Peguei emprestada essa frase dita pelo Marco
Bebiano, Diretor de Desenvolvimento de Negócios com Agências do Google Brasil,
durante o evento ProXXima 2019. Confesso que só comecei a me envolver mais com
analytics há pouco tempo, pois na área de Comunicação Corporativa e Branding
ainda não existe muito a cultura de usar estratégias data-driven.
Tiro o chapéu para os profissionais de Marketing e
Vendas, que souberam evoluir da antiga "inteligência de mercado" para
business insights baseados em big data em tempo real. Entre os exemplos estão a
mídia programática, que se planeja sozinha de forma responsiva, campanhas
automatizadas com machine learning e anúncios, o retargeting do e-commerce e o
acompanhamento em tempo real da performance nas mídias.
A área de comunicação corporativa (e branding) tem
trabalhado basicamente em duas frentes: pesquisas robustas a cada um ou dois
anos sobre reputação/imagem da marca, às vezes incluindo brand valuation, como
é o caso de Interbrand, Kantar Millward Brown ou Reputation Institute - que
inclusive produzem rankings anuais; e monitoramento permanente das mídias
sociais, usando text analytics e inteligência artificial, em ferramentas como
Google Analytics e pesquisa do sentimento dos usuários a partir de
palavras-chave, como faz o GPETEC.
Os bots-sentinela (texto ou voz) rastreiam tudo que
as pessoas comentam sobre uma marca a partir de uma coleção de palavras e
expressões pré-determinadas, e disparam uma resposta-padrão que convida à
interação. Assim, se um cliente fala "produto defeituoso",
"insatisfeito" ou "Procon" no Facebook, por exemplo, a
empresa manda uma mensagem inbox pedindo para ele explicar o que houve. Ou se o
ex-hóspede de um hotel faz um elogio ou menciona o destino, recebe um
agradecimento e uma oferta promocional, como o Elife Group implantou para seu
cliente Enotel Hotels & Resorts. É um ótimo jeito de mapear crises em
formação ou oportunidades de negócio.
Entretanto, a "caixa preta" do brand
analytics ainda são os indicadores ligados ao brand equity. Estamos falando de
entender se e como cada iniciativa da marca impacta o capital reputacional, que
por sua vez gera o nível de atratividade da organização para os investidores,
talentos, clientes e fornecedores. Nas minhas andanças por empresas que vão de
mega-corporações a unicórnios, tenho encontrado situações bem interessantes
para ilustrar essa relação que permanece ainda pouco explorada.
Por exemplo, um dos mais cobiçados e maiores bancos
de varejo do país precisa saber o quanto o descontentamento com seu app derruba
seus indicadores de Admiração, Inovação e Liderança. Uma gigantesca e
tradicional marca de alimentos, que pouco sofre variações nas crises devido ao
seu sólido capital reputacional, quer descobrir quais submarcas do seu
portfólio, apesar de venderem bem, pouco agregam para o valor da marca, e
portanto merecem esforços residuais de marketing e comunicação. Será que uma
importante empresa de higiene e cosméticos deveria aproveitar a força da sua
divisão de saúde para turbinar sua percepção de Inovação e Liderança? Ou essa
divisão deveria adotar o sobrenome da marca-mãe para ganhar Confiança e
reforçar Diferenciação? Uma empresa com grande tradição e expertise no seu
setor, envolvida em escândalos de corrupção, passou por um grande re-branding,
mas como de fato ficaram as percepções de Integridade, Confiança,
Autenticidade, Advocacy e até Empregabilidade (atração de talentos) - será que
os esforços serão suficientes para convencer o público, e quais deles estão
trazendo resultados efetivos?
Muitas vezes os dados mostram coisas completamente
contra-intuitivas. Pesquisas do GroupCaliber com clientes na Europa mostraram
que a marca menos admirada de um certo setor é a dona da mais admirada! - um
dado que pode desdobrar várias decisões estratégicas importantes. Ou descobriu
que jovens de 18-24 anos da dita "geração saúde" gostam mais da marca
centenária de refrigerantes do que os clientes 60+ que ajudaram a consolidá-la
no mercado. Quando os dados mostram dois grandes varejistas virtualmente
empatados no KPI de Força da Marca (Trust & Like) e se percebe que um deles
tem o indicador de Sustentabilidade bem mais alto que o outro, está aí uma
oportunidade de alavancagem para o branding dessa empresa!
O monitoramento de mídias digitais não é suficiente
para fazer essas correlações mais estratégicas e ligadas aos ativos intangíveis
(brand equity), embora acoplar as duas coisas seja o ideal. As pesquisas de
branding pontuais e com grandes intervalos de tempo ficam rapidamente
obsoletas.
Só nos quatro primeiros meses de 2019 já houve 10
casos no Brasil de grandes marcas enfrentando fake news, acidentes, escândalos
e campanhas de comunicação desastrosas. Será que elas sabem a extensão do
estrago na sua reputação? Pesquisar Net Promoter Score (recomendação/detração)
está muito longe de ser suficiente. Para entender a complexidade envolvida,
pense que, durante anos, a Gol, que comprou a finada Varig, manteve esta marca
viva porque o seu capital afetivo e reputacional era maior do que o dela mesma!
Que na fusão do Itaú com o Unibanco prevaleceu a primeira, pois suas percepções
junto ao público em geral eram mais robustas, mas o Unibanco foi mantido na razão
social porque agregava em reputação. Que apesar de ser do mesmo grupo da
Odebrecht, a força da marca Braskem se manteve alta, devido ao seu estoque
reputacional, especialmente ligado ao plástico verde (sustentabilidade) e sua
capacidade de inovação.
Moral da história:
- Os
analytics vieram para ficar e vão direcionar todas as estratégias das
organizações no futuro (clientes, agências, mídia). Acabou o romantismo
dos profissionais que gerenciam com base principalmente em criatividade e
intuição.
- Quanto
mais atuais os dados, mais ágeis e melhores as decisões. O contexto muda
inesperadamente e os dados ficam rapidamente obsoletos. O planejamento
fica cada dia mais fluido em resposta aos analytics.
- Dados
sem reverter em estratégia não servem para nada, são só poluição mental e
não insights.
- Se
você trabalha com comunicação e branding, não tenha medo dos analytics,
eles são mais fáceis de interpretar do que parece; é pura falta de
intimidade.
- Dados
revelam coisas incríveis e por vezes na contramão do senso comum, gerando
grandes oportunidades de negócio e correções de rumo.
- Saiba
andar com suas próprias pernas e eduque a sua equipe; não dependa das
interpretações e recomendações de terceiros. Empodere-se.
Patricia
Galante de Sá - Especialista
em reputação corporativa, branding e sustentabilidade, tendo atuado por mais de
25 anos junto a marcas como Natura, Disney, Sheraton, Louis Vuitton, LATAM e
Monsanto. Atualmente associada da consultoria RegeNarrativa e da startup de analytics GroupCaliber,
é professora de Branding, Marketing, Sustentabilidade, Ética, Gestão de
Serviços e Comportamento do Consumidor na IBE Conveniada FGV, e autora de
livros nas áreas de comunicação corporativa, sustentabilidade e inovação. É
Relações Públicas, Mestre em Administração pela FGV e formada em Economia para
Transição pelo Schumacher College/UK.