
anseio dos trabalhadores, por que as empresas relutam em adotar esse modelo?
Ocorre que a transição para o modelo híbrido enfrenta diversos desafios, tanto
do ponto de vista estrutural quanto organizacional. A resistência de muitos
empregadores é um dos principais obstáculos. Após a pandemia, quando as
empresas foram obrigadas a adotar o home office, muitas começaram a
experimentar o trabalho híbrido. Contudo, a implementação efetiva desse modelo
exige adaptações significativas nas políticas internas, infraestrutura
tecnológica e na organização dos contratos de trabalho.
Segundo Mourival
Boaventura Ribeiro, sócio da Boaventura Ribeiro Advogados Associados,
"depois da pandemia, as empresas passaram do trabalho remoto para o
híbrido, e agora precisam adaptar-se às novas regras legais". A sanção da
Lei nº 14.442/22, que regulamenta o trabalho híbrido e remoto, trouxe mudanças
importantes, mas a adaptação a essas novas regras tem sido lenta para muitas
empresas, que enfrentam dificuldades em ajustar suas estruturas para garantir a
eficiência do modelo híbrido.
Infraestrutura
e segurança: desafios essenciais
Entre os
principais desafios da implementação do trabalho híbrido e home office, destaca-se
a questão da infraestrutura. Para garantir esses modelos funcionais, é
necessário revisar políticas de trabalho, oferecer tecnologia adequada para a
comunicação remota e presencial, e garantir que contratos de trabalho estejam
adaptados às novas exigências legais. A segurança da informação também é uma
preocupação central, especialmente quando os colaboradores trabalham
remotamente e acessam sistemas corporativos de casa. A empresa precisa garantir
que as ferramentas e os dispositivos usados pelos colaboradores estejam
protegidos contra riscos cibernéticos.
Carol Lagoa,
co-founder da Witec, alerta: "Quando um colaborador trabalha remotamente,
a empresa precisa garantir que seu equipamento esteja protegido contra vírus e
outros riscos. Caso contrário, o risco de ataques cibernéticos pode comprometer
a segurança da companhia."
Resistência
dos empregadores e reconfiguração da gestão
Muitos líderes de
empresas ainda não se sentem confortáveis com a ideia de não estarem
fisicamente presentes para supervisionar suas equipes. Além disso, a falta de
contato constante pode gerar uma sensação de desconexão, dificultando o
engajamento e a colaboração entre os membros da equipe.
Tatiana Gonçalves,
CEO da Moema Medicina do Trabalho, afirma que a escolha de quem vai para o
modelo híbrido ou home office de trabalho deve ser feita pelos gestores diretos
de cada equipe, avaliando as condições do ambiente de trabalho de cada
colaborador. A adoção do trabalho híbrido exige autonomia, responsabilidade e
uma compreensão detalhada das condições em que cada colaborador se encontra.
A importância
de adaptar-se às novas normativas
Além das questões
estruturais e culturais, as empresas também precisam adaptar-se a novas
normativas legais. A Lei nº 14.442/22, que regulamenta o trabalho híbrido e
remoto, trouxe mudanças que flexibilizam o controle de jornada para
trabalhadores remotos. No entanto, a implementação dessas mudanças tem sido um
processo lento e difícil para muitas empresas, que precisam garantir que seus
contratos de trabalho e suas políticas internas estejam em conformidade com as
novas exigências.
Tatiana Gonçalves
também destaca a importância de cumprir as Normas Regulamentadoras (NR),
especialmente a NR 17, que trata de ergonomia no ambiente de trabalho.
"Laudos com a NR 17 e o PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais)
são fundamentais para garantir a segurança dos colaboradores, minimizando os
riscos de acidente de trabalho ou doenças ocupacionais", explica.
O futuro do
trabalho: um equilíbrio entre presencial e híbrido
Apesar dos
desafios, o trabalho híbrido e o home office continuam a ser opções promissora
para muitas empresas que buscam reter talentos e melhorar a satisfação de seus
colaboradores. Contudo, é claro que a adoção exige paciência, adaptação e
aprendizado contínuo por parte das organizações.
O futuro do trabalho está sendo redesenhado, no entanto, o caminho para uma transição efetiva ainda está repleto de desafios. Adaptar-se às novas normas legais, garantir infraestrutura adequada e criar políticas internas que atendam tanto às necessidades da empresa quanto às dos colaboradores são passos essenciais para o sucesso de qualquer modelo de trabalho.
Em última análise, a flexibilidade e a adaptação serão fundamentais para que as empresas consigam equilibrar o trabalho híbrido, home office ou presencial, garantindo produtividade, segurança e bem-estar para todos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário