Especialista alerta para riscos de atraso.
Ontem
o Governo submeteu à Assembleia da República uma nova proposta de alteração à
Lei dos Estrangeiros. Entre os pontos centrais, está a manutenção de uma
limitação temporal para o reagrupamento familiar — agora com algumas
flexibilizações — e a previsão de um prazo de até nove meses para a AIMA
decidir sobre os pedidos apresentados.
Como
advogado à frente da Bicalho Consultoria Legal em Portugal, e acompanhando
diariamente a realidade de cidadãos estrangeiros e famílias que tentam
regularizar a sua vida no país, não posso deixar de expressar a minha
preocupação.
A
questão fundamental não é o número de meses — se dois anos de espera, se um
ano, se nove meses para decisão. O problema está em impor prazos cegos e
rígidos para um direito que é constitucionalmente protegido: o direito à
unidade familiar. Uma vez concedida a autorização de residência a um
estrangeiro, se este comprova moradia digna, meios de subsistência e condições
de sustento, deve poder requerer o reagrupamento familiar de imediato. A
Constituição não prevê que a família espere por calendário administrativo.
No
mesmo diploma, estabelece-se que a AIMA poderá demorar até nove meses para
decidir um pedido de reagrupamento. Nove meses! Este é um período que, na
prática, representa um abismo temporal para famílias que vivem separadas,
muitas vezes em situações de fragilidade emocional e económica. Se o Estado
dispõe de meios tecnológicos para verificar dados, cruzar informações e
confirmar condições, deve fazê-lo de forma célere. O que se exige é o
fortalecimento da máquina administrativa, com mais tecnologia, mais
interoperabilidade e mais capacidade de resposta. O que não se pode é
transferir a ineficiência do sistema para os cidadãos.
Esta
discussão surge em paralelo com operações ostensivas da UNEF (Unidade Nacional
de Estrangeiros e Fronteiras), que têm sido levadas a cabo em locais visíveis,
como salões de cabeleireiro e estabelecimentos de bairro. Essas ações, pela
forma como são midiaticamente expostas, transmitem a ideia de combate à
imigração ilegal, mas levantam dúvidas sobre a sua verdadeira finalidade.
Aproximando-se as eleições autárquicas, não é difícil traçar o paralelo: em
vários países europeus, medidas de forte visibilidade foram usadas em momentos
eleitorais para mostrar “controlo” e “rigor”, servindo mais como espetáculo
político do que como resposta séria aos desafios da imigração.
Receio
que Portugal siga este mesmo caminho: transformar a gestão migratória num
palco, em vez de numa política pública sólida e constitucional. O que se
deveria discutir não é como impor tempos de espera, mas como garantir que o
Estado responde em tempo útil, com inteligência, seriedade e humanidade.
A imigração é um tema demasiado sensível para ser tratado como bandeira eleitoral. A Constituição da República Portuguesa é clara ao proteger a família. É a esse princípio que devemos fidelidade — não ao calendário eleitoral nem à lógica do espetáculo.
Bicalho Consultoria Legal
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