"O que leva líderes tão calejados e renomados
a perderem a efetividade?", essa é uma das questões levantadas por Paulo
Aziz
Ultimamente o mundo tem visto a decadência de
diversos líderes do setor privado, antes tidos como referência de eficiência e
liderança. Adorados e reverenciados por muitos, alguns tiveram seu status
elevado à quase “semideuses”, nos olhos dos seus funcionários e da sociedade em
geral.
Marcelo Odebrecht, Eike Batista, André Esteves,
Sergio Gabrielli, Joesley Batista, entre muitos outros, saíram das capas de
revistas de negócios, onde eram reverenciados pelos seus pares, para estamparem
as colunas policiais. Heróis, tornaram-se vilões.
Mas a lista não se resume a suspeitos e condenados
de cometerem crimes. Há diversos exemplos de profissionais de sucesso que
“perderam a linha” em sua gestão. Olli-Pekka Kallasvuo, então CEO da Nokia,
liderou a empresa no seu declínio de líder global em tecnologia, para uma
semifalência em menos de 5 anos.
Carlos Ghosn, então responsável por reerguer a
Nissan das cinzas, tido como um “guru” entre seus pares, se envolveu com
diversos escândalos enquanto CEO da Renault, levando a empresa a apresentar
resultados duvidosos durante um certo período de sua gestão. Até mesmo os
resultados de Abílio Diniz como presidente do conselho da BRF vêm sendo
questionados por alguns.
O que leva líderes tão calejados e renomados a
perderem a efetividade? Por que seus desempenhos não se sustentam e eles levam
as suas organizações ao caminho das perdas?
A resposta é mais simples do que parece: eles
pararam de olhar para si. Pararam de se questionar se estavam no caminho certo.
Deixaram-se tomar conta por uma autossuficiência, provavelmente baseada num
certo narcisismo (que todos nós temos, querendo ou não), e reforçada por uma
manada de apoiadores incondicionais. Caíram na armadilha de si mesmos.
Talvez o fato mais assustador disso tudo é que
todos nós estamos sujeitos – mais do que imaginamos – a seguirmos por este
caminho. A boa notícia é que já existem estudos suficientes que mostram com
certa clareza o que acontece com estas pessoas. Sabendo disso, fica mais fácil
prevenir um eventual deslize, mantendo assim a performance em alta.
1) Falta de atenção
aos nossos próprios fatores de risco
Uma auto percepção acurada é uma das principais
características de pessoas com alta Inteligência Emocional. É com ela que nos
percebemos com olhar crítico, notando nossas emoções e nossa maneira de agir.
Infelizmente, muitas pessoas esquecem de olhar para
o que chamamos de riscos de descarrilamento, ou seja, aquilo que está em nós e
que pode, um dia, se tornar um problema real. Executivos de sucesso tendem a
sofrer mais com esta questão. Muitos, acostumados com o sucesso, não se
permitem entrar em contato com este seu lado mais obscuro com medo do que podem
ver. Em muitos casos, há uma defesa do indivíduo que o faz acreditar que tudo
está sob controle, e que “isto não vai acontecer comigo”. Ora, todos nós temos
as nossas “sombras”, e quem as conhecer mais intimamente terá mais chances de
gerenciá-las.
2) Excesso de certeza
Alguns líderes acreditam que devem ter a resposta
para tudo. Muitos se creem até onipotentes em tomadas de decisões. Isto pode se
manifestar de diversas maneiras. O medo inconsciente de não ser necessário (“se
eu não tiver a resposta para tudo, eu não tenho valor”) e a soberba (“estou
nesta posição, justamente por que eu sei mais do que todos as outras pessoas”)
são exemplos comuns. Independentemente da forma, quando isto acontece, tais
executivos deixam de se engajarem em discussões reflexivas e adaptativas.
Deixam de procurar a melhor solução para cada desafio, para oferecer a única
solução que eles têm para oferecer. Ora, se a principal função de um executivo
é tomar decisões para a sua organização, não fica difícil de entender por que
algumas delas estão longe do ideal.
É também muito comum que isto venha acompanhado de
outro problema: eles não aceitam serem questionados em suas decisões. Alguns
até levam isto ao extremo, demitindo quem o faça quase que num acesso de
paranoia. O que me leva ao próximo ponto...
3) Falta de
desafiadores
É extremamente comum que certos executivos se
cerquem apenas do que eu chamo de pessoas “sim, senhor”. São seguidores
incondicionais, que estão ali para suprir uma necessidade narcisista do seu
líder de estar cercado de pessoas que o bajulem e aplaudem incondicionalmente
todas as suas atitudes. E isto não é uma surpresa, já que todos nós tendemos a
gostar de quem tem as mesmas percepções que nós. O problema é quando isto se
torna exagerado, o que sempre acontece sem que o executivo perceba. Aliás, uma
das grandes dificuldades de alguém que apresenta comportamento narcisista é a
incapacidade de ver além de si mesmo, cegando-o para qualquer para qualquer
opinião que não seja igual à sua. Somando isto ao comportamento agressivo para
com quem o desafia, citado acima, mesmo que os seus seguidores tenham opiniões
diferentes, eles não as compartilham por medo de sofrerem consequências
negativas.
4) A armadilha do
poder
Já ouvimos muitas vezes que “o poder corrompe”.
Obviamente não é possível generalizar, mas é fato que existem diversos fatores
ligados ao poder que podem nos corromper – na maioria das vezes
inconscientemente. O poder muitas vezes está atrelado com o respeito alheio.
Muitos destes executivos supracitados eram muito respeitados e admirados. Não
há nada de errado em querer ser admirado, mas há um problema sério quando o
amor próprio vira soberba ou vaidade excessiva. Nestes casos, o executivo passa
a ter medo de perder este status “diferenciado” e voltar a ser umas “relés
mortal”. Imagine um alto executivo acostumado a aparecer em colunas sociais,
navegando no seu iate ou voando no seu jato particular, de repente ter que
tomar uma decisão que, apesar de ser pertinente e correta para a sua
organização, acarretaria uma perda momentânea destas regalias (por exemplo,
cortar o próprio salário ou vender o jato corporativo).
Provavelmente qualquer um de nós que tivesse caído
nesta armadilha, ficaria incomodado. O problema é que, se não lidarmos
abertamente com este incômodo e tomarmos uma decisão mais consciente, esta
armadilha logo vira uma areia movediça que suga os resultados das nossas
organizações. Quando percebemos, já estamos apenas com o pescoço para fora (ou,
em alguns casos, sentados na cadeira do réu de um processo criminal).
Não somos invencíveis, independentemente do sucesso
que alcançamos. Felizmente, podemos aprender com o erro dos outros, e aumentar
as chances de sucesso e as chances de manutenção deste sucesso. Os resultados
da sua organização agradecerão.
Paulo Aziz Nader
- atua como consultor no setor de desenvolvimento organizacional com a Leverage
Coaching criando programas de desenvolvimento executivo, de liderança e de gestão
de talentos para empresas de diversos portes e segmentos. É também Coach
profissional, certificado pelo Integral Coaching Canada™, pelo Behavioral
Coaching Institute (BCI) e pela International Coach Federation (ICF) da qual é
membro afiliado. Bacharel em Administração de Empresas e gestão internacional
de negócios pela ESPM e mestrando em desenvolvimento organizacional pelo INSEAD
(Fontainebleau), tem em seu currículo passagens por empresas de grande porte
como Microsoft e Facebook. Possui extensões em Leadership & Management pela
Harvard University e em Change Management pelo MIT Sloan; é membro afiliado do
Institute Of Professional Coaching (IOC), órgão afiliado à Harvard Medical
School; e membro convidado da International Society for the Psychoanalytic
Study of Organizations (ISPSO). www.leveragecoaching.com.br.