Estudo da
Confederação Nacional do Transporte mostra que o combustível representa 36% dos
custos operacionais das companhias aéreas no Brasil, acima da média mundial
O QAV (querosene de aviação), combustível que
responde por 99% do consumo da aviação comercial no Brasil, representa cerca de
36% dos custos operacionais das companhias aéreas, acima da média global, de
31%. Seu preço é fortemente influenciado pelo valor do petróleo, pela taxa de
câmbio, pela elevada concentração da indústria de refino e distribuição do
combustível e por gargalos logísticos. Esses dados estão no estudo inédito
Caracterização da Cadeia de Produção e Comercialização de Querosene de Aviação
no Brasil, divulgado pela CNT (Confederação Nacional do Transporte) nesta quinta-feira
(31).
A pesquisa detalha como fatores externos e
estruturais determinam o preço do QAV. O petróleo e o dólar são as principais
variáveis, somadas aos custos de refino. Em 2024, a produção nacional atingiu
5,86 bilhões de litros, recuperando-se da queda registrada durante a pandemia.
No entanto, o Brasil continua dependente de importações, que representaram, em
média, 17,4% da oferta total (consumo aparente) do combustível entre 2000 e
2024.
Essa dependência é agravada por limitações
logísticas. O transporte do QAV exige navios-tanque de grande porte e
infraestrutura portuária adequada, o que reduz a rentabilidade da operação para
muitas distribuidoras. A situação se torna ainda mais desafiadora devido à
concentração da produção em poucos estados e refinarias. Em 2024, apenas duas
refinarias foram responsáveis por 96,6% da produção nacional, enquanto duas
distribuidoras dominaram 80,8% do mercado.
O estudo aponta que a demanda pelo combustível
exerce pouco impacto sobre as variações do seu preço, o que é muito comum em
mercados oligopolizados, como no caso do refino e da distribuição do QAV. As
variações do preço do QAV estão mais relacionadas às variáveis que impactam o
custo do combustível do que ao número de voos ou ao volume de vendas. A
concorrência entre o QAV e o óleo diesel, dentro das refinarias, – ambos
derivados das mesmas frações do petróleo – também influencia a disponibilidade
e o preço, exigindo ajustes técnicos constantes.
Outro ponto de destaque é o impacto da antiga
política de PPI (Preço de Paridade de Importação), vigente de 2016 a 2023, que
elevou os preços internos ao vinculá-los ao mercado externo. Embora o fim do
PPI tenha trazido maior flexibilidade, gargalos logísticos e a complexa
tributação ainda limitam a redução de custos.
O futuro do setor, segundo o estudo, passa pela
adoção gradual dos SAF (Combustíveis Sustentáveis de Aviação), capazes de
reduzir até 80% das emissões de gases de efeito estufa. Entretanto, o alto
custo desse combustível, que pode ser até quatro vezes maior do que o do QAV
tradicional, ainda é um grande desafio.
Para Fernanda Rezende, diretora executiva interina
da CNT, a publicação é um marco para o setor. “Além de ampliar a transparência
sobre o principal insumo do transporte aéreo, o estudo oferece subsídios para a
formulação de políticas públicas, estratégias empresariais e decisões de
investimentos no setor. Entender o preço do QAV é compreender os rumos da
aviação brasileira”, afirma.
Por dentro da logística que
movimenta o setor aéreo
O mercado brasileiro de QAV é marcado por
concentração e forte dependência de fatores externos. A Petrobras ainda domina
a capacidade de refino do combustível. A distribuição é controlada por poucas
empresas, sendo as principais a Vibra Energia, Raízen e Air BP Brasil, que respondem
por 98% do mercado.
De acordo com o estudo, apesar da autossuficiência
brasileira em petróleo bruto, o país ainda depende da importação de QAV
refinado para atender à totalidade da demanda interna. A infraestrutura
logística é outro ponto crítico: apenas dois aeroportos, Guarulhos (SP) e
Galeão (RJ), contam com dutos que ligam refinarias diretamente aos terminais
aeroportuários. Nos demais, o abastecimento é feito por caminhões-tanque,
tornando o processo mais vulnerável a falhas operacionais.
CNT aponta soluções para um
mercado de QAV mais eficiente
O estudo da CNT propõe uma abordagem estratégica
para enfrentar os principais entraves do mercado de QAV no Brasil, com ênfase
na transparência da formação de preços, no fortalecimento da regulação e na
ampliação da eficiência logística. Para a gerente executiva de Economia da CNT,
Fernanda Schwantes, a elevada concentração nas etapas de refino e distribuição,
aliada às barreiras à entrada de novos agentes, exige uma atuação mais robusta
do poder público. “A CNT recomenda o fortalecimento da agência reguladora do
mercado de combustíveis como medida essencial para promover um ambiente mais
competitivo e equilibrado”, destaca. A Entidade também defende maior
previsibilidade e clareza nos mecanismos de precificação como formas de reduzir
a volatilidade e estimular o crescimento sustentável do setor aéreo.
Outro ponto central é a necessidade de
investimentos em infraestrutura logística. A CNT sugere a ampliação das
estruturas de armazenamento e a modernização dos portos e terminais para
aumentar o potencial de importação do combustível.
Por fim, o estudo aponta a necessidade de redução
da carga tributária sobre os combustíveis de aviação, uma vez que o transporte
aéreo é essencial em um país com as dimensões do Brasil, pois promove a
conectividade, o turismo, o acesso a mercados,
o aumento da competitividade econômica, a geração
de empregos e renda e o desenvolvimento regional.
Caminhos para um mercado de
QAV mais eficiente no Brasil
1. Redução tributária – reduzir a carga tributária incidente sobre o QAV.
2. Regulação e concorrência – fortalecer a agência reguladora do mercado de combustíveis no Brasil
e ampliar a transparência na formação de preços.
3. Infraestrutura logística – investir em dutos, tancagens e terminais dedicados para reduzir
custos e riscos no abastecimento dos aeroportos.
4. Gestão de custos pelas
companhias aéreas – diante do limitado poder de
negociação sobre o preço do QAV, as empresas devem adotar estratégias internas,
como otimização de rotas e aumento da eficiência operacional, para mitigar os
impactos financeiros.
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