sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Perda gestacional ganha visibilidade em Outubro e alerta para causas, prevenção e acolhimento

Lei nacional de humanização do luto reforça a necessidade de políticas públicas e atenção especializada para mulheres e casais que enfrentam perdas gestacionais. 


Outubro marca o mês mundial de conscientização sobre a perda gestacional, neonatal e infantil — uma iniciativa que, no Brasil, assume novo fôlego após a sanção da Lei n.º 15.139 (maio/2025), que institui a Política Nacional de Humanização do Luto Materno e Parental. Segundo a ginecologista e obstetra Denise Lara, do Hospital Mater Dei Santa Clara, as perdas gestacionais merecem maior visibilidade, acolhimento especializado e políticas de apoio, pois afetam uma parcela significativa das gestações e ainda são envoltas em tabus.

 

Cenário nacional

Dados recentes indicam que aproximadamente 15% das gestações clinicamente reconhecidas no mundo terminam em aborto espontâneo. No Brasil, entre 2008 e 2018, foram registradas 2.258.104 internações por aborto — o que representou cerca de 5% de todas as internações de mulheres em idade fértil. A magnitude desses números torna ainda mais relevante a humanização do atendimento e o acolhimento das famílias.

 

Causas e fatores de risco

De acordo com Denise Lara, as causas de perda gestacional podem ser múltiplas e frequentemente combinadas. Entre as principais estão as alterações cromossômicas (aneuploidias) — responsáveis por até 70% das perdas ocorridas antes de 12 semanas de gestação —, além de malformações uterinas, miomas submucosos, insuficiência cervical, doenças endócrinas, como diabetes ou hipotireoidismo, trombofilias, infecções (toxoplasmose, rubéola, citomegalovírus, sífilis, listeriose, clamídia) e fatores comportamentais ou ambientais, como tabagismo, uso de álcool ou drogas, idade materna acima de 35 anos, obesidade, exposição a toxinas ou cafeína em excesso.

Entre os fatores de risco modificáveis, destacam-se: obesidade ou baixo peso, dietas inadequadas, sedentarismo extremo, privação de sono, trabalho físico excessivo ou noturno, consumo de substâncias tóxicas ou abuso de cafeína, além de histórico de perdas gestacionais e gestação múltipla.

 

Prevenção e cuidados antes e durante a gestação

A médica ressalta que, muitas vezes, é possível reduzir riscos com intervenções adequadas: adoção de dieta equilibrada, manutenção de peso corporal adequado, suplementação com ácido fólico (mínimo 400 mcg/dia) na fase pré-concepção, suspensão de tabaco, álcool e drogas, eliminação de exposição a pesticidas ou solventes, controle de doenças crônicas (diabetes, hipertensão, tireoidopatias, SOP), atualização vacinal, tratamento de infecções antes da gestação e avaliação pré-concepção para hábitos de vida, exames clínicos, hormonais e anatômicos.

 

Sinais de alerta que exigem avaliação médica

Segundo Denise Lara, os sinais de alerta para aborto espontâneo incluem:

* Sangramento vaginal no primeiro trimestre;

* Dor abdominal ou cólicas persistentes;

* Saída de líquido aquoso pela vagina (sinal de ruptura de membranas);

* Expulsão de coágulos ou fragmentos de tecido;

* Diminuição súbita de sintomas típicos da gravidez (náuseas, sensibilidade mamária, fadiga) antes de 12 semanas.

Em caso de qualquer desses sinais, recomenda-se atendimento médico imediato.

 

Acolhimento e luto

A implementação da Lei 15.139 reforça que o luto materno e parental deve ser tratado com dignidade, humanidade e atenção especializada. De acordo com a especialista, a equipe de saúde deve oferecer escuta empática, sem julgamentos; permitir ao casal expressar emoções como tristeza, culpa ou raiva; e incluir o parceiro nas conversas e decisões, reconhecendo que ambos sofrem a perda. O tratamento clínico deve ser acompanhado de apoio psicológico, encaminhamento a grupos de apoio ao luto perinatal, e validação do luto — “toda perda gestacional é significativa, independentemente da idade gestacional”, afirma.

Além disso, os rituais simbólicos de despedida como nomear o bebê, guardar lembrança, oração, devem ser respeitados conforme a vontade da família e suas crenças. A equipe médica também deve orientar sobre o plano de recuperação física, retorno da menstruação, novo planejamento gestacional e oferecer acompanhamento psicológico quando indicado.

 

Nova gestação: avaliação e tempo adequado

Para uma nova tentativa de gestação, Denise Lara destaca a importância de uma avaliação completa: exame clínico geral, controle de doenças crônicas, investigação de causas da perda anterior (cariótipo do casal, trombofilias, hormônios, infecções, avaliação anatômica do útero), ajustes nutricionais e de hábitos de vida, atualização vacinal e suporte emocional ao casal. O intervalo recomendado entre a perda e nova gestação depende da situação: para perdas precoces, muitas vezes 1 ou 2 ciclos menstruais podem ser suficientes; em perdas mais avançadas ou que exigiram procedimento, o intervalo pode ser de 3 a 6 meses, conforme orientação individualizada.

 

Prognóstico

A especialista pondera que, quando tratadas adequadamente, a maioria das mulheres que sofreram uma perda gestacional consegue ter uma nova gestação bem-sucedida. Estudos indicam que, mesmo após perdas repetidas, a chance de gestação saudável futura pode alcançar até 70%. 

 

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