Conforme o Centro
de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (Centers for Disease Control and Prevention - CDC), estimava-se
que, em 2022, cerca de 2,2% da população acima de 18 anos possuía transtorno
espectro autista.
No Brasil, o
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) esclarece que não há um
número oficial a respeito da prevalência do autismo no país. Conforme
o “Canal Autismo”, há um estudo piloto na cidade de Atibaia (SP), com 20
mil habitantes, que estimava 1 pessoa com espectro autista para cada 367
criança. Em 2023, estimava-se que havia aproximadamente 6 milhões de pessoas no
transtorno espectro autista.
Diante da
fragilidade dos dados sobre essa parcela da população, os quais são capazes de
influenciar a formulação de políticas públicas, a Lei nº 13.861, de 18 de julho
de 2019, acrescentou o parágrafo único ao artigo 17 da Lei nº 7.853, de 24 de
outubro de 1989, para que os censos demográficos realizados a partir de 2019
incluíssem as especificidades inerentes ao transtorno do espectro autista.
Dessa forma, mesmo que os diagnósticos não representem com precisão os casos,
já apresentam informações dotadas de maior verossimilhança com a realidade.
Nesse viés, é
importante ressaltar que o principal marco legislativo foi a Lei nº 12.764, de
27 de dezembro de 2012, que institui a “Política Nacional de Proteção dos
Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista”, a qual considera como
pessoa com transtorno do espectro autista aquelas que apresentam (artigo 1º,
§1º, incisos I e II):
I - deficiência
persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação sociais,
manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada
para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em
desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento;
II - padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos.
A Política
Nacional pauta-se, portanto, na necessidade em promover a intersetorialidade
para o desenvolvimento das ações, a participação da comunidade, a atenção às
questões de saúde (diagnóstico precoce, atendimento multidisciplinar, acesso à
mediação e nutrientes), o estímulo à inserção no mercado de trabalho. Além
disso, ainda contempla iniciativas voltadas a promover a informação, a pesquisa
científica e a formação de profissionais para atendimento (artigo 2º da Lei nº
12.764/2012).
No que tange aos
direitos da pessoa com transtorno do espectro autista, o artigo 3º da Lei nº
12.764/2012 ainda apresenta 3º um rol meramente exemplificativo, dentre os
quais destacam-se o direito à: vida digna, integridade (física e moral),
segurança, lazer, proteção, bem como o direito ao acesso à saúde à educação, à
moradia, ao mercado de trabalho, à previdência social e à assistência
social.
Por outro lado, no
que diz respeito às proteções, a referida lei reitera disposições constitucionais
ao apresentar o dever de proteger a pessoa com transtorno do espectro autista
de qualquer tratamento desumano, degradante ou de qualquer forma de
discriminação (artigo 4º da Lei nº 12.764/2012), conforme artigo 3º, inciso IV,
5º, inciso III, e outros da CF. Nessa perspectiva de vedação à discriminação, o
texto legal ainda contempla a vedação de planos de saúde privados impedirem a
participação de pessoas com espectro autista, bem como de escolas recusarem a
matrícula de aluno com transtorno de espectro autista ou outro tipo de
deficiência.
Para além das
questões supramencionadas, que enfatizam a legislação própria sobre o tema, a
pessoa com espectro autista ainda goza de toda a proteção garantida à pessoa
com deficiência, disposta no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) ou em outras
disposições legais e constitucionais espaças pelo ordenamento. Há, inclusive,
disposições que asseguram direitos à pessoa com espectro autista e quiçá que
poderão beneficiar familiares/ responsáveis, dos quais ressalte-se:
(i) o Benefício de
Prestação Continuada (BPC) previsto no que garante um salário-mínimo mensal à
pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida
por sua família (artigo 20, Lei nº 8.742/1993);
(ii) caso a
empresa aérea exija a presença de um acompanhante para a pessoa com
deficiência, concederá ao acompanhante desconto de no mínimo 80% da tarifa
cobrada do passageiro com deficiência (artigo 48, §1º, Resolução 009, de 05 de
junho de 2007);
(iii) a Isenção de IPI Imposto sobre Produtos Industrializados) e/ou IOF (Imposto sobre operações financeiras) na aquisição de veículos, nos termos da RFB nº 1.769/2017;
Dentre as
alterações recentes da Lei nº 12.764/2012, está o acréscimo do artigo 3º-A pela
Lei nº 13.977/2020, a qual instituiu a Carteira de Identificação da Pessoa com
Transtorno do Espectro Autista (Ciptea). O documento possui como objetivo “garantir
atenção integral, pronto atendimento e prioridade no atendimento e no acesso
aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas de saúde, educação e
assistência social.”. Por essa razão, contempla os dados pessoais e
a fotografia da pessoa com transtorno do espectro autista, bem como os dados
pessoais do responsável legal ou cuidador.
Conforme o exposto
verifica-se que a legislação apresenta disposições relevantes sobre o tema, não
apenas voltadas aos direitos que nos soam mais abstratos (vida, saúde,
segurança, etc.), mas visando a promoção de políticas públicas assistenciais
direitos às pessoas com transtorno do espectro autista. Entretanto, realizando
uma análise do tema conforme a vertente do “Direito Achado na Rua”, a “a lei é uma
referência, mas por meio das ações da sociedade consegue-se tirá-la do papel,
dar-lhe vigor e vitalidade, modificá-la”.
Ou seja, mesmo que
haja relevantes disposições sobre o tema, mostra-se essencial fomentar “a criação e
o desenvolvimento de Políticas públicas voltadas à melhor qualidade do acesso à
educação, aos tratamentos multidisciplinares, ao acompanhamento de
profissionais qualificados, assim como para o incentivo às pesquisas
direcionadas aos autistas”, tal como objetivou a Lei nº.
12.764/2012.
Portanto, em datas
como a de hoje em que se potencializa a discussão sobre direitos, nesse caso
sobre os direitos relacionados às pessoas com Transtorno do Espectro Autista, é
essencial destacar a importância de uma educação em direitos humanos, a qual
possa pauta-se “na tolerância em relação às diferenças, na solidariedade, na justiça
social, na sustentabilidade” e visa promover avanços na defesa
dos direitos fundamentais para todos os seres humanos.
Thais
Marques
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