segunda-feira, 27 de abril de 2020

É preciso coragem para sentir medo!



A partir da elaboração dos meus incômodos sobre o momento atual, pude organizar algumas ideias para compartilhar meus aprendizados aqui, que acredito serem úteis para outras pessoas que estejam enfrentando situações similares, assim desejo!

Tenho pensado muito sobre quantas crises existem em uma só e de que crise estamos falando quando nos referimos ao momento atual. Já se passaram algumas semanas, já nos organizamos usando dicas de como fazer home office, organizar tarefas e prioridades e tantas outras dicas e cursos que estão disponíveis. Bem, podemos afirmar que estamos basicamente adaptados a rotina pessoal e profissional. Também estamos descobrindo e reinventando situações para amenizar o sofrimento gerado pelo isolamento, (des) preparados economicamente para os próximos meses, enfim, parece que estamos lidando melhor com a situação do que antes.

Agora, a alteração da nossa forma de trabalho para algo muito diferente de como fazíamos antes me gerou grande desconforto. Precisei levar um tempo para compreender e assimilar as perdas que ali existiam. Sim, uma das crises que enfrentei foi justamente ter que fazer um luto do papel profissional, ou pelo menos da configuração que ele tinha antes disso tudo começar.

Compartilho a minha rotina profissional para que entendam o impacto que foi para mim: Acordar todos os dias, viajar para diferentes empresas, com amigos do trabalho no carro, dividindo experiências, contando sobre a vida, rindo e trocando confidências. Chegar e encontrar diferentes grupos e pessoas queridas, de diferentes empresas e cidades, e estados, com diferentes culturas, comidas, hábitos, sotaques, além de situações e problemas diversos. Abraçar e estar próxima das pessoas, ter a convivência afetiva, conversar no almoço, depois, a volta para casa, a despedida até o estacionamento, a troca de olhares de “se cuida na estrada”…

Tudo isso, foi substituído por reuniões on line uma após a outra, ligações, alinhamentos, ou seja, o trabalho não para. E não há problema algum nisso, a única questão que me deparei foi como acomodar essa alteração, de uma rotina movimentada e cheia de contatos afetivos para outra também efetiva mas limitada a um mesmo espaço, sem o contato, sem os abraços, sem o “fazer junto” lado a lado… Parecia que eu não estava mais “trabalhando”, apesar de estar o tempo todo produzindo e focada nos clientes assim como antes.

Levei um tempo para perceber o que de fato me incomodava e então passar a encontrar novas respostas para lidar com a falta da convivência afetiva, do olho no olho, do toque que conforta, da proximidade física e tantas outras faltas que sentia. Talvez porque eram tão “naturais” que nem percebia o quanto eram relevantes para mim.

Assim como eu passei por este processo, tenho ouvido de muitos clientes e amigos o quanto acomodar o atual formato de trabalho está sendo um grande desafio também, chegando a afetar a forma como se reconheciam em seu papel profissional também.

Ouvi dúvidas como: “será mesmo que devemos dar espaço para sofrer frente a esse caos que estamos vivendo?”, ou “Já temos tantos problemas para ficar criando mais um, se adapta aí e pronto”. Mas é aí que está o erro, há um intenso sofrimento emocional causado pela abrupta mudança, pela perda da situação antiga, o que pode acarretar inúmeras reações fisiológicas e psicológicas, como ansiedade e depressão entre tantas outras. E isso jamais deve ser ignorado!

Por isso, achei relevante escrever esse texto como uma forma de ajudar com esses incômodos. A estratégia que adotei para lidar com essas angústias foi explorar ao máximo como eu me sentia e do que realmente sentia falta, isto me permitiu ter um grau de segurança maior para seguir.

Segundo J. Bowlby, psiquiatra criador da Teoria do Apego, situações de mudanças de forma involuntária são uma das experiências mais ameaçadoras e intensamente dolorosas que o ser humano pode sofrer, pois são penosas não só para quem a experimenta como também para quem está envolvido, devido ao sentimento de impotência para ajudar. Se não nos darmos conta de que estamos vivendo uma situação dessas, lidamos com ela de maneira inadequada, dando respostas ineficientes (ou deixando de dá-las), ficando irritado, impaciente, ou, até mesmo, robotizados, perdendo a capacidade de dar respostas mais adequadas para a situação atual.

Os eventos estressores em geral, são situações que trazem sofrimento, angústia, dor e aflição. E precisamos encontrar alternativas para lidar com essas emoções e minimizar seus efeitos, substituindo-as pela confiança, a segurança nas ações que já estão sendo tomadas e nas pessoas envolvidas, garantindo a disposição para buscar proximidade, seja lá a forma que encontrar para isso.

Alguns exemplos que tenho adotado: Ligar no final do dia e conversar com um amigo querido, ter uma base segura para dizer o que sinto e refletir ativamente sobre o quanto estou conseguindo estar presente nas situações e desafios diários. Além disso, reflito comigo mesma sobre quais são as angústias que tenho sentido, que me geram medo.

Tente se fazer essas perguntas, não tenha receio de parecer menos forte por sentir medo e se deixar reconhecer em sua vulnerabilidade! Já se perguntou do que sente medo e o que te conforta, ou o que ameniza o seu medo? Diga para as pessoas que admira o quanto elas são importantes para você! Peça ajuda naquilo que se sente sobrecarregado, diga como se sente, principalmente para as pessoas que convivem com você diariamente.

Aproveite esta oportunidade para mergulhar nas profundezas do seu ser e se reconhecer como Humano. Como alguém que é impotente frente a algo tão maior que está totalmente fora do seu controle. Só te basta cuidar do que está ao seu alcance: Você.

Se manter organizado emocionalmente e aproveitar a oportunidade para fazer boas e sábias escolhas, fortalecer ainda mais relações que são significativas para você, escolher quais são mesmo as suas prioridades hoje e o quer fazer daqui para frente. Tudo isso está em suas mãos!

Aproveite a oportunidade do caos, afinal você não sabe quanto tempo outra pandemia vai demorar para te provocar a refletir de novo… rs. É uma oportunidade ímpar de escolher, pois talvez essa oportunidade já estivesse ali, todos os dias, mas hoje – especialmente – estou aqui pensando com você, te lembrando dela e sobre como é importante dar um significado para o seu momento presente: reconhecer o que sentimos e valorizarmos as pessoas que estão verdadeiramente ao nosso lado.

Por que deseja excluir de sua vida todo e qualquer incômodo, angústia ou medo? Talvez se der espaço para eles você vai se surpreender com o processo, afinal, nunca se sabe qual transformação essas condições produzirão em cada um de nós.

Aproveite e faça esse exercício, diga para ao menos 01 pessoa sobre o que tem medo, e fale que escolheu fazer isso porque essa pessoa te dá segurança e conforto. Isto fará com que tenha esperança na vida e seguir enfrentando seus desafios com a certeza de que pode e vai dar tudo certo. Sim, eu garanto que compartilhar este momento com alguém vai ser muito especial, e que depois você se sentirá tão mais corajoso para seguir seus planos, mesmo aqueles mais desafiadores.

Experimente e depois me conte como foi!





Fernanda Macedo  - no Grupo Bridge é Especialista em formação e reparação de relações de grupos, desenvolvimento de lideranças e transformação cultural.
Possui mais de 18 anos de experiência na área da desenvolvimento organizacional e gestão de grupos.
Entusiasta na aplicação prática da Teoria do Apego, de John Bowlby, no contexto organizacional para construção, manutenção e rompimento de vínculos entre lideres e equipes.


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