O trabalho dentro de um hospital é complexo devido
a diversas camadas de atendimento que são necessárias para abranger as
necessidades de todos os pacientes. É preciso gerenciar altas complexidades,
como cirurgias de emergência e a necessidade de utilização de UTI, bem como
demandas eletivas para procedimentos pré-agendados e consultas marcadas com
especialistas. No entanto, é o fluxo do Pronto Atendimento (PA) que escancara o
maior desafio da rotina hospitalar.
O Pronto Atendimento é o local que concentra queixas
distintas de pacientes que buscam atendimento com graus de complexidade
diferenciados. Em uma mesma porta de entrada, encontram-se pessoas com dor de
cabeça, dor de garganta, diarreia, até pacientes com crises renais graves,
dores agudas no peito e suspeita de infarto, confusão mental e a possibilidade
de Acidente Vascular Cerebral, hemorragias. Por essas peculiaridades é que o
Pronto Socorro (PS) é um setor altamente delicado de atendimento em saúde.
Ninguém procura o hospital se está bem. Todos possuem
queixas legítimas, estão sensibilizados e precisam ser bem atendidos. No
entanto, um paciente que está apenas com cefaleia simples, sem outros sinais de
complicação, não terá prioridade frente a casos de pacientes com dor no peito,
por exemplo.
Uma das explicações para a grande demanda e
complexidade de atendimento no PS é a falta de estrutura de qualidade nas
Unidades Básicas de Saúde. Muitos dos pacientes que procuram o setor de
emergência hospitalar têm queixas que deveriam ser atendidas em consultas da
especialidade de família ou clínica médica. São atendimentos que deveriam ser
realizados pela atenção básica em saúde.
Há diversas campanhas governamentais, iniciativas
municipais, principalmente, para alertar cidadãos sobre a busca mais efetiva de
atendimento de saúde. Instituições particulares e beneficentes também têm se
engajado, mas não é apenas a informação que precisa ser repassada de forma
precisa. De nada adianta o cidadão saber aonde deve ir, se o atendimento não
ocorre. São muitos os cenários em que o paciente busca atendimento no setor
primário, mas não consegue uma consulta ou mesmo tem seu agendamento marcado
para dali alguns meses, o que também dificulta o acompanhamento eficaz.
A própria relação dos brasileiros com a saúde
também impacta nesse fluxo. Muitos pacientes não possuem mais um médico de
referência, que conhece seu histórico de saúde e seria um ponto de contato
nesses momentos e de distribuição da carga de atendimento. Assim, quando há
alguma queixa ou algo que chama a atenção na saúde, é nos prontos atendimentos
que eles buscarão apoio.
Para além de apontar dificuldades, é preciso buscar
soluções. Investir em ferramentas de gestão do PA parece o melhor caminho. Uma
triagem eficaz é ponto crucial para que isso ocorra. Os profissionais que estão
à frente desta tarefa precisam ser muito bem treinados tecnicamente, mas também
possuir habilidades comportamentais como paciência, empatia e boa tomada de
decisões quando o cenário fica mais complexo.
Grande parte das instituições de saúde trabalha com
o Protocolo de Manchester, que é um método de classificação para determinar
quais são os atendimentos prioritários na emergência. Com ele, quem chega ao PA
é identificado por cores, dependendo da urgência de atendimento. Pacientes com
a cor vermelha devem ser atendidos imediatamente. Aqueles com a cor laranja
exigem atenção, e devem ser atendidos com prazo de 10 minutos, aproximadamente.
A cor amarela indica casos não imediatos, em que a espera pode chegar a 1 hora.
A identificação verde é para pacientes menos graves, com espera estimada em 2
horas. E a cor azul é para quadros simples de saúde, com espera de até 4
horas.
Esse protocolo foi inventado no início da década de
1990 e começou a ser implantado em hospitais do Reino Unido. O método é eficaz,
mas, ao longo dos anos, vem dividindo experiências com outros formatos de
classificação e atendimento. Um deles é o chamado Fast Track, conceito que
abrange a necessidade de acelerar processos médicos e garantir celeridade no
atendimento ao paciente. Para funcionar, é essencial que a avaliação no Pronto
Atendimento seja criteriosa.
Na prática, o Fast Track alivia a demanda no PS ao
prever um espaço separado em que pacientes com menor complexidade são
encaminhados. Nesse local, todos são atendidos com mais rapidez, já que as
queixas são simples e preveem também protocolos mais fáceis de administrar. É
como se houvesse a possibilidade de acelerar o atendimento a partir da
identificação de que o problema de saúde não necessita de internação ou de intervenções
invasivas. A ideia é trazer a eficiência como ponto central para o paciente,
sem deixar de lado segurança, qualidade e atendimento especializado.
Sabemos que daqui para frente outros tantos
protocolos e iniciativas que buscam melhorar a experiência do atendimento do
paciente surgirão. A inteligência artificial deve cada vez ser mais aplicada e
servir como um apoio nesse sentido. A própria relação com a saúde vem mudando
no mundo todo. Mas o que não vai mudar e precisamos ter clareza é que os pacientes
estão ali em busca de acolhimento. Todos os pontos de melhoria e inovação devem
buscar oferecer assistência e resolutividade que garantam a cada um que está
ali ser visto em sua individualidade. Cada esforço que contribui para a
otimização de recursos hospitalares e para a diminuição da pressão no sistema
de saúde é válido. E o trabalho é coletivo. Precisamos todos — pacientes,
profissionais e gestores — nos unirmos nesse caminho.
José Arthur Brasil -
coordenador médico do Hospital São Marcelino Champagnat
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