O mundo
impotente
Um morticínio de palestinos na Faixa de Gaza.
Outro dos infelizes passageiros do avião MH-117, para profunda tristeza de seus
familiares e dos homens que agregam valor à vida humana. Como bem enfocou o
editorial de O Valor de 22/7/14, a ONU é um organismo incapaz de enfrentar
essas barbáries. Emite declarações condenatórias e tudo fica como dantes.
Passou a hora de repensar-se as relações
internacionais. O direito internacional sempre padeceu de crise de autoridade.
Não é equipado de sanções eficazes. Se um indivíduo rompe o direito alheio, um
Estado nacional organizado o pune, na órbita civil ou criminal, ou em ambas. A
pena espanta, exemplifica, muito embora, em vários países, não exerça sua
importante função pedagógica, querida pelos acadêmicos. Já no plano
internacional, um Estado vítima, por invasão de parte de seu território ou um
atentado infame como o assassinato dos passageiros do Boeing, só tem um meio de
fazer valer sua soberania: decretar a guerra justa, o "ius bellum", o
que importa em consequências ainda mais graves no mundo atual.
Isso porque a ONU permanece em
insuperável platitude, principalmente quando Estados agressores predominam em
seu anacrônico Conselho de Segurança. Por incrível que possa parecer, cinco Estados valem
mais que a Assembléia Geral. Não há concepção democrática que compreenda esse
fenômeno, que só teve sentido num momento histórico atípico do século passado.
A imposição de sanções econômicas aos
Estados transgressores ou foras da lei refoge à lógica mais elementar, porque
os cumpridores das penas são os povos. Os governantes, funcionários militares e
as elites do poder, causadores de inomináveis agressões, sempre têm
meios de safar-se.
Tais conjeturas nos levam, mais que a
uma "modernização" da ONU, a uma revisão completa de todas as
instituições internacionais. Num mundo que se globalizou, há de ser concluído,
por um pacto entre as nações, um Estado Mundial, dotado de força coercitiva
para apenar não os povos, mas os agentes responsáveis pelas atrocidades
que hoje nos abalam. Somente penas individualizadas, físicas, que não passem da
pessoa do delinquente, mas que envolvam todos aqueles que contribuíram
para o crime, como assentado no direito penal comum, podem amedrontar e evitar
novas catástrofes. Grupos em conflito ou terroristas têm de temer as penas mais
severas possíveis. A começar dos governantes que os estimulam. Os que
organizaram e provocaram atos bélicos e ofensivos aos direitos do
homem são os criminosos, não a população civil. O Tribunal de
Nuremberg, o episódio Pinochet e alguns outros descortinaram o caminho, porém
os procedimentos foram insignificantes ante os tremores que abalam o mundo, por
razões econômicas, geopolíticas, religiosas etc.
O jurista John Rawls, que transformou o modo
jurídico de encarar os fatos que devem estar submetidos
a normas coerctivas, concebeu o "direito dos povos" no lugar
do direito internacional e dos Estados soberanos. Nada mais oportuno, porquanto
se considera que todos os povos tendem a bem relacionar-se, como corolário da
própria natureza humana. No entanto, por viverem em condições de
vida adversas, uns sob Estados bem ordenados, outros sob Estados onerados,
principalmente no campo social, essa convivência fica, não raro, comprometida,
Assim, a erradicação das injustiças e a introdução da isonomia real e das
liberdades públicas no interior de cada Estado será grande instrumento
propulsor à criação do Direito dos Povos.
No plano coercitivo, são
necessários, além de um organismo internacional totalmente
renovado, Tribunais Internacionais ágeis e eficientes, que não podem
ficar ao sabor das forças políticas das nações. Sua independência é imperativa,
sem a qual esses sicários, que provocam mortes em série, a exemplo dos
fatos de Gaza e da derrubada de uma aeronave comercial com 298 passageiros,
continuarão a agir e gerar as tragédias contemporâneas.
Amadeu Garrido
de Paula - advogado especialista em Direito Constitucional, Civil,
Tributário e Coletivo do Trabalho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário