O funcionamento da Orcrim
está descrito nesta parte da nova denúncia encaminhada no último dia 14 pelo
Procurador Geral da República contra o presidente Temer:
“A organização criminosa objeto da
investigação no âmbito da Operação Lava Jato foi constituída em 2002 para a
eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula Da Silva — Lula à presidência da
República, quando integrantes do PT uniram-se a grupos econômicos com o
objetivo de financiar a campanha de Lula em troca do compromisso assumido pelo
então candidato e outros integrantes da organização criminosa do PT de atender
interesses privados lícitos e ilícitos daqueles conglomerados.
“Com isso, Lula foi eleito e a organização
criminosa passou a ganhar corpo após a sua posse, quando então se estruturou um
modus operandi que consistia em cobrar propina em diversos órgãos, empresas
públicas, sociedades de economia mista controladas pela União e Casas do
Congresso Nacional, a partir de negociações espúrias com as empresas que tinham
interesse em firmar negócios no âmbito do governo federal e na aprovação de
determinadas medidas legislativas (…)
Todo
este estratagema não foi desenvolvido para beneficiar indevidamente apenas os
integrantes do PT que constituíram a organização criminosa, serviu também para
atender interesses escusos de integrantes de outras agremiações partidárias
que, ao longo do governo Lula, aderiram ao núcleo político desta organização
criminosa com o objetivo de comandar, por meio da nomeação de cargos ou
empregos públicos chaves, órgãos e entes da Administração, um verdadeiro
sistema de arrecadação de vantagens indevidas em proveito, especialmente, dos
integrantes da organização criminosa. Em
contrapartida
aos cargos públicos obtidos junto aos integrantes do PT envolvidos no esquema ilícito,
os integrantes do PMDB e do PP que ingressaram na organização criminosa
ofereceram apoio aos interesses daqueles no âmbito do Congresso Nacional.”
Como se vê,
nada que até o semanário de Burundi já não tenha noticiado. No entanto, a
organização descrita passou ao largo e o TSE fez que não viu algo muito
relevante sob o ponto de vista político e institucional. Refiro-me à propagação
sobre o baixo clero dos efeitos políticos e éticos da atividade criminosa
desenvolvida pelas cúpulas das organizações partidárias.
Os caciques
que comandavam os negócios da tribo supriam suas tropas de recursos para
custeio das respectivas campanhas eleitorais. O motivo é evidente: quanto maior
o número de fieis seguidores, mais valiosa se tornava sua posição política e
mais bem remunerada a participação nos negócios. Sabe-se, hoje, que o topo da
cadeia alimentar, o ápice da carreira consistia em ter apelido e arquivo
próprio no departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht.
O tipo de ganância que essa organização
permitiu prosperar gerou e ainda preserva um efeito político devastador. Não
fossem as coisas assim, a representação da sociedade brasileira, a
proporcionalidade entre as diferentes bancadas e muitos daqueles a quem hoje
chamamos deputado e senador estariam em outras atividades, longe dos centros de
poder. Devem seus mandatos aos caciques em cuja cisterna beberam água e, hoje,
se empenham, juntos, em encontrar uma regra de jogo eleitoral que os agasalhe
da rejeição do eleitorado.
A distorção causada pelo crime virou o
país pelo avesso, influenciou o Direito e a Justiça, a economia, a moral
nacional e a doutrinação nas salas de aula. A próxima legislatura, porém, não
pode ser uma cópia carbonada da atual; a ORCRIM não pode continuar reproduzindo
seus efeitos na representação política. A democracia é muito mais do que um
conjunto de normas e formalidades; o que lhe dá vida é a adesão da sociedade
política a elevados princípios e valores.
Percival Puggina - membro da Academia
Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil. integrante do grupo Pensar+.
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