Pesquisa mostra
que 72% dos brasileiros se sentem estressados no trabalho e 32% sofrem da
síndrome de Burnout
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Não é de hoje que os afastamentos do trabalho por
doenças mentais se tornaram uma crise de saúde pública no Brasil. Em 2023,
dados do Ministério da Previdência Social indicaram um aumento de 38% nesses
afastamentos. Em 2024, a situação se agravou ainda mais: foram concedidas 472
mil licenças médicas por problemas psicológicos, um crescimento de 68% em
relação ao ano anterior.
Esses dados se referem exclusivamente a contratações
no regime CLT, o que pode indicar uma subnotificação do problema, uma vez que
prestadores de serviços autônomos ou liberais não têm acesso a esse mecanismo
por meio dos seus tomadores de serviço. Assim, esses profissionais são
responsáveis por si mesmos, em uma mescla de pessoa jurídica com pessoa física.
Além do impacto humano, o custo financeiro também é
expressivo. Em média, cada afastamento dura três meses, gerando um custo de
aproximadamente R$ 3 bilhões ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). No
cenário global, os quadros de sofrimento psíquico são responsáveis pela perda
de 12 bilhões de dias úteis anualmente, resultando em um prejuízo estimado de
US$ 1 trilhão para a economia mundial.
“O aumento reflete não só o agravamento das condições
de trabalho, mas também a conscientização sobre o direito à saúde mental.
Empresas de todos os setores precisam urgentemente reavaliar suas práticas,
pois esse direito fundamental ainda é negligenciado em muitos ambientes
corporativos”, destaca a psicanalista e Presidente do Instituto de Pesquisa de
Estudos do Feminino e das Existências Múltiplas (Ipefem), Ana Tomazelli.
Empresas ou trabalhadores:
quem deve mudar?
Diante desses números alarmantes, a pergunta surge:
“O problema está no ambiente de trabalho ou nos profissionais que
adoecem?”
48% dos entrevistados afirmam estar mentalmente
esgotados, entre eles, a maioria tem entre 18 e 29 anos, segundo o estudo da Future Fórum realizado com mais de 10 mil
trabalhadores nos Estados Unidos, Reino Unido, Austrália, França, Alemanha e
Japão. No Brasil, a realidade não é diferente. Segundo a International Stress Management Association (ISMA-BR), 72% dos brasileiros se sentem estressados no trabalho, e 32% sofrem da
síndrome de Burnout.
Ana Tomazelli ressalta que “Se o problema estivesse
apenas nos indivíduos, o aumento exponencial dos afastamentos não faria
sentido. Esses números evidenciam um modelo de trabalho que, muitas vezes,
ignora os limites humanos e perpetua uma cultura de produtividade tóxica.
Jornadas exaustivas, cobrança excessiva por resultados, sobrecarga de demandas,
falta de reconhecimento e um ambiente onde a vulnerabilidade é vista como
fraqueza são alguns dos principais gatilhos para o esgotamento mental”.
A especialista reforça que a responsabilidade pela
mudança é coletiva e não pode recair apenas sobre o indivíduo. “Empresas que se
preocupam verdadeiramente com a sustentabilidade da sua força de trabalho,
precisam ir além de palestras ocasionais sobre bem-estar e se comprometer com
uma transformação real da cultura organizacional”.
Direito inegociável: 70% dos
profissionais demonstram interesse em trabalhar para empresas que priorizam a
saúde mental
Se antes as empresas tinham total controle sobre
quem contratar, hoje, são os próprios profissionais que pesquisam a
credibilidade das organizações antes de se candidatarem.
Em grupos de emprego em aplicativos de mensagens,
além de compartilhar vagas, os candidatos discutem sobre o clima organizacional
e a qualidade de vida dentro das empresas. Esse comportamento reflete uma
mudança estrutural no mercado de trabalho: cada vez mais pessoas evitam
ambientes tóxicos que possam comprometer sua saúde psicológica.
Números afirmam essa tendência. Conforme o Relatório Tendências Gestão de Pessoas 2024, 70% dos profissionais demonstram interesse em trabalhar para empresas
que priorizam a saúde mental.
“Isso demonstra que a preocupação com o bem-estar
não é apenas uma tendência de uma nova geração, mas um critério essencial na
decisão profissional. Já não basta oferecer benefícios pontuais, como um dia de
folga ou um aplicativo de meditação. O que os profissionais buscam é um
ambiente onde se sintam valorizados, ou seja, um verdadeiro senso de
pertencimento. Quem se sente acolhido e respeitado em suas necessidades
psicológicas permanece por mais tempo, produz melhor e, acima de tudo, torna-se
agente de inovação dentro da empresa”, pontua Ana Tomazelli.
Um ambiente organizacional saudável reduz turnover,
minimiza afastamentos e aumenta o engajamento. E esse não é um discurso
motivacional vazio — de acordo com a OMS, para cada US$ 1 investido em programas de saúde mental, há um retorno
de US$ 4 em produtividade.
Da teoria à prática: como
construir um ambiente de trabalho mentalmente saudável
Mas, afinal, como sair do discurso e implementar
mudanças reais? “O primeiro passo é reconhecer que saúde mental não é um
“extra”, mas um pilar essencial da gestão. Para isso, é fundamental adotar
iniciativas práticas que promovam um ambiente de trabalho mais saudável”,
explica a psicanalista e Presidente do Instituto de Pesquisa de Estudos do
Feminino e das Existências Múltiplas (Ipefem), Ana Tomazelli..
A flexibilidade e a autonomia, por exemplo,
permitem que os profissionais tenham horários adaptáveis e modalidades híbridas
ou remotas, o que pode reduzir o estresse e melhorar a qualidade de vida. Além
disso, segundo Ana Tomazelli, lideranças capacitadas fazem toda a diferença,
pois gestores treinados conseguem identificar sinais de esgotamento e criar
espaços de diálogos seguros.
Outra medida importante é garantir uma carga de
trabalho realista, evitando que os profissionais operem constantemente no limite.
Da mesma forma, uma cultura organizacional baseada em feedbacks construtivos
favorece o reconhecimento e a comunicação clara, reduzindo inseguranças e
ansiedade.
“Oferecer apoio profissional por meio de acesso a psicólogos, programas de suporte emocional e momentos de desconexão contribui significativamente para o bem-estar. O maior erro das empresas que negligenciam a saúde mental é acreditar que o problema pode ser resolvido com discursos ou ações pontuais. Mas os números não deixam dúvidas: a forma como o trabalho é estruturado está adoecendo as pessoas. E isso não afeta apenas os indivíduos, mas toda a organização. Tratar a saúde mental como prioridade não é só uma demanda dos profissionais—é uma necessidade urgente para a sustentabilidade dos negócios”, conclui Ana Tomazelli.
Ana Tomazelli - psicanalista e Presidente do Ipefem (Instituto de Pesquisas & Estudos do Feminino e das Existências Múltiplas), uma ONG de educação em saúde mental para mulheres no mercado de trabalho. Também é co-fundadora do Ipecre - Instituto de pesquisa e estudos em Ciência da Religião, uma ONG que promove conhecimento para a garantia das liberdades religiosas e promoção da paz mundial. Mentora de Carreiras, Executiva em Recursos Humanos, por mais de 20 anos, liderou reestruturações de RH dentro e fora do país. Com passagens pelas startups Scooto e B2Mamy, além de empresas tradicionais e consolidadas como UHG-Amil, Solera Holdings, KPMG e DASA (Diagnósticos da América S/A). Mestranda em Ciências da Religião pela PUC-SP e membro do grupo de pesquisa RELAPSO (Religião, Laço Social e Psicanálise) da Universidade de São Paulo, também é pós-graduada em Recursos Humanos pela FIA-USP e em Negócios pelo IBMEC-RJ. Formada em Jornalismo pela Laureate - Anhembi Morumbi. Linkedin || Instagram || TikTok.
Instituto de Pesquisa de Estudos do Feminino – IPEFEM
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