quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Feminicídio aumenta no DF e coloca instituições de apoio às mulheres em alerta


Frente ao aumento dos casos de violência contra a mulher, é preciso dar espaço às ações que combatem a discriminação e dão voz às mulheres

Desde o início do ano, no Distrito Federal, 15 mulheres foram vítimas de feminicídio. É a forma máxima da violência contra a mulher, quando a morte ocorre por discriminação ou menosprezo pelo gênero feminino, por violência doméstica ou familiar.

Uma das principais frentes de combate aos crimes de gênero é a criação de políticas públicas que levem em conta a real situação das mulheres no país. "A violência contra a mulher está intimamente relacionada com o patriarcado, ou seja, a hierarquização social dos sexos em que o gênero masculino é o dominante. Dessa forma, a mulher não é vista como sendo igual ao homem, mas como uma propriedade privada dele", disse Francisca Gallardo, coordenadora do Núcleo de Gênero do Centro Universitário IESB e professora do curso de Relações Internacionais. O Núcleo promove a realização de estudos com perspectiva de gênero e suas diversidades, para a melhoria das políticas públicas voltadas às mulheres.

Segundo a professora, a América Latina foi considerada a segunda região mais perigosa do mundo para as mulheres em 2013 pela Organização Mundial da Saúde, a OMS. Nesse ano, a taxa de assassinatos de mulheres cometidos apenas por parceiros e ex-parceiros foi de 40,5%, atrás apenas da taxa no Sudeste Asiático, onde o feminicídio é praticado desde o nascimento, que chegou a 58,8%.

Uma ação importante nesse contexto é criar espaços para que as mulheres possam ser ouvidas e trocar suas experiências. O IESB mantém um projeto de extensão do curso de Psicologia com esse propósito. O Rodas de Conversa acontece todos os semestres e tem grupos voltados para as estudantes e para o público externo. Neste ano, cada encontro envolveu entre 10 e 15 mulheres. As atividades estão previstas para retornar em agosto, e haverá ainda grupos de homens e mulheres em contexto de violência doméstica, encaminhados pela Justiça a partir da Lei Maria da Penha.

O conceito de feminicídio tomou forma ao longo das últimas décadas. O primeiro termo utilizado foi femicídio, introduzido por Diana Russell em 1976, para definir os assassinatos de mulheres por motivos de gênero. A nomenclatura foi considerada insuficiente para explicar de forma completa a violência contra a mulher, e foi criado o termo feminicídio, que inclui, além das mortes violentas, abusos verbais, físicos, sexuais e psicológicos que acabam levando à morte da mulher, mesmo que os atos não tenham esse objetivo.

Os números da violência assustam: de acordo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública e da Paz Social do DF, houve um aumento de 40% no número de feminicídios no primeiro semestre de 2018, em relação ao mesmo período do ano passado. O caso mais recente foi o da servidora pública Janaína Romão, assassinada pelo ex-marido.

"Mas é preciso cautela ao examinar dados estatísticos", disse Julianna Barbosa, professora do curso de Direito do IESB. "A violência contra as mulheres e seus assassinatos em âmbito doméstico e nas relações afetivas é um problema social há um longo tempo, mas não havia a visibilidade que há hoje", continua.

"O que acredito que esteja acontecendo é um aumento da visibilidade de tais crimes dada a existência recente da qualificadora no Código Penal e graças aos movimentos de mulheres que têm se mobilizado com grande força para que a pauta ganhe cada vez mais espaço na mídia e no cotidiano das pessoas", completa a professora.

Um desses movimentos acontece nesse fim de semana. Entre os dias 3 e 6 de agosto acontece o Festival Pela Vida das Mulheres no Museu Nacional, em Brasília – DF. O evento trará debates e encontros de mulheres sobre diversos temas, como a participação política feminina, mas o principal objetivo é acompanhar as discussões que acontecem na Audiência Pública sobre a ação ADPF 442, que pede que não seja crime o aborto até 12 semanas da gestação. A Audiência acontece na sexta-feira, dia 3, e na segunda, dia 6.

Segundo Francisca Gallardo, as mortes decorrentes de abortos ilegais – que acontecem com a frequência de um a cada dois dias no Brasil – também podem ser consideradas como feminicídio. "O fato de o aborto ser ilegal não impede que as mulheres o realizem em clínicas clandestinas de forma insegura e insalubre. Tal prática levou à morte muitas mulheres por complicações na cirurgia ou por alguma infecção. Nesse caso, o óbito não era o objetivo, mas a consequência do aborto inseguro. Esse tipo de situação pode ser considerado feminicídio" disse a professora.
A Lei do Feminicídio, de 2015, tipificou e aumentou a pena para esse tipo de crime. "Atualmente, porque temos que salvar as vidas das mulheres, não podemos prescindir de institutos punitivos, e eles nos ajudam a dar visibilidade às violências", disse Julianna.

"No entanto, urge que tenhamos mais políticas públicas de prevenção às violências contra mulheres. Precisamos fortalecer mulheres em suas relações afetivas, na sua saúde mental, em seus direitos. No longo prazo, precisamos educar os homens para uma nova masculinidade não tóxica, não violenta, não desigual. Para o nosso bem e para o bem deles", continua Julianna.

 

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