segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

A eterna busca pela produtividade


Está aí uma dor crônica de 10 entre 10 empresas que eu trabalho: a busca pela tal produtividade. Mas sinto que, na verdade, o mercado vê muito mais esse tema como uma palavra-chave do mundo corporativo do que de fato como um problema transversal à nossa sociedade. E se a gente quiser resolver, vai precisar aprofundar e entender de onde vem a raiz da falta de produtividade do Brasil e do brasileiro.

Segundo pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a produtividade da indústria brasileira acumulou queda de 1,2% entre 2013 e 2023. E continua caindo – 1,4% no primeiro trimestre e 0,3% no segundo trimestre deste ano.

O envelhecimento da sociedade brasileira e a redução da parcela economicamente ativa exigirão do país mais recursos para garantir saúde, moradia, enfim, sustento com qualidade de vida para essa população. Em poucas palavras, a única forma de fechar a conta e preservar o crescimento do PIB é com aumento da produtividade.

Usando como comparativo: nos Estados Unidos, o índice de produtividade é de 2% e o número se mantém há 100 anos. Óbvio que eles vivem seus problemas na política, no aumento da desigualdade e outros; mas, lá, tem uma coisa que funciona melhor: a educação. Já no Brasil, conforme o Instituto Brasileiro de Economia (FGV/IBRE), o índice brasileiro é em média de 0,3% ao ano, medido entre 1981 e 2019.

Assim como nos Estados Unidos, na Coreia do Sul o investimento em educação é alto. Até meados dos anos 1970, o país tinha a mesma produtividade que o Brasil. Hoje, graças a um novo modelo educacional, o índice de lá é três vezes maior que o daqui.

Não que os números brasileiros não sejam otimistas.

Segundo o Ministério da Educação, com base no Censo de Educação Superior, 2023 teve 9,9 milhões de alunos matriculados, o maior registrado em nove anos.

Isso representou um crescimento de 5,6% em relação a 2022. Mas, se aprofundarmos a leitura, o ranking de competitividade de 64 países – avalia economia, eficiência do governo, negócios, infraestrutura etc. – da escola suíça IMD, coloca o Brasil na posição 61. Educação e qualidade precisam caminhar juntas e, infelizmente, sabemos que a qualidade da nossa educação é deficitária.

Atualmente, os profissionais estão aquém das habilidades necessárias para a transformação da economia, da cultura, para desenvolver e aderir às novas formas de trabalho, como a digitalização e o fomento da IA. As empresas já entenderam que isso gera escassez de talentos e, consequentemente, uma grande dificuldade em contratar pessoas que realmente estejam prontas para o mercado.

Cada vez mais, as empresas vão se tornar empresas-escola. E quando eu digo empresa escola é quebrar as barreiras organizacionais e promover a educação para seus colaboradores, mas também para seus consumidores e fornecedores.

Grandes empresas como Google e Amazon declaram que a eficiência operacional se deve ao investimento em educação corporativa. A IBM assumiu o compromisso de treinar 30 milhões de pessoas com foco em IA. Até aqui, já treinou globalmente 11,5 mi. Seu objetivo maior é fomentar a inovação e garantir vantagem competitiva. Por aqui, o caminho para a consolidação da empresa escola vai se pavimentando. No levantamento do Linkedin, 80% das “25 Melhores Empresas Para Carreira no Brasil”, de 2024, investem em educação para seus colaboradores. Em pesquisa da HR First Class desse ano, 73% dos entrevistados afirmam que a educação corporativa beneficia todo o ecossistema das empresas, e 95% acreditam nela como o melhor instrumento para alinhar os colaboradores à cultura da empresa e reter talentos – aposta que também é feita pela Deloitte, com seus programas de desenvolvimento.

Voltando um pouco ao exemplo norte americano, um profissional lá consegue produzir até cinco vezes mais do que o brasileiro. Ele não trabalha menos, mas em quantidade de horas compatível. Claro que também recebe capacitação, tem mais acesso a recursos tecnológicos e atua sob práticas gerenciais avançadas.

Em países produtivos, as empresas ineficientes não conseguem sobreviver, são engolidas pelo mercado. Mas, que tipo de produtividade almejamos?

Há um ano, pelo menos, começamos a falar sobre a produtividade tóxica – aquela que queremos a qualquer custo – e o quanto isso impacta negativamente na saúde mental das pessoas. E que, além de tudo, não é sustentável, tem vida curta. Não é por aí. Trabalhar mais não significa trabalhar melhor.

Com mais de 15 anos de experiência em educação corporativa junto a grandes organizações, acredito que a virada de chave vai ocorrer na mudança de lentes para o trabalho, encarando como algo completamente diferente do que fizemos até hoje.

A gente vai ter que reinventar as formas de trabalhar, se desenvolver, se capacitar, reaprender, desaprender muita coisa pra reaprender de novo. Temos a inteligência artificial, tecnologias e metodologias ágeis, a própria inovação, o design, enfim, instrumentos e recursos que nos ajudarão nessa transformação, auxiliando a encarar os desafios e as pautas diárias – não trabalhando mais, mas trabalhando melhor. E tudo isso passa pela educação com qualidade, seja a básica, seja a formação e o aperfeiçoamento dos profissionais.

E é aí que entra talvez o grande pulo do gato das empresas que queiram enfrentar com profundidade o problema da produtividade. Mas se enganaram os responsáveis ​​por RH que isso se resolve com um treinamento (barato e rápido, e que normalmente vem de alguma escola executiva que encara a educação como uma promoção na Black Friday). Estamos falando de qualidade e consistência. É entender essa questão como algo sistêmico e profundo e continuar a jornada dos colaboradores com foco no desenvolvimento.

Gosto muito da futurista Amy Webb. No South by Southwest 2024, ela nos classificou como GEN T (transitional generation ou uma geração de transição). Hoje, prefiro essa ideia do que focar apenas nas gerações X, Y e Z. É bater na mesma tecla, literalmente.

Prefiro nos ver como uma única geração e, juntos, encontrar a melhor forma de trabalhar; reinventar o trabalho para que ele, de fato, seja consistente para nosso desenvolvimento e crescimento enquanto nação. E as empresas terão um papel quase que social de entregar a educação para a sociedade.

É um pouco sobre todos nós.


Mariana Achutti - fundadora e CEO da newnew e uma das principais referências em educação corporativa no Brasil. Também fundou a Sputnik e foi sócia da Perestroika. Em sua jornada de mais de 15 anos, contribuiu para transformar o universo corporativo através da educação criativa e disruptiva em empresas como Google, Facebook, Globo, O Boticário, Ambev, entre outras. Mari é selo Top Voices no LinkedIn e se destaca nos principais veículos de mídia do país discutindo temas como empreendedorismo, novas lideranças e maternidade.



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