As relações internacionais – estremecidas durante a pandemia – estão gerando importantes alertas econômicos mundiais. Um dos maiores exemplos está na recente decisão de suspensão do acordo econômico entre a China e a Austrália em todas as atividades relacionadas ao Diálogo Econômico Estratégico Sino-Australiano. Esse fato pode gerar grandes impactos, principalmente no agronegócio, podendo inclusive chegar rapidamente ao Brasil.
Uma tensão econômica que aparentemente envolve
apenas dois países pode facilmente influenciar a economia de outros. Apesar de
um dos maiores impactos da decisão chinesa estar no aumento do preço do minério
de ferro – que, segundo analistas, pode chegar a US$ 200 a tonelada, superando
o recorde de US$ 194 atingido há mais de uma década – a saída da Austrália como
fornecedora da China dessa mercadoria pode criar um novo direcionamento por
parte do governo brasileiro, reduzindo os investimentos para o setor agrícola e
direcionando para o mercado minerário.
Além das questões de política internacional, estão
incluídas na natureza do agronegócio uma série de questões
financeiro-temporais, como o mercado futuro, o tempo do ciclo produtivo e o
tempo da concorrência internacional, diversificado em razão da posição
geográfica de cada país. Em boa parte dos setores, as compras são negociadas no
chamado negócio a termo, onde o pagamento da compra de um produto ou serviço há
de ser realizado até determinada data – ou seja, o tempo é curto, com marcos
previsíveis e delineados.
Já o negócio futuro, por sua vez, além do
diferimento do pagamento, passa por um mecanismo financeiro de arbitramento que
pode gerar perdas ou ganhos não correspondentes ao valor da mercadoria em si
mesma. Ele sai do âmbito da mercadoria e vai para um mercado derivado, onde se
negociam os direitos creditórios, uma vez que o contrato é arbitrado (liquidado
em tese) a cada dia, com a variação da cotação do produto, conforme as relações
e decisões mercadológicas internacionais. Como o tempo nos contratos futuro é
muito grande, o mercado financeiro, com negociações diárias, cria um mecanismo
artificial para que a incerteza seja dirimida em valores. O tempo do mercado
financeiro é o principal regulador e influenciador das relações comerciais de
futuro e do agronegócio.
Somado a isso, existe ainda o tempo de produção,
onde cada produto possui um determinado período para ser plantado, colhido e
vendido. Esse período pode ainda sofrer impactos adversos, como eventos
climáticos, desastres naturais ou pragas. Por fim, o agricultor precisa lidar
ainda com o tempo concorrencial, que é a detecção de novos entrantes, por vezes
de outras regiões geográficas, com safras especiais, visando atuações mais
nichadas, com menos volume e maior valor agregado. Em todo esse jogo comercial,
há um descompasso enorme. O fluxo monetário é desencontrado do fluxo produtivo,
que é desencontrado do fluxo da concorrência. E, em contrapartida, as despesas
vêm muito antes das receitas.
Para minimizar esses impactos, cada um desses
fatores influenciadores precisa de medidas específicas. No tempo financeiro, é
necessária uma excelente estrutura de gestão, capaz de preservar a segurança
econômica da transação. No tempo de produção, a tecnologia tem sido uma das
estratégias mais importantes e, inclusive, feito milagres em termos de
minimizar o tempo de produção e melhorar a qualidade do produto. Contudo, isso
demanda dinheiro que, muitas vezes, se torna uma barreira para pequenos
produtores.
O tempo de concorrência demanda ainda maior grau de
atuação de política governamental de caráter internacional. Como não há como
barrar a entrada de um país em um determinado mercado. É necessária uma
política eficiente de governo em termos de concorrência internacional, de forma
a regularizar e proteger produtos nacionais.
Infelizmente, os instrumentos tradicionais de
negociação jurídica são limitados a uma forte pressão financeira. Ainda não
encontraram um meio de reparar danos no direito que não seja pelo pagamento de
indenizações, que costumam ser tardias. Com as interferências políticas
externas, agrícolas ou em outras commodities, o setor fica ainda mais
vulnerável. Se o Brasil não tomar cuidado, podemos acabar sendo atingidos pelas
sanções que foram impostas à Austrália.
Jayme
Petra de Mello Neto - advogado do escritório Marcos Martins
Advogados e especialista em Direito cível e societário.
Marcos
Martins Advogados
https://www.marcosmartins.adv.br/pt/
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