A dificuldade de lidar
com situações complexas e que parecem intratáveis faz com que muitas vezes as
pessoas ou sociedades tentem negar os fatos, os quais, claro, não deixam de
existir.
A fábula do rei nu, ou
a referência à suposto costume do avestruz de esconder a cabeça na areia sempre
que a realidade não lhe agrada são exemplos de como a cultura popular ironiza
esta tendência.
O documentário vencedor
do Oscar, An incovenient truth, sobre o aquecimento global, também trata
objetivamente de nossa inclinação coletiva a ignorar problemas que demandam
efetiva mudança de paradigmas.
Atualmente vivenciamos
no Brasil uma crescente escalada ao desrespeito, pelos atores corporativos,
relativamente aos interesses dos acionistas de grandes companhias
(particularmente aquelas com participação estatal).
Em verdade, dois dos
maiores litígios atualmente existentes no país decorrem diretamente do fato da
ausência de adoção de práticas mínimas de boa gestão corporativa, em detrimento
dos interesses dos acionistas que simplesmente não aceitaram ver seus direitos
indevidamente vilipendiados.
O primeiro deles
refere-se à indenização aos investidores locais da Petrobras, devido aos
prejuízos incorridos em virtude dos fatos revelados pela Operação Lava Jato,
que já geraram inclusive um acordo para a reparação dos investidores no
exterior. A questão já foi judicializada e aguarda solução por parte do Poder
Judiciário, ainda pouco adaptado a solução de litígios de tal complexidade.
Mais recentemente,
intensa discussão de trava no tocante à legalidade da recuperação judicial da
OI S.A., a maior em curso no país, questionada pelos acionistas com base em
suspeitas de fraude e corrupção por parte da atual Diretoria, as quais serviram
de base para notícia crime perante o Ministério Público Federal e que aguardam
a instauração de procedimento investigatório para sua apuração.
A necessidade de adoção
de medidas fiscalizatórias por parte das autoridades competentes é inequívoca e
qualquer omissão, neste estágio, seria inaceitável, quando não ilegal.
Além do mais, adotando
salutar tendência do ativismo societário, os prejudicados estão tomando todas
as iniciativas cabíveis na defesa de seus interesses e também naqueles da
companhia.
Neste caso,
especificamente, se objetiva obstar atitudes que coloquem em risco a
sobrevivência da companhia e garantir que os atuais acionistas não tenham suas
participações indevidamente diluídas por conta de irregular lançamento de
títulos no exterior.
É exatamente por tais
razões que os acionistas prejudicados, por meio da Associação dos Acionistas
Minoritários - AIDMIN estão adotando todas as providências cabíveis, inclusive
perante as jurisdições estrangeiras competentes, para o enquadramento e
apuração das práticas tidas como ilegais.
Tais exemplos denotam,
acima de tudo, uma mudança de atitude essencial para o desenvolvimento de nosso
cenário corporativo e para sua evolução ética e acreditamos o Brasil, mirando
os fatos de frente, precisa resolver internamente os problemas corporativos
existentes em nossa economia.
É o mínimo que se
espera das autoridades, dentre as quais aquelas do Poder Judiciário, para que não
mais seja necessário recorrer a jurisdições estrangeiras para, por via oblíqua,
impor limites desmandos ocorridos no Brasil e que, por sua gravidade, desbordam
para outros países.
O desenvolvimento
econômico do país assim exige e devemos assumir de forma consciente a
responsabilidade pela criação de um ambiente corporativo mais desenvolvido e
mais ético. Trata-se de um objetivo que demanda honestidade e coragem para
enfrentarmos nossas mazelas, seja a insuficiência do arcabouço legal existente
para a solução de tais litígios, inabilidade dos poderes constituídos em
oferecerem soluções apropriadas quando demandados.
Nossa verdade
inconveniente é que, em paralelo à corrupção no setor público, os atos de
banditismo corporativo estão recrudescendo e não podemos ignorar esta
realidade.
Precisamos,
coletivamente, tirar a cabeça da areia.
André de Almeida - advogado, fundador do Almeida
Advogados, ex-presidente da FIA – Federação Interamericana de Advogados e autor
da primeira ação Class Action contra a Petrobras nos Estados Unidos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário