A violência nos
relacionamentos abusivos nem sempre é evidente. Muitas vezes, ela se manifesta
de forma sutil, especialmente no âmbito da comunicação. Quando falamos em
violência verbal, a primeira imagem que pode vir à mente são os xingamentos e
ofensas explícitas.
No entanto, essa
forma de agressão se apresenta de diversas maneiras, incluindo gritos,
deboches, imitações e até mesmo o tom de voz usado em determinadas situações. E
o mais preocupante: como não deixa marcas físicas, costuma ser ignorada ou
minimizada.
“Eu sou assim” não é desculpa
É importante
compreender que a violência verbal não se limita às palavras duras ditas em
momentos de raiva. O deboche constante, o menosprezo disfarçado de piada, a
ridicularização dos trejeitos e das falas da outra pessoa são formas de
descredibilização que minam a autoestima e o bem-estar psicológico da vítima.
Pequenos gestos,
como risadinhas sarcásticas e expressões faciais de desdém, também carregam um
impacto emocional significativo. Além disso, frases como “você nunca faz nada
certo”, “ninguém mais te aguenta” ou “se eu fosse embora, você não conseguiria
nada sozinha” são exemplos de violência verbal mascarada como “opinião” ou
“sinceridade”. Comentários depreciativos e manipuladores, quando repetidos ao
longo do tempo, fazem com que a vítima internalize essa narrativa e passe a
duvidar da própria capacidade.
Muitos abusadores
se justificam dizendo que “são assim”, que “falam alto mesmo” ou que “não têm
intenção de ofender”. No entanto, quando a comunicação de alguém ultrapassa os
limites do que o parceiro considera aceitável, isso se torna uma forma de
violência. Não importa se outras pessoas toleram determinado comportamento - se
você se sente ferida ou humilhada, isso deve ser levado a sério.
Esse tipo de
manipulação se encaixa no que chamamos de gaslighting, uma estratégia de abuso
psicológico na qual a vítima é levada a questionar sua própria percepção da
realidade. Quando você diz que algo a machucou e ouve em resposta “você está
exagerando”, “isso é coisa da sua cabeça” ou “nossa, agora não posso mais nem
brincar”, é um sinal de alerta.
Como
estabelecer limites
Estabelecer
limites é fundamental. Expressar claramente o que é ou não aceitável dentro da
relação pode ser um primeiro passo para evitar a normalização dessas agressões.
Se, após essa conversa, a pessoa insiste em ultrapassar esses limites, o
problema não está em você ser “sensível demais” ou “não saber lidar com
brincadeiras”, mas sim em uma dinâmica abusiva que precisa ser interrompida.
Em um
relacionamento saudável, as pessoas ajustam sua forma de se comunicar para
respeitar os sentimentos do outro. Se alguém continua a agir de forma agressiva
e desrespeitosa mesmo após ser avisado, isso não é “jeito de falar” - é falta
de consideração e abuso emocional.
Violência
verbal é real e deixa marcas
Casos de violência
verbal têm sido cada vez mais debatidos, especialmente com o aumento da
conscientização sobre relacionamentos abusivos. Dados recentes do Fórum Brasileiro de Segurança Pública indicam que, em 2024, 67% das mulheres relataram ter
sofrido algum tipo de violência psicológica ou verbal dentro de
relacionamentos.
A banalização
dessas agressões leva muitas vítimas a acreditarem que não há problema em serem
constantemente desrespeitadas e invalidadas. O abuso verbal pode não deixar
hematomas visíveis, mas seus efeitos emocionais e psicológicos são profundos.
O silenciamento da
vítima, a insegurança constante e a destruição gradual da autoestima são
consequências graves desse tipo de violência. Muitas mulheres saem dessas
relações com crises de ansiedade, depressão e um medo permanente de errar.
Por isso,
identificar e nomear essas agressões é um passo essencial para rompê-las.
Romper com um relacionamento abusivo nunca é simples, mas é necessário para
preservar sua saúde emocional.
Se você reconhece
esses sinais em seu relacionamento ou no de alguém próximo, busque apoio.
Conversar com amigos, familiares e procurar ajuda especializada pode ser
determinante para sair desse ciclo. O Ligue 180, canal de denúncia de violência
contra a mulher, pode ser um primeiro passo; além disso, procure redes de apoio
e organizações que acolhem vítimas de relacionamentos abusivos.
Lembre-se:
respeito e diálogo saudável são pilares de qualquer relação. Você não precisa -
e não deve - aceitar menos do que isso.
Mayra Cardozo - terapeuta e advogada especialista em gênero e sócia do escritório Martins Cardozo Advogados Associados. Idealizadora do método Alma Livre, criado para auxiliar mulheres a saírem de relacionamentos tóxicos e abusivos.
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