sábado, 7 de fevereiro de 2015

Até onde vão as manobras criativas?




De aparentes, as rachaduras já produzem ruínas. Ou, como diz o dito popular: A casa caiu. Foi anunciada na manhã de quarta-feira (4) a renúncia da presidente da Petrobras Graça Foster e de cinco diretores. A notícia da troca de comando da estatal, já dada como certa na terça-feira (3), impulsionou as ações da empresa, que fechou o dia com a maior alta dos últimos 16 anos, ofuscando os impactos do rebaixamento do rating anunciada recentemente pelas agências de classificação de risco.
No entanto, a euforia durou pouco. Na manhã de hoje (6), o nome de Aldemir Bendini, presidente do Banco do Brasil, foi confirmado como o sucessor de Foster. As ações da petroleira caíram novamente, em uma espécie de reprovação. O mercado tem grande restrição em relação ao novo diretor, uma vez que está envolvido em várias operações de cunho duvidoso. Enquanto na condução do BB, aprovou, por exemplo, o empréstimo à socialite Val Marchiori, no valor de R$ 2,7 milhões, considerado irregular pela própria instituição. Além disso, foi condenado ao pagamento de multa à Receita Federal, por evolução patrimonial sem justificativa de origem de recurso, equivalente a quase R$ 122 mil. A condenação se deu por compra, em dinheiro vivo, de um apartamento, no ano de 2010.
Apesar da dança das cadeiras, os problemas da estatal continuam os mesmos. O navio troca o capitão, mas mudar o rumo depende de diversas outras variantes. Os negócios da Petrobrás vêm sendo prejudicados seriamente pela publicação das Demonstrações Financeiras do 3º Trimestre de 2014. Ou melhor: pela falta dela. Prorrogado por duas vezes e já com multa aplicada, o balanço contábil da empresa foi divulgado sem o selo da auditoria PricewaterhouseCoopers (PwC). O mercado, por sua vez, está preocupado e não vê o resultado com bons olhos.
O rebaixamento do rating, por sua vez, significa que, sobre a Petrobras, recai o alerta de ‘perigo’ a todos os seus prospectos e futuros investidores. A este cenário, soma-se a possibilidade do não pagamento dos dividendos aos acionistas, devida ao estresse financeiro vivido pela companhia.
A novela política da operação "Lava-Jato" vem, a cada momento, revelando detalhes de manobras que jamais poderiam acontecer dentro de uma organização de grande porte. Além de ter sido usada para evitar o aumento dos combustíveis em ano eleitoral, também serviu de ponto de venda artificial de plataformas e geração forçada de lucros para repasse ao Governo.
Nos levantamentos efetuados em Pernambuco, na obra Abreu e Lima, por exemplo, os escândalos e desvios de finalidade ficaram claros. No entanto, o pagamento de propina eleva o custo da obra, criando um valor fictício do bem final, superior ao tanto que vale realmente. É como se um apartamento fosse avaliado, incluindo-se o dinheiro pago indevidamente a um terceiro. O ativo da companhia sobe de forma artificial, o que acarreta desajustes contábeis.
Além disso, a maior preocupação da Petrobras atualmente é o esvaziamento do caixa. Por conta de vencimentos antecipados de títulos de dívida, a empresa está cada vez mais vulnerável, provocando a coibição de futuros investimentos e a paralisação de projetos em aberto. No momento, extrair petróleo está mais caro do que importá-lo, já que o barril vale entre US$ 48 a US$ 50, menos do que no ano anterior, quando atingiu a marca dos US$ 112.
Segundo o mercado, a perda apurada deveria estar entre US$ 10 e US$ 20 bilhões, mas o próprio conselho de administração evidenciou que a cifra chega a US$ 34,5 bi, quase 88,6 bilhões em moeda nacional.
O balancete, inutilizável sem a auditoria, é uma forma de prestar contas aos financiadores da empresa e evitar que haja vencimento automático de dívidas. Assim, a petroleira foge de compromissos imediatos, no montante aproximado de R$ 45,8 bilhões, algo em torno de 65% do seu caixa.
O EBITDA, do inglês ganhos antes das deduções em geral, também chama atenção. Com a redução do caixa em 28% do segundo para o terceiro trimestre de 2014, o resultado da relação dívida/EBITDA atingiu 4,63. Para uma empresa com um portfólio de investidores igual ao da Petrobrás, este indicador não deveria ultrapassar os 2,5.
Nos nove primeiros meses de 2014, os financiamentos eram R$ 35,2 bilhões,  quando, no mesmo período do ano anterior, equivaliam a R$ 22,7 bilhões. O motivo? O aumento do endividamento da empresa e pressão sobre os futuros investimentos. Analisando-se o fluxo de caixa, o que se observa é um caos total e mais uma série de manobras criativas para contornar as consequências inevitáveis.

Reginaldo Gonçalves - coordenador do curso de Ciências Contábeis da Faculdade Santa Marcelina - FASM

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