Psicanalista Tássia Borges explica o que acontece emocionalmente em dezembro e dá dicas para atravessar o período com mais leveza
O fim do ano
costuma ser associado a festas, pausas e celebrações. Mas, para muitas pessoas,
dezembro é um período emocionalmente sensível, razão pela qual há quem procure
iniciar ou intensificar sessões de psicoterapia.
Segundo pesquisas
da American Psychological Association (APA), em seu Holiday Stress Report,
cerca de 38% dos entrevistados relatam aumento significativo de estresse no fim
do ano, impulsionado por sobrecarga emocional, exigências sociais e obrigações
familiares e financeiras. Já a organização norte-americana National Alliance on
Mental Illness (NAMI) aponta que 64% das pessoas com histórico de transtornos
mentais relatam piora dos sintomas entre novembro e dezembro – mas vale
destacar, ainda, que no hemisfério norte a época é marcada pelo inverno, o que
pode ter um impacto significativo na saúde mental de algumas pessoas.
“Esses dados
refletem um movimento que também observamos no Brasil: o fim do ano funciona
como um amplificador emocional”, afirma Tássia Borges, psicanalista e Mestre em
Psicologia Clínica.
Para ela, a época
de festas reúne três fatores que influenciam diretamente a saúde mental: a
cobrança por pertencimento, a pressão por felicidade e a necessidade simbólica
de ‘fechar o ano’. “No fim do ano, muitas pessoas se sentem pressionadas a
estar bem, a participar de reuniões familiares e a cumprir expectativas
sociais, mesmo quando isso contraria seus limites internos. A terapia surge
como um espaço seguro para elaborar essas tensões e reencontrar um eixo
emocional”, explica a psicanalista.
No que tange à
dinâmica familiar, explica Tássia, ela costuma ganhar um peso desproporcional
no período. “Existe uma fantasia de que toda família precisa se reunir e estar
em harmonia, e isso nem sempre corresponde à realidade emocional dos
indivíduos. Muitas pessoas comparecem a encontros familiares apenas para evitar
conflitos, mesmo sabendo que sairão esgotadas”, diz. “Num trabalho analítico, o
primeiro passo é definir o que ‘família’ significa para cada pessoa. Há
diferentes configurações possíveis, e nenhuma é menos legítima que a outra”,
afirma.
Pressão social,
consumismo e comparação são igualmente danosos. A mídia, as redes sociais e o
imaginário coletivo reforçam que dezembro deve ser sinônimo de abundância:
presentes, viagens, grandes mesas, looks novos. A psicanalista alerta que essa
atmosfera pode despertar culpa, inadequação e até endividamento. “Quando
tentamos atender expectativas externas, nos desconectamos dos nossos valores
internos. Isso gera conflito e sofrimento”, completa.
A “obrigação de
estar feliz” também sobrecarrega pessoas que estão vivenciando luto,
separações, adoecimentos ou mudanças drásticas. “Dezembro também ativa um tipo
de avaliação silenciosa — e muitas vezes cruel — que cada pessoa faz sobre si
mesma. Há uma fantasia de que devemos terminar o ano transformados. Mas muitas
metas são irrealistas, grandiosas ou desconectadas do cotidiano. A terapia
ajuda a diferenciar desejo genuíno de exigência impossível”, diz Tássia.
Ela acrescenta que
acreditar que tudo – ou nós mesmos – mudará subitamente no dia 1º de janeiro é
uma forma de pensamento mágico que aumenta a frustração. “O ano muda no
calendário, mas quem muda somos nós quando fazemos contato com nossa verdade
interna”, finaliza.
A
seguir, Tássia compartilha dicas para atravessar o fim do ano com mais leveza:
- Permita-se
sentir o que sente: não existe “estado emocional correto” para dezembro.
Validar seus sentimentos é um ato de autocuidado.
- Refaça o
significado das festas: você pode criar rituais, horários e formas de celebrar
— ou de não celebrar — que façam sentido para sua história.
- Estabeleça
limites: é possível participar sem se anular. Vale reduzir o tempo, escolhendo
ambientes ou se afastando de dinâmicas que fazem mal.
- Reduza
expectativas irreais: nem todo encerramento precisa ser extraordinário. Às
vezes, o que faz sentido é apenas seguir existindo com sinceridade.
- Fuja das
comparações sociais: o que vemos nas redes é recorte, não realidade. Use essas
plataformas com consciência emocional.
- Honre as
ausências com significado: para quem vive o luto, criar um pequeno tributo ou
retomar um gesto simbólico pode trazer conforto.
- Reserve pequenos
respiros: pausas breves ao longo do dia ajudam a regular emoções e criar espaço
para decisões mais lúcidas.
- Busque apoio se
necessário: falar com alguém de confiança ou iniciar terapia pode aliviar
tensões acumuladas.
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