quinta-feira, 21 de julho de 2016

Paraísos fiscais e o paraíso dos sonegadores



                               
Recentemente uma investigação expôs uma lista de pessoas que mantém seu dinheiro em paraísos fiscais. Tal divulgação ficou conhecida como “Panamá papers”. Ainda que nem todo recurso depositado em tais locais possam ser classificados como ilícito, a lista dá margem a muitos questionamentos a respeito da origem dessa riqueza. Muitos dos que aparecem nos documentos são brasileiros investigados pela Polícia Federal.

Um estudo elaborado por James Henry, economista que trabalhou na empresa de consultoria McKinsey, mostra que milionários ao redor do planeta escondiam no final de 2010 US$ 21 trilhões em instituições financeiras sediadas em paraísos fiscais. O trabalho foi encomendado pela Rede de Justiça Tributária, entidade que atua contra a atuação desses países, que facilitam a vida de traficantes de droga, políticos corruptos e sonegadores de tributos.

O relatório de James Henry aponta que, do total depositado nos paraísos fiscais em 2010, cerca de US$ 520 bilhões eram de brasileiros. Esse montante equivalia a um quarto do PIB do país naquele ano. O Brasil é a quarta nação que mais tem dinheiro nessas regiões estimuladoras de atos ilícitos e que garantem o anonimato dos clientes bancários.

O valor total depositado nos paraísos fiscais impressiona porque representa um terço do PIB mundial de 2010. Chama menos a atenção o fato de o Brasil ser um dos países que mais envia dinheiro para essas regiões. Agora, não há novidade no fato da sonegação de impostos. Só para ilustrar, no ano passado foram sonegados mais de meio trilhão de reais no país. Vale citar que, segundo o órgão que contratou o estudo, os ricaços brasileiros tinham mais de R$ 1 trilhão nos paraísos fiscais há seis anos e os bancos que realizaram as transferências de recursos sabiam que seus clientes estavam sonegando impostos.

Esse é mais um vexame brasileiro. Parte expressiva desses recursos no exterior, que poderiam estar no Brasil financiando a produção, vai para lá por conta da complexidade do sistema fiscal. A insana burocracia brasileira é um campo fértil para esconder informações e gerar riquezas que abastecem os paraísos fiscais.

O Brasil é um dos líderes entre os países que enviam dinheiro para os paraísos fiscais porque aqui é o paraíso dos sonegadores. Manter uma estrutura de impostos complexa é tudo o que o sonegador deseja. Fica mais fácil para enviar recursos para fora. Simplificar o sistema através de uma reforma tributária que substitua vários tributos burocráticos por apenas um cobrado de modo automático sobre a movimentação financeira, como previsto no projeto do imposto único, seria o pior dos mundos para os que vivem da evasão fiscal.

Na questão tributária o Brasil precisa mudar paradigmas em vez de aprofundar seus defeitos, como nossa burocracia pública vem insistindo em fazer. Enquanto o complexo for assimilado e o que é simples for repelido o país manterá um sistema tributário injusto, que beneficia minorias como os que podem mandar fortunas para o exterior.



Marcos Cintra - doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto Único.



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