Retorno financeiro
perde importância e profissionais buscam mais qualidade de vida
Desistir do trabalho para priorizar a vida pessoal.
Esse é o conceito de “quiet quitting", que, em
português, significa desistir silenciosamente. O termo, que viralizou no TikTok
quando um americano afirmou que “o trabalho não é a sua vida”, foi
compartilhado milhares de vezes e deu início a uma ampla discussão nas redes
sociais. A prática sintetiza a decisão tomada por alguns profissionais de
abandonar determinadas práticas de trabalho prejudiciais à rotina pessoal, como
passar do horário ou responder mensagens fora do expediente, na busca por mais
qualidade de vida.
Desde o início da pandemia, um número crescente de
jovens trabalhadores demonstram estar cansados de não receber reconhecimento e
compensação pelas horas extras de trabalho. Para o especialista em carreira
Fábio Vizeu, doutor em Administração e professor do mestrado e doutorado em
Administração da Universidade Positivo (UP), tem se tornado cada vez mais comum
desistir do emprego em busca de mais bem-estar. “As pessoas optam por abandonar
carreiras para ter mais qualidade de vida, condição que seus empregos não
estariam proporcionando. É um movimento voltado para a desistência consciente,
planejada. Uma desistência em razão de outros valores, que muitas vezes ficam
em segundo plano por causa de carreiras que exigem muito”, ressalta.
Ainda segundo o especialista, essa é a consequência
de uma nova concepção de vida que está relacionada a uma crise do modelo de
carreira tradicional. “Na sociedade contemporânea, as pessoas passaram a optar,
conscientemente, por seguir carreiras menos estressantes e menos competitivas.
Mesmo que isso signifique estacionar em posições não tão altas ou ter uma
remuneração menor”, detalha. Vizeu explica que, mesmo ganhando menos,
esses profissionais têm mais tempo para passear com os filhos, familiares e
amigos, e para se dedicar a atividades que trazem muito mais prazer e
tranquilidade. Esse tempo extra pode até ser usado para ter mais saúde.
Mudanças no comportamento
social
Todas essas questões estão diretamente relacionadas
ao que tradicionalmente se conhece por carreira, que segue o modelo “fordista”.
“Essa era a regra do século passado - e ainda é em muitas empresas -, mas hoje
observamos alguns movimentos questionando esse modelo, e a demissão silenciosa
certamente é um deles”, complementa.
Para o especialista, no entanto, essa nova tendência
também compreende alguns riscos, tanto para o empregado quanto para o
empregador. “A leitura equivocada que o empregador pode ter é achar que isso é
moda, que é passageiro, que logo voltaremos ao modelo antigo. Mas a verdade é
que essa nova forma de pensar veio para ficar. Por isso, as empresas precisam
começar a buscar formas de colocar como prioridade a qualidade de vida de seus
colaboradores”, argumenta. Isso acontece porque os profissionais já não estão
preocupados apenas com o retorno financeiro.
Por outro lado, os colaboradores devem estar
cientes de todas as variáveis que têm influência em uma decisão importante como
a de desistir de um emprego. “Se isso não acontecer e a demissão ocorrer sem
que haja estabilidade para isso, essa escolha pode levar a uma crise
financeira”, alerta.
O especialista afirma que a demissão silenciosa
representa um novo paradigma e que ela só começou a acontecer devido a uma
crise do modelo de carreira tradicional, baseado na alta remuneração e na
ascensão vertical. “As pessoas estão tomando a decisão correta ao optar por não
ter mais o trabalho como prioridade em suas vidas. O trabalho faz parte da
vida, mas não pode se contrapor a tantos outros fatores importantes. Essa visão
é uma maturidade que começa a chegar agora ao mundo do trabalho”, finaliza.
Se, por um lado, é vantajoso poder escolher o cargo
ou função que melhor se encaixa em cada momento da vida, por outro, pode ser
arriscado trocar muitas vezes de emprego em pouco tempo. Alguns contratantes
desistem de bons candidatos quando percebem que eles não estiveram por muito
tempo em suas ocupações. Para a diretora de Gente & Gestão (RH) na
Tecnobank, Michaela Vicare, esse pode ser um problema na hora de disputar uma
vaga. "Do lado das empresas, há um movimento cada vez mais forte no
sentido de melhorar a qualidade de vida dos colaboradores. Por isso mesmo, os
headhunters analisam bem o perfil dos candidatos antes de contratar - e muitos
têm evitado contratações de pessoas com muitos empregos diferentes no
currículo”, alerta.
Universidade Positivo
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