Reposição
de vitamina D é cada vez mais comum em diversas especialidades médicas e gera
controvérsia em debates médicos sobre a real necessidade de suplementação
Até o final de 2017, o Google
registrou cerca de 13 mil artigos escritos nos últimos cinco anos sobre
vitamina D em humanos. Deste material, 2.700 trazem como tema a suplementação
da vitamina. O que antes era tema restrito na endocrinologia às doenças ósseas,
como raquitismo, osteomalácia e osteoporose, hoje traz discussões de benefícios
relacionados ao diabetes, doenças cardiovasculares, transcendendo para outras
doenças e especialidades com esclerose múltipla, câncer, entre outros.
Para a endocrinologista Suzana
Vieira, o rastreamento da deficiência de vitamina D é realizado de forma pouco
criteriosa, pois em 2011 a Sociedade Americana de Endocrinologia definiu uma
diretriz que recomenda que seja realizado apenas em pessoas com fatores de
risco para tal deficiência, sendo a reposição recomendada para evitar quedas e
fraturas ósseas. Isso porque a diretriz orienta que os níveis normais de
vitamina D estariam iguais ou superiores a 30ng/mL; entre 20 e 30ng/mL
caracterizariam insuficiência e nos casos de 250HD < 20ng/mL seriam
compatíveis com a deficiência.
“Se olharmos esses números de
referência, entre 20% a 100% dos idosos nos EUA, no Canadá e na Europa seriam
deficientes em vitamina D, ou seja, a normalidade estatística seria a exceção,
já que apenas 5% da população deveria estar fora da faixa de normalidade”,
explica a endocrinologista. Isso reforça a ideia de que a suplementação esteja
sendo feita de forma exagerada para diversos tipos de pessoas.
No Brasil, por exemplo, estudos do
Departamento de Metabolismo Ósseo e Mineral da Sociedade Brasileira de
Endocrinologia e Metabologia (SBEM) para o Programa Diretrizes da Associação
Médica Brasileira (AMB) mostram que em São Paulo cerca de 85% dos idosos estão
com valores inadequados de vitamina D, e trazem os mesmos índices inadequados
também em mais de 90% dos idosos institucionalizados e em cerca de 50% da
população de jovens saudáveis.
Aprofundando ainda mais sobre o
benefício da suplementação em uma população específica, os estudos começaram a
ser publicados avaliando a suplementação de vitamina D no risco de queda em
idosos. “Um dos estudos traz como resultado os grupos que receberam doses
maiores de vitamina D ou associada ao calcifediol e que conseguiram atingir os
valores preconizados de 30 ng/mL, mas não melhoram significativamente a performance
física e ainda foram associadas a risco de quedas maior quando comparadas ao
grupo de dose baixa (respectivamente – 66,9%, 66,1% e 47,9%)”, explica a
médica.
Sendo assim, é preciso ampliar o
olhar para além do exame complementar, considerando que o risco de fraturas em
idosos, por exemplo, está ligado a diversos outros fatores como a idade
avançada. “Dentro desses estudos, os especialistas destacam o exercício físico
como a intervenção mais efetiva para prevenir danos relacionados às quedas,
fraturas e lesões de quadril em idosos abaixo dos 80 anos. Outras intervenções
associadas também foram úteis em reduzir incidentes, tais como como tratamento
da visão e da osteosporose, avaliação do ambiente em que o paciente vive e
suplementação de cálcio e vitamina D”, reforça Dra. Suzana Vieira.
Essa avaliação do paciente e de suas
reais necessidades é englobada pelo conceito de Slow Medicine,
do qual a Dra. Suzana Vieira é colaboradora.
“A decisão deve ser compartilhada. A chave da questão são os valores, as
expectativas e as preferências do paciente. Nela estão envolvidos o
ambiente de cuidados do paciente, sua família, vizinhos, amigos e outras
fontes de suporte ou apoio”, premissas essas que vão de acordo aos princípios
do movimento.
Recentemente, os valores de
referência foram revistos, com diminuição do valor de normalidade a partir de
20ng/mL na população abaixo de 60 anos. No caso da vitamina D, se por um lado
a nova faixa para normalidade terapêutica possa favorecer uma redução na
prescrição dessa vitamina, por outro lado, a publicação de benefícios da
vitamina que estão além do metabolismo ósseo estimulam um maior número de prescrições
da vitamina D.
É um outro ponto comum na área médica
e que o Slow Medicine busca esclarecer, que é a possível evitar a
Mercantilização da Doença (Disease Mongering, em inglês) envolvidas nesses
casos. Segundo o Wikipedia, esse é o cenário em que aumentam-se as fronteiras
da doença e agressivamente promovem-se campanhas de sensibilização para
expandir o mercado para tratamento, entre elas, definir uma doença da qual um
grande número de pessoas tem.
“Acredito que dentro desses números e
do alarmante excesso de prescrições e de experiências prévias de modismos de
outras vitaminas no passado, devemos considerar a busca das vitaminas das
fontes naturais, seguindo a recomendação de que vitamina se compra na
feira e não na farmácia e no caso da Vitamina D, de preferência, tomando
um pouco de sol”, finaliza Dra. Suzana Vieira.
Dra. Suzana Vieira - graduada
pela Faculdade de Medicina da UFPE possui Residência Médica e Doutorado em
Endocrinologia pela USP. Atua como endocrinologista no SUS e na
Clínica Holus, onde também é diretora médica. É membro ativa da Endocrine
Societycolaboradora do Slow Medicine Brasi, apoiadora
da iniciatival Choosing Wisely. Para saber mais sobre o seu trabalho,
acesse www.drasuzanavieira.med.br e a
página da @drasuzanavieira no Facebook.
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