terça-feira, 27 de março de 2018

Biotecnologia: doce alento para o amargo destino do cacau


 No dia 26 de março foi celebrado no Brasil o Dia do Cacau. E não faltam motivos para comemorar:

  • A produtividade do Cacau no Pará, Estado que lidera a produção brasileira, é de 911 kg/hectare, maior que a média mundial (550 kg/hectare);
  • A produção nacional do fruto não é suficiente para atender a demanda do país, mas há expectativa de que entrega da matéria-prima local à indústria aumente 10% neste ano;
  • O outro motivo é a estimativa de crescimento de 8% no faturamento com cacau em 2018, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

O momento, no entanto, pede uma reflexão sobre o futuro do cultivo do cacaueiro. A planta está sob a ameaça das mudanças climáticas e da crescente demanda por chocolate. Cientistas acreditam que, em função desses fatores, o cacau pode tornar-se tão raro e caro quanto o caviar em poucos anos. Mas há alento para esse cenário e ele vem da biotecnologia.

O chocolate inicialmente era uma bebida exótica consumida por povos sul-americanos há milhares anos. De lá para cá, tornou-se um dos doces mais apreciados do mundo. Nos dois casos, é produzido a partir das amêndoas do fruto do cacaueiro. O nome científico da planta é Theobroma cacao (do grego theobroma, alimento dos deuses). Os frutos são fibrosos e contém amêndoas, cobertas por uma polpa branca adocicada.

É uma cultura extremamente sensível a pragas, doenças, ao calor excessivo e à falta de umidade. Cresce somente em uma faixa 20 graus ao norte e 20 graus ao sul da linha do Equador. Ou seja, em ecossistemas com chuvas frequentes nos continentes americano, africano e asiático.

Costa do Marfim e Gana, responsáveis por mais da metade do cacau do mundo, devem ter redução significativa da produção em 2018. As principais causas são a seca e o calor acima da média. Segundo a agência Bloomberg, entre janeiro e fevereiro deste ano, foram registrados os menores índices pluviométricos dos últimos 30 anos nesses países.

As diversas variedades de cacau estão classificadas em três grupos:
  • crioulo (muito sensível a pragas, mas com excelentes amêndoas);
  • forasteiro (mais cultivado, porém com amêndoas de qualidade inferior);
  • trinitário (um híbrido dos dois).

 

Como a biotecnologia pode ajudar a salvar o cacau


Com o aumento gradual da temperatura global, a erosão e a contaminação do solo, o cultivo, que por si só é complexo, tem se tornado cada vez mais difícil. Especialmente porque 90% da produção é feita em pequenas propriedades da mesma forma há centenas de anos. Em consequência disso, o chocolate pode virar um produto raro nos próximos anos, alertam pesquisadores.

Apesar desse cenário negativo, pesquisas de melhoramento genético da planta estão sendo desenvolvidas para tentar reverter esse quadro. O primeiro passo foi dado em 2011, com o sequenciamento do genoma do vegetal. Um dos objetivos era encontrar genes responsáveis por características de interesse (a exemplo da resistência a pragas) na própria espécie e, assim, chegar a novas variedades.

Uma outra alternativa para a salvação da lavoura é a biotecnologia. A iniciativa privada, por exemplo, em parceria com pesquisadores da Universidade Berkeley, está investindo pesado nessa vertente. A principal meta é criar uma planta transgênica mais resistente ao calor e à umidade. Um desses trabalhos estuda inserir no genoma do cacaueiro genes de mandioca responsáveis por inibir a produção de toxinas em altas temperaturas.

Segundo a diretora-executiva do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB), Adriana Brondani, a transgenia é uma ferramenta poderosa para a preservação da biodiversidade. “Por meio dela podemos identificar e transferir genes que permitiriam a sobrevivência de espécies em condições antes inviáveis. Se essa espécie for o cacau, estaria aí uma chance superar os riscos que rondam a cultura”, afirma.

Todos esses esforços pretendem garantir, no longo prazo, a produção do chocolate. A demanda pelo doce é extremamente alta e deve continuar assim nas próximas décadas. Segundo relatório da consultoria Euromonitor, a demanda global por chocolate apresentou um crescimento de 10% nos últimos cinco anos.

A pesquisa brasileira a favor do cacau


No Brasil, a ciência também tem sido uma aliada na busca por um cacau mais resistente. O intuito é desenvolver sementes que não sejam sensíveis ao fungo causador da vassoura-de-bruxa. Essa praga dizimou lavouras no fim dos anos 1980. Por conta dela, a produção brasileira, de 320 mil toneladas por ano em meados dos anos 1980, despencou para 190 mil toneladas em 1991.

Estudo do Instituto de Biologia e do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) descobriu o porquê de tamanha sensibilidade. Todos os cacaueiros baianos são originários de um número muito pequeno de sementes da variedade forasteiro. Essas plantas, embora tenham amêndoas de excelente qualidade, são pouco resistentes às pragas. A boa notícia é que recentemente foram identificadas árvores resistentes à doença e com maior variação genética do que aquela encontrada na maioria dos cacaueiros brasileiros.

O futuro do cacau e seu principal produto, o chocolate, estão em risco. Mas esse quadro pode ser revertido graças aos esforços de cientistas que usam o melhoramento genético e a biotecnologia para encontrar soluções para o problema.






Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB)


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