sexta-feira, 26 de abril de 2024

Altitude no futebol: especialista explica impactos para atletas em localidades acima do nível do mar

 

Alterações no desempenho, falta de ar e sensação de fadiga muscular são efeitos da altitude, destaca professor de Educação Física do CEUB

 

Estrelas do futebol mundial, jogadores brasileiros enfrentam dificuldades com a respiração e a velocidade da bola quando as partidas acontecem em locais acima do nível do mar. Um dos receios durante os sorteios da Libertadores e da Sul-Americana é serem designados para enfrentar, logo na fase de grupos, equipes que tenham estádios localizados em regiões de altitude elevada. 

A atual edição da Copa Libertadores retoma o desafio para os jogadores brasileiros: subir até os 3.640 metros de altitude em alguns jogos que acontecem no Equador. Tácio Santos, professor de Educação Física do Centro Universitário de Brasília (CEUB), explica os principais efeitos da altitude na rotina de atletas do futebol.
 

Confira entrevista, na íntegra:
 

Quais são os efeitos da altitude no corpo humano?

TS: TS: A altitude apresenta uma menor concentração de oxigênio no ar, o que resulta numa reduzida disponibilidade de oxigênio para o corpo humano. Essa redução afeta a capacidade de mobilização de energia aeróbia, que é a energia que requer oxigênio para suas reações químicas.
 

Quais as principais consequências da falta de ar no corpo humano?

TS: Com menos oxigênio disponível, há uma diminuição na capacidade de gerar energia aeróbia. Embora o futebol envolva momentos nos quais usamos energia anaeróbia, que não depende de oxigênio para ser liberada, a maior parte do tempo a sustentação energética ocorre através da energia aeróbia.
 

Quais as principais dificuldades que atletas de alto nível, que não estão acostumados a jogar nessas condições enfrentam?

TS: Atletas de alto nível enfrentam uma dificuldade comum: ao usar mais energia anaeróbia do que aeróbia, acabam enfrentando efeitos indesejados. Isso inclui respiração ofegante e uma sensação de queimação nos músculos, como coxas e glúteos. No final, resulta em uma sensação de peso nas pernas e no corpo, limitando o desempenho esportivo.
 

Existe alguma estratégia específica que a preparação física adotar para lidar com as condições de altitude?

TS: As estratégias não estão tanto ligadas à preparação física, mas sim à fisiologia. Uma das mais comuns é o uso de dilatador nasal. A questão principal é que a eficácia desse recurso varia muito de pessoa para pessoa. Por isso, sua validação científica tem suas limitações. No entanto, geralmente é uma das abordagens adotadas.
 

Muitas equipes vão alguns dias antes para se adaptar a região. Acredita que isso pode diminuir os prejuízos para os jogadores?

TS: Antigamente, era comum as equipes chegarem alguns dias antes em regiões de elevada altitude para se adaptarem à menor disponibilidade de oxigênio. No entanto, agora sabemos que a adaptação, como o aumento na produção de glóbulos vermelhos, requer mais tempo do que o calendário muitas vezes permite. Então, hoje em dia, muitas equipes adotam o oposto: tentam chegar o mais próximo possível do momento da partida. Isso evita que o organismo perceba imediatamente a diferença na disponibilidade de oxigênio. A única consideração feita antes da partida não é tanto pela respiração, mas sim pelo comportamento da bola, que também é afetado pela composição do ar. Assim, o tempo limitado que as equipes passam antecipadamente é mais para os jogadores se acostumarem com o tempo de reação e a velocidade da bola - não tanto para questões respiratórias.
 

Jogar na altitude pode ocasionar algum problema de saúde para o jogador?

TS: No caso em que o atleta não tenha predisposições ou problemas de saúde, e não esteja se recuperando de algum problema, não é esperado que haja efeitos prejudiciais para a saúde em si. O que normalmente ocorre são os efeitos das alterações no desempenho físico. Isso pode resultar em um desgaste maior tanto muscular quanto metabolicamente, levando a uma necessidade aumentada de recuperação após a partida. Se essa demanda por tempo de recuperação adicional ou uma recuperação mais cuidadosa não for atendida, então sim, os treinos ou partidas subsequentes podem resultar em menor desempenho físico, maior desgaste muscular, ou até mesmo lesões.
 

Os jogadores podem ter suas habilidades reduzidas. Como saltar, correr, disputar jogadas, raciocínio rápido?

TS: É fundamental compreender que a energia aeróbia é a principal fonte de energia para todas as células do nosso organismo. Isso não só influencia as capacidades físicas necessárias para o futebol, como saltar, correr e mudar de direção, mas também afeta o raciocínio lógico e a tomada de decisões. Esses efeitos têm impacto tanto no nível físico quanto no intelectual. Considerando que uma partida de futebol requer tanto esforço físico quanto intelectual, é importante reconhecer que ambas as dimensões são afetadas, não apenas a física.
 

Pode se dizer que a altitude seria um “doping natural” para os atletas já acostumados?

TS: Eu evitaria o termo 'doping natural' ao se referir à altitude e outras condições climáticas, como calor, frio, umidade do ar, vento e assim por diante. Isso pode parecer desmerecer uma vitória justa de uma equipe que pertence a uma localidade com um ambiente diferente daquele em que é visitante está habituada. De certa forma, pode haver uma vantagem para a equipe local, que está mais adaptada ao ambiente em que vive, mas o mesmo pode ser dito sobre outras situações climáticas e ambientais, como mencionei. Essas são questões que fazem parte do jogo!

 

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